Capítulo 11 - Desabafos e rabiscos

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Fim de noite.

Música boa saía das caixas de som.

As luvas de boxe haviam sido deixadas de lado, assim como os sacos de pancadas.

Rafael rabiscava a parede de fundo branco com pincel, surgindo à cor verde limão. Seus traços eram distorcidos. Dizendo tudo e nada ao mesmo tempo, rabiscos soltos pela imensidão, talvez fosse uma forma de ele expressar tudo que se passava em sua cabeça e principalmente em seu coração.

Enquanto ele se mantinha em silêncio, sentei e encostei-me à parede lateral para observá-lo, resolvi esquecer os porquês de tudo que estava em minha cabeça, realmente havia guardado a minha dor no bolso para dar espaço para que ele pudesse me dizer o que tanto o atormentava.

— Você vai me contar sobre a sua dor? — perguntei em um tom leve para que ele pudesse se abrir.

Enquanto seus olhos se voltaram para mim eu me perguntei mentalmente onde estava aquele seu riso fácil, aquele brilho dos seus olhos castanhos. Eles não haviam ido embora, talvez a dor fosse tanta que eles resolveram se esconder, pelo menos naquele momento.

— Não antes de você me contar o que fez você querer ir embora essa noite — ele dizia enquanto caminhava em minha direção e se sentava ao meu lado.

— Não, não e não! Permita-me esquecer tudo o que esta aqui dentro? — eu perguntei apontando para minha cabeça — E aqui dentro também? — eu apontava agora para o meu coração.

— Mas se eu lhe contar o que me aflige, vou encher ainda mais sua cabeça de pensamentos e seu coração sentimentos! — ele dizia agora com um sorriso quase imperceptível saindo de seus lábios.

— Prossiga Rafael Aguiar... — eu lhe disse fazendo um gesto com as mãos para que ele começasse a falar.

— Oh Júlia Medeiros! Você e suas fases me deixam louco qualquer dia desses! — ele dizia com um sorriso sincero em seus lábios. — Meu irmão mais velho vai se casar.

— Certo... Mas isso é bom não é? — eu o questionei erguendo uma sobrancelha para ele.

— Claro isso é ótimo! Adoro festas de casamentos, música, docinhos e madrinhas de festa! — ele dizia rindo — Mas o problema é o que vem depois Júlia Medeiros.

— A lua de mel? — perguntei divertida e ele sorriu.

— Essa parte é melhor ainda que o casamento, mas isso só para os noivos. — ele disse levantando suas sobrancelhas em sincronia, fazendo com que eu risse de sua cara — Na verdade a parte ruim é para quem fica depois da morte de meu irmão.

— O que? Morte do seu irmão? Tem alguma coisa que eu perdi enquanto você falava? — perguntei totalmente encabulada.

— Pois é Júlia Medeiros, meu irmão Francisco, em seus 35 anos de idade está com câncer de pulmão e na época de seu diagnóstico os médicos deram para ele somente três anos de vida... — ele dizia respirando fundo.

— Mas isso não pode ser revertido de alguma forma? Não há um jeito de os médicos aumentarem essa expectativa de vida dele? — perguntei afobada.

— O que era para ser feito já foi feito... Afinal os três anos que ele tinha de vida já se passaram, ele ainda está entre nós, mas não sabemos por quanto tempo... — ele dizia pensativo.

— Mas vocês precisam ter fé de que ele vai conseguir superar ainda por mais tempo... Talvez trocando o tratamento, trocando de médico e até mesmo de hospital, arriscando mais, quem sabe? — perguntei esperançosa.

— Na verdade nós já fizemos de tudo um pouco, ele já tomou vários tipos de medicamentos, mas o crescimento do tumor não para e ele só se espalha ainda mais pelos outros órgãos. O único efeito dos medicamentos agora está sendo somente o alivio da sua dor, mas ele morre um pouquinho todos os dias.

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