A casa

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Eu gostava do estilo rústico do lugar. Tinha uma pequena ponte que atravessava um riacho por onde eu deveria passar para chegar à casa. Depois um caminho de pedras tornava difícil levar as malas até a entrada.
A noite caia lentamente e as lanternas espalhadas pelo jardim já estavam acesas. Uma senhora nos esperava com um olhar gentil:
- Você deve ser Bran, a filha de Tomas e Rosa. Você não sabe o quanto eles esperaram por uma filha como você. Eles eram ótimas pessoas.
"Eles eram", eu já estava acostumada a ouvir isso. "Eram", porque estavam no passado. Eu não gostava de como isso soava. Mesmo assim sorri de volta para ela.
- É. Eles eram sim.
- Você veio sozinha, querida?
- Sim.
- Nenhum dos seus irmãos veio com você?
- Eu não tenho irmãos.
Ela me encarou com um olhar curioso, franziu as sobrancelhas e então olhou para baixo:
- Mas é claro que não tem - esperava que ela me mostrasse o lugar, mas, ao invés disso, ela simplesmente continuou - Escolha um quarto, qualquer quarto. Você foi uma das primeiras a chegar. Isso significa que a maior parte dos quartos está vaga.
Então abriu a porta e fez um gesto para que eu entrasse. Sorri e entrei lentamente.
O primeiro cômodo era a sala. O teto tinha formato de cone e era firmado sobre grandes toras de madeira. A sala tinha um formato circular e haviam três portas. Prestei atenção nas três portas porque, eventualmente, teria de escolher qual caminho seguir.
Virei-me. A senhora já não estava lá, muito menos Fal. Engoli um seco e levantei a alça da minha mala. Era pesada demais para carregar sozinha.
Sentei- me em um sofá e esperei até que alguém percebesse que eu precisava de ajuda. Ninguém percebeu. Então encarei a sala por alguns segundos e concluí que teria de carregar tudo sozinha. O que levaria uma meia hora.
Deixei a mala no centro do cômodo e me dirigi à primeira porta. A porta rangeu ao se abrir e revelar um extenso corredor. Fechei a porta.
A segunda porta dava para a cozinha. Eu podia dormir na cozinha. Ri de mim mesma.
Tentei abrir a outra porta, mas era muito pesada. Com um pouco mais de esforço, consegui abrir a terceira porta. Me deparei com uma grande biblioteca.
Levei minha mala para dentro da biblioteca e fechei a porta pesada. Deixei a mala ao lado da porta e caminhei por alguns segundos envolta da biblioteca.
Encarei uma estante que estava meio vazia. Passei a mão sentindo a madeira até encostar no primeiro livro: "Pássaros: todos as espécies que existem".
Deslizei os dedos pelo marcador de página e abri na página que estava maracada.
Fechei o livro, quase que por impulso. Estava aberto na letra C. Corvos. Coloquei o livro novamente na estante.
Então as paredes pareceram voltar a sussurrar. Não podia morar dentro daquela casa, não enquanto ouvisse sussurros vindos das paredes. Foi quando vi a porta que estava atrás de algumas estantes de livros.
Levantei minha mala outra vez e abri a porta. Dei um passo enfrente e minhas sapatilhas parfeitamente limpas afundaram na lama.
Tentei não arrastar a minha mala no chão enquanto caminhava pelo jardim. Já era quase noite e tudo que eu podia ver era o que as luzes das lanternas iluminavam.
Lembrei das minhas lanternas, que estavam dentro da minha mala e então sorri. Eu sabia que Fal pediria minha tia Miriam em casamento hoje e,por mais que eu estivesse infeliz de estar ali, estava feliz por Fal.
Continuei caminhando até enxergar uma luz que vinha do topo de uma árvore. Talvez fosse o momento de colocar meus óculos.
Eu não gostava de usar os óculos o tempo todo, mas já tinha mais de cinco graus de miopia, e não era algo de se conviver facilmente. Então sentei sobre uma pedra e tirei do bolso da frente a caixa onde mantinha meus óculos.
Fechei os botões do meu blazer. Estava frio. Coloquei meus óculos e olhei para cima.
No topo da árvore, estava uma estrutura de madeira que parecia com uma casa mal planejada. Era uma casa da árvore.
A luz fraca vinha de alguns vagalumes que estavam próximos à casa da árvore e a iluminavam. Não sabia se conseguiria subir as escadas ou levar minha mala até lá, mas isso não ia me impedir de tentar.
Primeiro, estiquei meus braços e levante a mala até o nível do piso da casa e tentei passá-la para dentro. Quando terminei, subi as escadas, ainda cansada, e sentei-me sobre o piso instável da casa.
A casa da árvore era pequena e instável, mas era preciso de mais do que isso para me assustar.
Deitei-me sobre o chão e, como estava muito cansada, adormeci alí mesmo, dentro da casa da árvore.
Vagalumes voavam sobre mim e passavam de dentro para fora da casa da árvore. A casa da árvore não dava tanto medo assim. Era uma noite escura na floresta, mas eu ia sobreviver.

A Oitava FilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora