Capítulo 5

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          Eu não tirava da cabeça o que a Florence tinha dito sobre confiança. Aquilo estava me incomodando muito e sempre piorava quando estávamos juntas. Esforçava-me para enxergar que sua mudança seria somente impressão minha, mas não era. Ela estava mesmo aborrecida comigo mesmo depois de terem se passado dois dias, e foi o máximo que consegui suportar. Decidi que só havia uma coisa a ser feita.

          Quando entramos no banheiro no horário do almoço, pedi que esperasse eu averiguar se estávamos sozinhas. Apesar de contrariada, ela ficou encostada na comprida pia, com os braços cruzados.

          – Preciso te contar uma coisa... – precisei fazer uma pausa para meditar em como começaria e também tomar fôlego. Mesmo sabendo que não tinha mais ninguém ali, continuei em voz baixa. – Sei que bons amigos confiam um no outro e eu confio em você. De verdade...

          – Estou ouvindo – disse séria.

          – Talvez você não saiba de... tudo... sobre... mim.

          – Era o que eu suspeitava!

          – Shhh! Fale baixo! – olhei rapidamente para a porta por impulso. – Mas não me leve a mal, Florence! É um assunto complicado demais e meus pais me matariam se eu contasse a alguém!

          – Seus pais? – perguntou surpresa, depois arregalou os olhos e meio que se encolheu. – Espere... Vocês não têm mesmo corpos enterrados em sua casa, têm?

          – O quê? Não! Claro que não! Mas nós... realmente escondemos algo...

          – Estou ficando assustada de verdade agora – disse, apoiando os braços na pia às suas costas, como se estivesse se preparando para ouvir algo que abalaria seu equilíbrio.

          – Promete por nossa amizade que não contará a ninguém?

          – Claro que não contarei, Sarah! Eu nunca contei os seus segredos!

          – Nunca precisei te contar nenhum porque nunca tive nenhum além desse.

          – Bom... – disse sem jeito. – Mas sei que mesmo que tivesse eu os teria guardado.

          – Tudo bem... falarei logo antes que chegue alguém – fiz mais uma pausa, tentando não pensar na reação dos meus pais caso descobrissem. – Há alguns anos meu pai e minha mãe moravam no Oregon, disso você já sabe. O que não sabe é o motivo deles terem vindo para essa cidade. Eles tinham um vizinho...

          Contei a história do jeito mais resumido que fui capaz. Florence ouviu tudo imóvel, com uma expressão de pasmo.

          – Eles sequestraram um menino?! – perguntou com as mãos na bochecha, quando eu terminei a primeira parte.

          – Shhhh! – eu disse balançando as mãos – Sim! E ele... – pausei mais uma vez, receando o que eu sentiria quando finalmente completasse aquela frase. – Ele vive escondido lá em casa até hoje.

          Parecia que Florence nunca mais conseguiria fechar a boca.

          – Minha nossa! Então seus pais são uns heróis! Espere... – calou-se por uns instantes como se estivesse analisando um pensamento em específico. – Então é por isso que seu pai não quer que ninguém vá até sua casa!

          – Isso mesmo. Ele... – calei-me quando uma aluna entrou.

          Fingimos que nos arrumávamos em frente ao espelho. O que provavelmente ela achou esquisito em se tratando de mim, mas não disse nada depois dos intermináveis minutos que esperamos para que saísse do banheiro. Dava para notar que Florence estava entalada com as perguntas que gostaria de fazer. Ela mal esperou a menina colocar os pés do lado de fora.

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