Eu quero viver de poesia. Quero ler momentos em sonetos, escrever a vida em quartetos e brincar com os tercetos. Eu quero viver de poesia, em prosa ou verso, com uma métrica perfeita, uma rotina bem feita a ser seguida sem desvio. Esperto é quem existe, quem não insiste, aquele que faz cada dia a partir de uma batida, uma corrente. Na orquestra da vida eu quero ser o baixista do fundo, porque cansei de ser maestro, cansei de reger minha orquestra de surdos. Quero brincar de ser poeta e achar o sentido na mistura das vozes inquietas perdidas na cabeça, brincar de ser poética e contar as sílabas de desastres que aconteceram na minha vida. Quero viver em poesia, viver poeta, morrer poeta e me perder em sintonia.
Na poesia o pássaro é avião e borboleta voa em contramão, e nesse mundo eu posso ser astronauta que faz planilhas e formatos, ser um advogado chato. Quero viver de poesia porque é vitamina que o corpo não rejeita, é energia para cabeça, para os miolos, e eu tenho tanta fome de poesia. Eu tenho fome das emoções que estou perdendo, e congelando e parando. E em momentos a vontade e o prazer já se foram, e só quero viver de poesia, de poesia épica, onde o herói vem me tirar desse buraco. Quero viver em um poema de amor, quero viver nas histórias e ser guardada no seu coração, quero ser guardada no meu coração e nas memórias. Quero viver de poesia, porque poesia é igualdade, poesia não rejeita, nem machuca, aceita, ama, perdoa, enfeita, embrulha e guarda numa caixa de presente.
Guardado naquele pedacinho de uma futura alegria, um presente, você sabe que o que está presente em você é aquela mágoa antiga, e porque você guarda isso tudo pequena? Eu poderia dizer que não cabe tanto rancor assim em você, mas você adora um desafio criança, e isso não se faz. Eu te vejo tremendo no chão e respirando com dificuldade, eu sei que não está com frio, você não sabe o que está sentindo. Quer que tudo desapareça? Cansou de ser a culpada por toda aquela angustia embaralhada. Você sabe que não quer encarar a solução, e soluçando sozinha toma a decisão que será adiada e adiada. Parece que gosta de sofrer. Você quer viver de poesia, então viva de poesia e daqui a pouco vai ser só uma história de um autor frio e a pena largada em cima do papel. Seu conto não vai ser concluído, eu te conto.
