2° capítulo ✓

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Quando cheguei em casa, recebi um olhar repreensivo vindo da minha mãe, até me assustei, ela não é de ficar quieta me encarando. Geralmente chega me xingando e jogando tudo na cara, me senti como se estivesse no meio de um julgamento prestes a ganhar prisão perpétua.

Talvez eu tenha mesmo feito algo ruim, já que decidi atrapalhar sua noite pós-plantão de 36 horas no hospital. Ela vive fazendo plantões, ela é cirurgiã e é muito importante sua presença lá. Mas agora não há nada que eu possa fazer, a não ser me jogar no sofá e ignorar cada palavrinha que ela disse.

— O que foi, mãe? — pergunto levantando minhas pernas e colocando uma almofada debaixo da minha cabeça.

— Anny, não sei mais o que fazer, você prometeu que iria melhorar. — ela começa a andar de um lado para o outro com as mãos nas têmporas.

— Eu tentei mãe, até você mandar eu ir comprar um fermento, porque aí foi o fim da picada. Eu dei de cara com um gato enorme, daqueles bem grandes mesmo, bem na frente do meu skate. Naquela hora, eu pensei: eu vou me tornar uma assassina de gatos, eu me metendo em confusão é algo que nunca deixará de acontecer. — falo séria e quando termino eu começo a rir.

— Um gato? — pergunta confusa me olhando.

— Sim mãe, sabe o que é gato? Aquele animalzinho fofo que anda sobre quatro patas e faz miau. Tem sete vidas e aqueles paranauês todos.

— O que você fez com o gato Anny? — disse ela de forma acusatória.

— Nada. Absolutamente nada. — falo com a consciência limpa. — Mas eu tenho um ímã para animais me odiarem, ele que veio pra cima de mim e nós dois caímos no meio da rua. Quando eu fui ver o que aconteceu, ele estava morto. -falo como se não fosse nada e ela fica indignada.

— Tá, deixa eu ver se entendi. — ela volta a andar de um lado para o outro, que mania estranha. — Então você que matou o gato do Flavinho? Bem que eu percebi que ele estava chorando desesperadamente na calçada segurando o animal morto. Você deveria parar de caçar confusão e tomar vergonha na cara. — ela fala me acusando.

— As pessoas estavam achando que eu tinha matado no gato, e era completamente verdade, eu só pude xingar todo mundo e sair correndo. — falei e ri.

— Você nem avisou que matou ele?! — ela me olha boquiaberta.

Às vezes eu acho que ela é meio lerda, o que ela não entendeu ainda? Por que fica fazendo perguntas sobre o que eu acabei de falar?

Anny, lembre-se: você está falando da sua mãe.
Fica de boa, ela não pode ouvir o que eu penso, só você, então vê se fica caladinho no seu canto, para eu poder resolver o enterro do bichinho na paz.
Você vai pro inferno, Anny.

Pensar comigo mesma não dá certo, minha mente é injusta comigo.

— Não mãe, eu não disse pra ninguém, vai que o pai dele cobra mais de mim na padaria. — dou de ombros e ela revira os olhos não acreditando no que eu disse.

— Meu Deus, o que você está falando...? Eu não te criei assim, tá ouvindo? — ela para e aponta o dedo para mim. — Me dê um tempo para pensar e vá tomar um banho, depois desça para conversarmos.

— Ok né... — dou de ombros e subo correndo.

Cheguei no meu quarto que acabei de decorar, ele fica no terceiro andar da minha casa, ou seja, tenho uma janela que dá direto pro telhado e eu tenho a total liberdade de fugir de casa. Mas é raro eu fazer isso, prefiro sair pela porta da frente e ver o caos acontecer. Com caos eu me refiro a minha mãe gritando meu nome para eu voltar e sair correndo atrás de mim.  Tenho um banheiro também que nunca usei, será a primeira vez hoje. Geralmente, eu uso o da minha mãe que é mais perto da cozinha, aí eu saio do banho e já vou comer. Eu curto assistir séries e filmes, me divirto muito, principalmente com terror.

Mas agora estou tomando banho para ter uma conversa bem séria com a minha mãe. Ela sempre diz a mesma coisa: "você deveria tratar as pessoas melhor", "seja um pouco meiga", "seja educada", e mais blá, blá, blá.
Mas agora parece que algo mudou, tinha que ser na festa da Camilla? Eu estava mesmo me divertindo enquanto atrapalhava sua noite maravilhosa. Além de estar tirando a maior onda com a cara das pessoas, todos estavam duvidando que eu podia ser mais rápida que ele.

Talvez algum dia ele seja importante o suficiente para ser mencionado, mas não hoje. 

Acabei o banho, vesti um pijama verde azulado de cupcakes e desci as escadas. Quando cheguei lá em baixo minha mãe estava assistindo TV, então eu resolvi dar uma passadinha na cozinha antes. Quem sabe bate uma fome no meio da discussão ou a gente fique ali o resto da noite? Fui andando de fininho, mas quando ia entrar na parte da cozinha, minha mãe fala:

— Anny volte aqui, não estou para brincadeiras hoje.

Realmente a coisa ta séria.

— Ah qual é, mãe? Não posso nem comer um bolo. Que preocupação toda pra nada. — me sento no sofá de braços cruzados.

— Nós vamos conversar seriamente sobre essa sua vontade extraordinária de sair para apostar corridas e quando volta ou está bêbada, ou eu acabara de pagar sua fiança, ou está desmaiada no colo de alguém. -fala brava enquanto desliga a televisão.

— Eu sinto muito, mas não tem nada pra fazer aqui em Flint a não ser isso, e olha, não tem nada demais em sair pra beber ou dirigir. Aquela vez em que o Bruno me trouxe aqui eu pensei que você ia matar ele, eu estava bêbada e num carro. A pior combinação, não é?

— Anny, eu queria muito não ter que fazer isso, mas eu não tive muita escolha. — ela me ignora e pega um livro, folheia ele até parar numa página com uma escola gigante, ou parece ser uma escola.

— E você está falando de quê? Até parece que você vai me mandar para um reformatório, nem pensa nisso. Eu sou normal, não sou alcoólatra e se der certo eu vou tirar a carta logo, logo para poder dirigir. — eu já fui logo avisando, semana passada ela me disse que as opções dela estavam acabando e que um reformatório era uma das coisas que restavam.

— Você irá para um internato na cidade vizinha, arrume suas malas e sairemos na segunda de tarde, ok? — fala e se levanta deixando o livro comigo.

— O quê? Pra uma daquelas escolas que você fica preso a semana toda e não pode nem ficar acordada de madrugada? Nem se envolver em relacionamentos, ou mexer na internet? Não mesmo, você não pode me mandar pra lá, eu tenho uma vida aqui fora e lá tudo vai se resumir em estudar e estudar, e acabar levando mil advertências, porque eu com certeza não vou fazer o que eles querem. — me alterei e ela arregalou os olhos .

— Você vai e já está resolvido. Qualquer outra mãe já teria te mandado para um reformatório na Rússia há dois anos, e nem pense em me fazer assinar mais advertências, ouviu mocinha? Agora vá dormir. — ela me manda apontando para o andar de cima e eu bufo.

Subo para o meu quarto ainda não me conformando com isso de passar meu último ano livre em um internato!
Fiz as minhas malas com todas minhas roupas, se eu vou para um lugar chato daqueles, eu pelo menos tenho que animar lá.

Queria conseguir fazer minha mãe desistir dessa ideia, mas não parece ser uma opção. O único jeito é eu ser expulsa. Só espero que eu não me arrependa de estar levando esse tanto de roupa e mais as malas com doces e materiais de pegadinhas, claro. Eu disse que precisava animar aquele lugar.

Terminei e caí na cama pra dormir, cinco horas da madrugada e eu guardando comida na mala. Nunca pensei que eu estaria fazendo algo assim.

Anny Stuart Onde histórias criam vida. Descubra agora