Capítulo 6 - Hoje, 17 de maio

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São oito da manhã. Levanto-me e vou tomar um banho de água quente. Seja verão ou seja inverno eu adoro tomar banho de água quente. Só tomava banho de água fria quando apanhava escaldões, e eu não apanho escaldões à três anos, por isso posso dizer que não tomo banho de água fria à três anos. Não está ninguém em casa. A minha mãe deve ter ido levar a minha irmã mais nova à escola, a Kelly, e depois deve ter ido ao armazém como faz todas as terças-feiras. O meu pai deve estar no escritório a rever casos e casos e pensar em qual deles é que deve aceitar para ganhar mais uma das suas famosas conquistas "advogásticas". Advogásticas, será que esta linda palavra existe ou fui eu que a inventei?.
Às nove horas a senhora Eleanor chega para mais uma aula de Direito até às 13h35m. Depois almoço e ocupo o meu tempo. Esta é a minha rotina diária, e tenho que me apressar.
Depois do banho tomado vou à cozinha fazer o meu pequeno almoço. O meu pequeno almoço é igual a todas as manhãs excepto à segunda-feira: batido de morango. Sim eu de terça a domingo bebo SÓ um batido de morango, e sinceramente, fico cheia até acabar as aulas. A minha mãe diz: "Se queres ser como o teu pai, bebe um batido de morango todos os dias, se queres ser como à vizinha do primeiro andar que tem 48 anos, sete gatos, dois cães, três porquinhos da Índia e é solteira, empaturra-te com dez fatias de pão torrado e peixe frito." Pois... eu acho que prefiro ser como o meu pai.
Banho tomado, pequeno almoço tomado e já vesti o fato de treino das adidas preto com as riscas a branco. São oito horas e cinquenta, vou ao meu quarto buscar os meus pesadíssimos livros e vou para a sala, o meu ponto de estudo.

Trim, Trim, Trim
(Toca o iPhone do meu pai)

Apercebo-me que o telemóvel do meu pai está a tocar, e que pelos vistos se esqueceu dele cá em casa. Não quero atender, mas não resisto a olhar para o ecrã. Quando chego lá, o ecrã desliga e só aparece a notificação de chamada perdida. O número não tem identificação, então não faço caso e vou abrir a porta, porque acabam de tocar à campainha.

- Bom dia Sra Eleanor. - digo eu.
- Bom dia Diana, pronta para mais uma aula?
- Claro... - respondo com um ar cansado e um sorriso amarelo.

Vamos para a sala e assim que me sento, o telemóvel do meu pai toca outra vez. Quando chego lá acontece o mesmo que aconteceu anteriormente: terminam a chamada. Eu quase não demorei tempo nenhum, mas eu também não ia atender. Só consigo saber que é o mesmo número. E lá volto eu outra vez para a mesa e peço desculpa.

Algumas horas depois...

- Diana, chegámos ao fim de mais uma aula, e não te esqueças que tens que te começar a preparar emocionalmente, porque para o mês que vem é o exame e já sabes o que isso quer dizer. - relembra-me a Sra Eleanor enquanto se retira da minha casa.

O que isto quer dizer é que eu vou ter que me habituar à ideia de ter que sair desta casa, porque não posso fazer o exame em casa. Vou ter que me habituar à ideia de que vou ter que pôr um pé fora deste chão seguro e confortável e pô-lo naquele chão frio e perigoso, a que as pessoas chamam de: rua, um sítio acolhedor e livre.
Livre uma ova. Já foi livre em tempos, para mim. Mas esse tempo já passou, e não volta mais. Vou para o meu quarto e sento-me no cadeirão cor de rosa marfim que está ao lado da minha janela. Observo a rua através do meu cortinado branco. Vejo pessoas felizes, crianças a correrem, grupos de amigas vindas das compras. Vejo turistas. Vejo carrinhas, carros, bicicletas, motas, autocarros turísticos, táxis... vejo um mundo diferente do meu.
O telefone toca outra vez e juro que estou a passar-me. Quando lá chego ouço uma chave a abrir a porta de minha casa.

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