Capítulo 6

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Sr. Andriolli

Não levei muito tempo para ler o livro que a garota de cabelos cinza, - Demétria, se não me engano - havia me entregado. Resenhar, é que foi a parte difícil. Escrevi, apaguei. Apaguei, escrevi. Várias vezes. Até que saiu algo razoável. Eu não era muito bom com textos.
Minha vida estava aparentemente normal: De casa para o trabalho, do trabalho para casa, de casa para o Colégio. Parecia que eu havia retornado ao passado. Parecia.
Estava tudo bem, até que a terça feira bateu a porta. O horário alertava que as aulas de música eram nas terças. E, pelo visto, as aulas práticas, haviam chegado ao fim.
A sala de música, era no corredor 2.
Havia vários instrumentos, perfeitamente, organizados na sala: Baterias, Guitarras, teclados, e violões. Inumeros deles. A sala era bonita, e bem grande. Todos estavam, animados. Sorrindo, radiantes. Confesso, que senti uma pontada de inveja, por não estar também.
Há três anos, quando meus ouvidos captavam qualquer coisa relacionada a essa arte, maravilhosa, de fazer som, um sorriso gigantesco se formava em meu rosto. A música era uma parte de mim.
Era.
Queria que voltasse a ser.
Leonard Evans, era o professor encarregado pelo ensino músical. Aparentava estar na casa dos trintas. Tinha uma barba rala e usava um óculos de aro retangular.
- Depois de todos os primeiros conceitos vos apresentado durante as aulas teóricas, acredito eu que vocês estejam prontos para tocar sua primeira música. Não se preocupem, a versão dessa canção é simplificada.
Cada um se aconchegou nas cadeiras de cor azulada que estavam de frente para um tripé de partitura onde havia uma folha com a letra da música cifrada.
Eu me sentei, hesitante.
Into the silent night, era o nome da canção; For king & country, a banda. A versão era bem simplificada. Não vi nenhuma pestana, os acordes  eram os que ele havia mostrado em diagramas, durante as aulas teóricas. Todos estavam a posto, com seus violões, de modo desajeitado, porém, se sentindo prontos para começar.
- Sr. Andriolli? - indagou, o professor. Levantei meu olhar para ele. - não vai pegar um violão?
Todos se viraram para mim.
Assenti com um movimento de cabeça, desesperado para não ser o alvo de atenções da turma.
Levantei e peguei o instrumento mais próximo. Suas cordas eram de aço. E seu corpo era pintado em bege.
Me sentei.
Era estranho, mas parecia só ter eu e o violão na sala de aula.
Eu, o violão e as lembranças.
Lutei contra elas. Deslizei meu dedo sobre o encordoamento, e feri uma das cordas. Seu som, fez se ouvir; lindo e suave. Fazia tanto tempo que eu não tocava um violão. Que eu não sentia a textura de suas cordas, nem ouvia o som produzido por suas vibrações.
Em meio a toda aquelas sensações, as lembrancas vinham cada vez mais forte.
Meu coração batia mais rápido, apertado.
As lágrimas querendo brotar.
Ao longe eu consiguia perceber, a melodia do piano dominado pelo professor, em consonância com o timbre inconfundível dos violões. Estava meio desorganizado.
- Sr. Andriolli? - chamou o professor , novamente, fazendo dissipar as lembranças. Agradeci por isso. - Algum problemas? -perguntou.
Os olhares se voltaram para mim. Parte dois.
- Hã, não. Está tudo bem. - disse, cautelosamente.
- Então por quê não esta tocando?
Ponderei.
- Eu...
- você?
- Não consigo. Não estou pronto para isso.- confessei, fitando o chão.
- Por quê?
Ignorei sua pergunta.
Coloquei o violão no tripé, ao meu lado, e me levantei, caminhando em direção a porta pintada em caramelo. Podia sentir os olhares, me seguindo.
A mão do Sr. Evans, segurou meu braço.
- O que pensa que está fazendo? - indagou ele.
- Sinto muito. Não vou conseguir fazer isso. - disse, atortoado.
Só queria sair daquele cubículo estimulador de lembranças. Meu coração queria fugir daquelas memórias que tanto me assombravam. Engoli a vontade de chorar, que tanto pedia para ser atendida.Ia ser humilhante, se isso acontecesse.
- Não pode sair no meio da aula.
- Não posso continuar aqui, professor - Falei.
Eu olhava para todos os lugares, menos para dentro dos olhos do Sr. Evans. Tinha medo dele descobrir tudo sobre mim, se o fizesse.
- Esta é a minha aula, e está sob as minhas regras. - argumentou ele.
Assenti.
Levei a mão a maçaneta.
- Se sair dessa sala, vá direto para a diretoria.
Sai, e me sentei no primeiro lugar que vi. Respirei fundo. E uma lágrima escorreu por meu rosto. Rapidamente a enxuguei, com medo de alguém me ver. Mas outras lágrimas teimosas insistiam em molhar o meu rosto.
Minha conduta, como aluno, não estava sendo as das melhores.
O que eu mais queria agora era o conforto do meu quarto.
- Está tudo bem? - uma voz rouca indagou, me assustando.
- Sim. - respondi ao professor Harry, que de pé me observava.
- Então por que choras? - Ele se sentou ao meu lado.
- Eu não estava chorando... eu...
Meu cérebro procurava qualquer sequência de palavras, que pudesse servir como desculpa para minhas lágrimas, quando sua mão pousou no meu ombro esquerdo.
- Não precisa inventar desculpas para isso. Chorar não é nenhum crime digno de morte. - ele disse, com um sorriso nos lábios.
Assenti.
Não tinha coragem de fitar seu rosto, sendo assim, mantinha meus olhos fixo no chão.
- Posso saber qual o motivo? - indagou, cautelosamente, como se a base para nossa conversa, fosse feita de estalactites.
"Não, não pode". Pensei
E por muito pouco, minha boca não proferiu tais palavras.
- Não é nada.
Silêncio, e depois um suspiro.
- Tudo bem, vou respeitar sua decisão. Mas sabia, que acima de professor, sou seu amigo. - pude sentir a verdade, implícita, naquelas palavras. E, confesso, tive vontade de lhe contar tudo.
Ele deu dois tapinhas em minha costa, em sinal de consolo, antes de sair, para a direção oposta de onde veio.

Srta. Griebel

Mais uma semana de castigo havia sido cumprida.
Caitlin, era quem estava surtando com o fato de eu não poder acompanha-la ao shopping, aos sábados.
Ian, havia parado de correr atrás de mim, o que deixou tudo mais fácil. Mas isso não o impedia de me lançar olhares que me faziam desmontar, olhares que me questionavam.
A escola, ainda continuava monótona e chata. Caitlin e eu haviamos feito uma lista sobre coisas loucas para fazermos nesse nosso último ano do ensino médio. Quem sabe assim, as coisas ficariam menos chatas.
O novato ainda continuava na sua. E, confesso, estava morrendo de vontade de conversar com ele.
Por quê? Para perguntar a ele, sobre o dia em que quase o atropelamos. Só não sabia como puxar assunto.
Enfim, o professor Evans, deu início as aulas práticas. Todo aquele blá-blá-blá teórico era um tanto enervante.
Embora eu não entendesse nada de música, admirava quem o soubesse. Era uma arte incrível. Minha aula favorita era a de literatura, sem dúvida alguma, mas para muitos a aula musical e a de educação física eram as melhores. Pelo menos era uma aula, light, sem precisar do atrito entre lápis e papel.
Estava tudo indo bem. Tocávamos a nossa primeira música. E fiquei feliz por estar conseguindo seguir a cifra.
O violão que eu usava, era preto. E se não me engano, suas cordas eram de nylon.
O professor, tocava o piano, e a turma o seguia com os violões, Quando de repente o novato saiu da sala.
Acho que fez isso, só pra chamar atenção. Jogadas de marketing, eu acho. Isso sempre chama a atenção das pessoas: Você é quieto e comportado e do nada vira um baderneiro desenfreado. Pelo visto ele não queria mais continuar na sua.

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