Capítulo 10

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Na manhã seguinte, minha pele arrepiava sem qualquer aviso. Qualquer movimento, qualquer toque ou brisa reacendia aquela sensação quente em meu corpo, e minha mente divagava para Clarkson.

Nossos olhares se encontraram duas vezes no café da manhã; em ambas, seu rosto trazia a mesma expressão de contentamento. Era como se um segredo delicioso pairasse entre nós.

Embora nenhuma de nós soubesse ao certo se os boatos a respeito de Tia eram verdadeiros, decidi tomar a expulsão dela como um aviso e guardei a noite anterior para mim. O fato de ninguém mais saber a tornava ainda melhor, mais sagrada até, e eu a protegia como um tesouro.

O único lado ruim do beijo foi ter tornado todos os momentos longe de Clarkson insuportáveis. Eu precisava vê-lo de novo, tocá-lo de novo. Se alguém viesse perguntar o que tinha feito naquele dia, seria incapaz de responder. Cada um dos meus suspiros pertencia a Clarkson, e nada teve importância até eu voltar ao quarto para me vestir para o jantar. A promessa de vê-lo novamente era a única coisa que me mantinha inteira.

Minhas criadas estavam em perfeita sintonia com minhas novas ideias de visual, de modo que o vestido daquela noite era ainda melhor. Um tom de mel, com cintura alta e a saia mais volumosa atrás. Talvez fosse meio extravagante demais para o jantar, mas adorei mesmo assim.

Tomei meu assento. Clarkson piscou para mim, me fazendo corar. Eu queria uma iluminação melhor para poder enxergar o rosto dele em detalhes. Tinha inveja das garotas do outro lado da sala: toda a luz do pôr do sol entrava pelas janelas e pousava sobre seus ombros.

- Ela está brava de novo - murmurou Kelsa.

- Quem?

- A rainha. Olhe para ela.

Levantei os olhos discretamente para a mesa principal. Kelsa tinha razão. A rainha parecia irritada até com o próprio ar. Ela pegou um pedaço de batata com o garfo, encarou-o e depois jogou de volta no prato.

Algumas garotas se sobressaltaram com o barulho.

- Queria saber o que aconteceu - comentei, também cochichando.

- Acho que nada. Ela é uma daquelas pessoas incapazes de ser feliz. Se o rei lhe desse férias a cada quinze dias ainda não seria o bastante. Ela não ficará satisfeita enquanto não formos todas embora. - A voz de Kelsa estava repleta de desprezo pela rainha e por sua postura irritada.

Eu entendia o porquê, claro. Ainda assim, por causa de Clarkson, não conseguia odiá-la.

- Me pergunto o que ela vai fazer quando Clarkson escolher - cismei em voz alta.

- Não quero nem pensar nisso - Kelsa disse entre um gole e outro da sidra. - Ela é a única coisa que me faz não querer o príncipe.

- Eu não me preocuparia tanto - brinquei. - O palácio é grande o bastante para evitá-la sempre que possível.

- Bem pensado! - ela comentou, para em seguida olhar ao redor e conferir se alguém nos observava. - Acha que tem algum calabouço aqui para botarmos a rainha?

Tentei segurar, mas caí na gargalhada. Não havia dragões para mantermos numa jaula, mas ela chegava perto.

Tudo aconteceu muito rápido; imagino que era essa a intenção. Vi as janelas se despedaçarem quase simultaneamente, atravessadas por objetos vindos de fora.

Ouviram-se os gritos estridentes de algumas Selecionadas enquanto o vidro chovia em estilhaços sobre elas; aparentemente, Nova foi atingida na cabeça pelo objeto que quebrara a janela atrás dela. Ela se encolheu na mesa, abraçando o próprio corpo, enquanto algumas tentavam olhar para fora e ver de onde vinham aquelas coisas.

A Rainha - Felizes Para SempreOnde histórias criam vida. Descubra agora