Mark:
Acordei no meio da noite com um barulho vindo da cozinha e, como eu não posso deixar nada passar, eu tive que levantar da cama e ir ver o que era.
-Pai? - Falei baixo.
Nada. A única coisa que se ouvia era o grito das cigarras do lado de fora da casa. Eu estava com um mal pressentimento sobre isso.-Ok, ou você sai da minha casa ou eu ligo agora para a policia! - Fui rápido até a cozinha e apontei o telefone fixo para o canto, aonde eu ouvia os barulhos.
-Miau. - Disse Link, meu gato.
-Sério Link? - Deixei cair o telefone com um suspiro de quem estava sossegado.
Quando estava brincando com ele, alguma coisa me puxou por trás.
Quando me virei, imediatamente peguei a faca que estava na pia e apontei para ele.
-É assim que você me trata, Mark? - Disse a voz que vinha do escuro.
-Quem é você? - Tanto minha voz quanto minha mão estavam trêmulas.
Apesar da minha pergunta, eu sabia muito bem quem era por causa da voz.-Ora... Você sabe muito bem quem eu sou. - Ele deu um passo para frente, onde a luz tomou conta de seu corpo.
Era Ryan. Seu cabelo ruivo e sardas continuavam o mesmo desde aquela época. Algo que me assustou de verdade foi o fato de metade de seu corpo na vertical para a direita estava totalmente marcada pelo fogo.
-O que aconteceu com você, Ryan? - Eu larguei a faca.
-Agora você está com dó, né? - Ele chegou mais perto de mim. - Olhe para isso!
Ele começou a apontar para as marcas de queimadura pelo seu corpo inteiro, que realmente estavam horríveis.
-Você acha que eu vou esquecer disso? - Ele continuou. - Foi tudo sua culpa!
-Não... - Eu não sabia o que falar, minha garganta estava presa.
-Se você tivesse avisado a todos o que podia acontecer naquele dia, talvez todos nós ainda estaríamos brincando juntos naquele lugar. - Ryan me segurou pelo pescoço.-Eu não achei...
-Você não acha nada! - Ele tentou me cortar. - Assuma sua culpa!
-Não! - Gritei.
Quando me dei conta, estava na cama. Meu gato estava em cima de mim me lambendo e eu podia sentir lágrimas escorrendo pelo meu rosto.
-Fala sério... - Levantei.
Já faz um bom tempo que eu não tinha esses problemas com pesadelos.
Como hoje era sábado, resolvi me arrumar para dar uma volta pela cidade.
-Aonde você vai, maninho?
-Refrescar a cabeça. - Respondi minha irmã mais nova.
-Papai foi viajar de novo, ele não sabe que dia vai voltar. - Ela puxou minha camisa.
Meu pai vive dando essas desculpas, mas, é muito fácil de saber que ele vai vadiar com os seus amigos. Depois que minha mãe morreu...
-EI! - Ela me puxou mais forte. - Me responde!
-Desculpa. - Coloquei minha mão em sua cabeça. - Vou trazer comida para a gente, ok?-Tá. - Ela me soltou e foi para seu quarto de cabeça baixa.
Era muito difícil para ela que mal conheceu a mãe ter um pai que não dá a atenção que ela precisa...
Peguei meu celular e comecei a discar o único número que eu conheço de cabeça.
-Alô?-Pode sair? - Perguntei.
-Agora de manhã? - Ouvi ela se espreguiçando.
-Estarei na praça de sempre. Sei que você virá. - Desliguei.
Eu conhecia Julia mais do que todo mundo, talvez mais do que ela mesma. Sabia que ela viria.
Depois de ficar num banco uns vinte minutos observando o trânsito do outro lado da rua e as pessoas caminhando, avistei Julia correndo em minha direção.-Demorou em. - Brinquei.
-O que houve? - Ela ficou assustada. - Você parece estar de bom humor.
-Eu estava lembrando da época em que nós eramos os "Defensores da Justiça".-Você ainda lembra disso? - Ela abriu um sorriso discreto.
-Viu. - Apontei para ela. - Você também parece estar feliz.
-O meu motivo é diferente... - Ela resmungou.
-O que você disse? - Não escutei.
-Nada!
Conversar com ela era tipo "A" sensação, sabe? Eu nunca sou sincero com as pessoas, talvez nem comigo mesmo. Mas se há alguém que eu consigo ser eu mesmo, essa pessoa é ela. Talvez ela seja o anjo que me protege...
-Você não vai comprar o almoço para sua irmã? - Julia me lembrou.
-Ahhh!! Quase esqueci!
-Fala sério... - Ela tirou seus óculos. - Coitada da sua irmã.
-Ainda bem que eu tenho você. - Sorri.
Sua cara ficou toda vermelha mas ela agiu como se não tivesse ouvido.
******
No caminho de casa, fui surpreendido com um encontro nada combinado com Luke.
Ele ia passar por mim como se eu não fosse nada.
-É assim que você quer agir? - Perguntei quando ele estava de costas para mim.
-O que você quer que eu faça? - Ele falou ainda de costas para mim.
-Assumir a culpa. - Resolvi deixar ele pra lá e continuei andando.
Luke estava de cabeça baixa e parado no mesmo lugar.
Eu realmente não consigo dizer a verdade...

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Memories
Mystery / ThrillerA história se passa na Capital, lugar onde todas as lembranças e arrependimentos irão retornar devido a aparição (nos sonhos) de um amigo de infância que supostamente morreu em um acidente na casa da árvore. Luke, Chloe, Mark e Julia começam a ter p...