V - Mágoa Antiga

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(Sem Assunto)

Oi,

Eu não quero parecer aquele desesperado que escreve desamparado porque sente falta e ainda nutre um sentimento irreal. Não!, longe de mim ser assim. Mas com o que eu posso parecer então? Se eu escrevo porque realmente eu estou sozinho, e preciso mais do que nunca de você aqui comigo, é porque alguma coisa ainda sinto, e aqui no fundo, bem no fundo, eu ainda sinto aquelas pontadas que sentia quando estava com você.

Sabe? Eu decidi que precisava correr o risco de ser o ridículo da história, de sair como o bobo, porque tem sido difícil ignorar tudo isso.

Hoje de manhã eu comecei a chorar, porque é hora de encararmos a verdade, eu nunca fui o que você realmente queria, eu nunca fui aquela pessoa que você buscava, e droga!, eu não via isso, eu não entendia isso. E para você era divertido fingir? Era entretimento o tempo que passávamos juntos ou não?

Agora eu só queria que você apagasse isso, que você limpasse meu coração e me deixasse vazio se pudesse, porque eu não consigo viver todos os dias tropeçando nos detalhes que me lembram você. Odeio forçar a mente pra lembrar da ultima vez que te vi, e descobrir que dói não saber mais onde você está.

Eu sei que fizemos tanta coisa errada, que você odiava o jeito como eu falava das coisas, assim como eu odiava o jeito que você deixava os sapatos espalhados pela casa, mas era a nossa casa, eram as nossas coisas, e eu sinto que hoje nada mais pode ser nosso, que eu nunca vou ser "nós" com mais ninguém.

Lembro de quando começamos a sair, quando na rua eu segurava sua mão, ou me pendurava em seu ombro e você sorria não se importando com o que diriam os que passavam na rua, porque o que importava naqueles momentos era a nossa proximidade, era a nossa vontade de sentir cada segundo um do lado do outro o mais próximos possível, porque logo eu iria embora para minha casa e você para a sua e não sabíamos mais quando nos veríamos de novo. E era gostoso, essa vontade que tínhamos um do outro e que culminava em qualquer dia da semana, quando não aguentando mais eu subia em um ônibus e corria pra te ver.

Você não tem noção do quanto me dói lembrar disso, de como é ruim sentir o vazio de ter feito tudo isso e não ter mais chances de fazer outra vez.

"Arrumem um quarto!" Gritavam para a gente no meio da rua. "Vão virar homem, veados", mas a gente não se importava e você ria, chamava-os de ridículos, e eu gritava "babacas" e dava o dedo do meio, e tudo se resolvia, e se algum deles voltasse eu não tinha medo de comprar briga por não aceitar o jeito como falavam de nós, eu odiava fazê-lo ouvir aquilo.

Agora, nesse exato momento, eu não sentiria tanto medo de arrumar uma briga de rua, quanto eu sinto medo de falar com você, medo de que fazendo isso só piore as coisas.

Eu sei que quando acabou, o fim foi tranquilo, que não brigamos, que não gritamos um com o outro, e só ficamos com um nada gigantesco entalado na garganta. Porque foi tudo bem resolvido, e eu não queria isso, na época eu queria, mas agora eu não quero mais, porque se você tivesse gritado comigo, se tivesse me acusado de algo, jogado meus erros na minha cara eu me defenderia, eu diria algo em troca e de um jeito ou de outro eu confessaria e reconheceria o que não estava dando certo, talvez eu mudasse à tempo de te fazer ficar.

Droga! Eu me odeio por isso, por tudo, sabe? Por ter sido o idiota que fui, e por estar sendo idiota agora voltando a mexer nessa ferida que parecia estar quase curada.

Eu só sinto falta de um pouco do que tínhamos, sinto falta de conversar com você, de alguém que me entenda como você me entendia. Tem sido difícil, porque tudo parece desolador aqui, a casa vazia é o que mais pesa em mim.

Menino-JúpiterWhere stories live. Discover now