Chocolate

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Linda observava atentamente o desenho em suas mãos. Doutor Hoffman havia entregue uma cópia a mulher, mesmo sabendo que aquilo poderia ser encarado de forma anti ética, já que tudo o que os pacientes falavam ou faziam dentro de seu consultório deveria ser mantido em sigilo. Porém, ele sabia que ela não era a mãe dele, por mais que tentasse agir como tal, ela era apenas uma mulher formada em psicologia que tentava entender o que se passava na mente daquele garoto que se mostrava a cada dia mais intrigante. Pelo menos era isso que ele gostava de pensar que Linda estava ali como colega, psicóloga, não como mãe.

E bom, por mais que fosse difícil, era exatamente assim que Linda tentava olhar o desenho em suas mãos, como uma psicóloga, não como a mãe daquele garoto.

Cada traço havia sido tão freneticamente rabiscado naquela folha, que ela nem sequer precisava estar presente enquanto ele o desenhava para notar. Era fácil de imaginar perfeitamente a cena: o corpo desajeitado do garoto curvado sobre a mesa, o cabelo bagunçado, o capuz do moletom quase caindo sobre os ombros, a mão riscando a folha branca com rapidez.

Ela desviava o olhar da folha para o rapaz, sentado próximo a janela, observando a rua quase vazia. Era sábado a tarde e o vento estava um tanto forte, o que fazia com que a maior parte das pessoas se escondessem em lugares fechados, deixando completamente vazia a - já pacata - rua onde moravam.

Era maravilhoso saber que ele podia escrever, pelo menos o básico, e que conseguia desenhar - e muito bem, diga-se de passagem. Linda se sentia um tanto idiota por não ter feito aquilo antes, sabia que ela deveria ter feito isso, deveria ter pensado em estimular Gerard com alguma atividade diferente, já que apenas com conversas ela ainda não conseguia muita coisa do garoto, mas por algum motivo, sua mente não trabalhava corretamente quando ela estava perto do garoto. Havia um bloqueio que a impedia de ver o garoto como mais um dos seus pacientes, obrigando-a a assumir outro papel. Por isso a ajuda de Hoffman fora tão bem vinda.

Queria entender aquele desenho, era tudo o que mais queria. Ela sabia o que estava vendo, era um tanto claro, mas ainda assim não conseguia entender o que o garoto queria transmitir com aquilo. Todos aqueles rabiscos de cor escura, formando a imagem do que parecia ser um garoto, sentado no chão, as pernas dobradas juntas ao peito em um ambiente vazio e escuro. Talvez aquilo nem sequer fosse um quarto ou algo parecido, talvez não fosse uma imagem tão literal ou presa a realidade, talvez aquela fosse a forma que Gerard havia encontrado, artisticamente, para demonstrar a solidão que sentia.

Solidão.

Talvez fosse isso que afetava tanto o garoto. Ele estava sozinho e parecia saber disso. Linda percebera que Gerard poderia entender pouco de muitas coisas, mas de alguma forma ele sabia que havia sido abandonado aquele dia e talvez isso o fizesse sentir tão sozinho, perdido em um quarto escuro, onde tudo que ele poderia fazer era esperar. Talvez fosse esse o significado daquele desenho. 

O aperto em seu peito fez com que seus olhos começassem a arder e ela se repreendeu mentalmente, limpando as lágrimas nos cantos dos olhos com as costas das mãos. Era óbvio que esse era o motivo de ter procurado a ajuda de outro psicólogo, ela estava envolvida demais com aquele garoto. Tão envolvida ao ponto de querer ajuda-lo, tirar toda a dor que ele pudesse estar sentindo.

- Mãe. - Linda se assustou com o garoto que a chamava. Era Frank, parado na porta da cozinha, seguido pelos dois melhores amigos.

- Ah! - Tentou disfarçar não apenas o susto, mas também as lágrimas. - Olá, garotos. - ela se levantou, guardando o desenho no meio de um caderno e sorrindo de forma quase robótica, com medo de que mais algumas lágrimas acabassem escorrendo pelo rosto. Não queria mostrar como estava abalada, aquilo apenas preocuparia o filho.

Hey, Freak! (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora