Só me dei conta de que eu tinha um final de semana inteiro pela frente quando cheguei em casa e olhei a data na folhinha. Era sexta-feira, dia 27 de fevereiro. Não só o primeiro mês inteiro de aula tinha se passado como também o carnaval estava chegando.
Pensar no feriado me fez estremecer dos pés à cabeça. Carnaval significava muita gente viajando e conseqüentemente, uma semana turbulenta para os moradores de São Joaquim. Todos os feriados e férias, a cidade fervilhava, independentemente do clima. E agora, significava uma semana sem ir à escola. Uma semana sem ver Théo.
Théo. Eu me senti arrepiada ao pensar no nome dele. Era engraçado como saber o seu nome trazia uma aura a mais de mistério ao invés de diminuí-la. Agora que eu arrancara uma coisa dele, eu queria saber tantas mais que a curiosidade era quase insuportável. E ela teria que esperar.
Fui até meu quarto, deixei meu material lá e peguei meu Crepúsculo. Aquele seria um longo final de semana.
Na manhã de sábado, eu já não podia agüentar mais.
Depois de ir pra cama às 10 horas em plena sexta-feira – a despeito de todas as reclamações de Loren sobre como eu estava chata e velha para uma garota de dezesseis anos – acordei elétrica no sábado às 8 da manhã, sem saber o que fazer. Se eu pudesse, teria trocado de roupa e ido à escola. Mas era um sábado. E ninguém tinha aula no sábado.
Então eu sentei em frente à televisão e a liguei baixinho, pra não acordar ninguém. A casa estava silenciosa enquanto eu vasculhava pelos canais a procura de alguma coisa pra assistir. Nem a TV a cabo se salvava quando se tratava de finais de semana. A melhor coisa que eu pude arranjar foi uma reprise de Friends e um documentário sobre golfinhos no Discovery Channel.
Acabei cochilando no sofá e acordei quando minha mãe me chacoalhou pra saber se eu já tinha tomado café. Respondi que não e tomei café da manhã com ela e com o meu pai, só então descobrindo que ainda eram 9:30 da manhã e eu não tinha perdido muito do dia.
Fiquei o sábado todo vagando de um lado a outro da casa, lendo ou vendo televisão. Quando o sol abriu lá fora, convidativo apesar do vento gelado, aceitei o convite de Loren pra dar uma volta, e já dobrando a esquina de casa, percebi que ela só queria me fazer um questionário.
- Então, me diga, o que você já sabe sobre o guri? – perguntou, logo de cara. Eu ri sem querer e dei de ombros.
- Não muito, na verdade. – respondi – Ele tem o dom de sempre levar a conversa pro lado que ele quer. Foi um custo fazer com que ele me dissesse o nome dele.
- Uau, mas que guri mais misterioso é esse! – Loren exclamou, me arrancando mais risos – Ele não queria dizer nem o nome?
- Não. Eu também achei estranho.
- E como é. Mas afinal, qual o nome dele?
- Théo.
- Théo... hm... é um nome bem diferente. Bonito.
- Combina com ele.
Ela não disse nada e nós continuamos andando por bons metros antes que Loren abrisse a boca de novo.
- A Tia Gilda ligou ontem à noite. – ela disse, num tom menos animado, e percebi que essa era a razão pela qual ela havia me tirado de casa.
Não respondi nada a início. Na verdade, eu não sabia bem o que dizer. Quando Tia Gilda ligava, nunca era só pra dizer oi. Ela ligava pra anunciar que estava vindo, e isso nunca era das melhores notícias.
Porque ela se mudara pra Curitiba um ou dois anos depois de eu ter nascido, e só voltou quando eu pedi pra conhecê-la, aos doze anos. Desde então ela fazia visitas periódicas, em feriados ou finais de ano, e criava um clima de tensão dentro de casa. Nos meus pais, porque por menos que gostassem de admitir tinham medo de que eu os trocasse por ela, e em mim, porque por mais que ela tentasse se aproximar eu sempre ficava com um pé atrás.
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Ardente Perigo
RomanceA mudança repentina de Théo Ferro para a cidade fria e turística de São Joaquim, em Santa Catarina, vai balançar mais a vida da jovem Laura do que ela esperava. Após dezesseis anos vivendo uma vida de adolescente comum, sua vida vai virar de cabeça...