2- Mamãe

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Isso não é possível, não mesmo, nem tem como ser possível porque em momento algum essa porta se abriu.

- Olá... Filho. - Minha mãe bem ali, sentada na cama, é impossível.

- Eu estou ficando louco? - Coloco as mãos na cabeça e começo a andar de um lado para outro.

- Você sempre foi louco - ela ria.

- Vai embora. Você não é real.

- Eu sou real, se você quiser que eu seja.

- Eu não quero!! - Gritei.

- Então porque ainda estou aqui? - Ela pega uma lixa de unha e começa a lixar.

- Você terá que olhar em meus olhos, lute com seus demônios, mate-os, ou conviva com eles, para sempre.

- Ma... - Ainda não consigo dizer essa palavra.

- Fracote - ela riu. - Sequer consegue dizer uma palavra, seu fraco!

- Cala a boca!!

- Tudo bem então, mas eu ainda estarei bem aqui, sentada - ela alisa o cobertor.

- Isso não é real... Não é real... Não é real... - Eu dizia repetidamente.

Andava de um lado para outro tentando me convencer de que não era real, mas de nada adiantava, ela ainda estava ali sentada na cama lixando as unhas como se nada nunca aconteceu.

- Isso é impossível - disse.

- Por que impossível? - Ela pergunta.

- Porque... Porque você está morta!!

Ela da uma risada de deboche.

- Oh, é mesmo? - Ela diz ironicamente. - Nem percebi esses furos em meu corpo inteiro. - Ela levanta a blusa e mostra um monte de furos feito por faca, não era um nem dois, era um monte de furos em sua barriga e costas.

Eu tremia. Não conseguia me manter sem tremer.

- Está tudo bem com você, Andam? - Rimo perguntou.

- Não! - Grito para ele escutar.

- Muito bom! Agora você tem um amigo imaginário - ela disse rindo.

- Vai embora, por favor.

- Só se você disser a palavra.

- Eu não consigo! Sua maldita infernal, é tudo culpa sua!!

- Se você disser... Eu vou embora.

*Antes*

- Diga... Diga a Porra da palavra! - ela me batia, cada vez mais forte

- Eu... - Eu chorava, e muito. - Norma, para!! - Gritava para ela parar mas ela continuava.

- Não até você disser a palavra!

Ela me batia quase todo santo dia e eu tinha apenas sete anos, não era culpa minha se Paul, meu pai, não nos ajudava, e ela se afogava em bebidas alcoólicas.

Eu era filho único e morava com ela porque eu nunca conheci meu pai e nem mais ninguém da família.

Como eu era filho único ela só descontava toda sua raiva em mim, como se eu fosse o culpado de tudo.

- Seu bosta! - Ela gritava.

Quando finalmente terminou de me bater foi para a cozinha ae pegou uma garrafa de cachaça e começou a tomar na garrafa mesmo e em um gole ela tomou metade da garrafa.

Vejo uma faca em cima da mesa a pego e escondo no bolso de trás da calça toda rasgada que me sobrara.

Eu não aguentava mais isso e eu terminaria com isso... Agora.
- Bosta é você - digo alto suficiente.

- O que disse moleque?!! - Ela atacou a garrafa na parede e o líquido nojento e fedorento voou por toda cozinha. Ela vinha em minha direção com a cinta e eu apenas fique parado.

Quando ela chegou perto e já ia fazer o gesto para me dar uma "cintada" na cara, pego a faca em meu bolso de trás e a perfuro em sua barriga, ela para com a mão no meio do caminho e me olha inconformada, como se não acreditassem no que eu acabara de fazer.

Então a perfuro de novo... E de novo... E de novo... Cada vez mais e mais, mais forte e com mais raiva, e um sentimento de leveza vinha a mim a cada perfuração que eu fazia nela, eu estava livre, poderia fazer qualquer coisa e não teria alguém que me culparia por
todos seus problemas.

- Vá com Deus... Ma...- A palavra simplesmente não sai de tanto ódio que havia dentro de mim sobre ela. - Foda-se, eu não consigo.

*Agora*

- Até quando você vai me torturar com isso? É apenas uma palavra qualquer.

- Até quando eu morrer... Ah não, espera, eu já estou morta, não é mesmo?

- Se está morta o que faz aqui ainda?

- Você me quer aqui.

- Não quero.

Agora estou questionando minha sanidade.

- Então é só dizer a palavra que eu vou embora na mesma hora e você nunca mais me verá.

- O que você é? Um espírito? Um fantasma? Um demônio?

- Uma projeção da sua mente.

- Vai se foder. Sério. - Digo como muita raiva.

Encosto na porta e fico a encarando.

(...)

Essa vaca ainda está aqui, não a aguento mais, da para mata-lá de novo?

Por favor, vá embora, me deixe morrer sozinho.

Ela está ocupando tanto minha atenção, o tanto que fico pensando em como seria bom mata-lá de novo e de manda-lá embora e nunca mais a ver, de como me livrar dela, de tanto pensar nessas coisas mal percebo que a comida agora só vem um dia sim e um dia não, ela está tirando minha fome que eu nem percebi isso, só depois que parei por um momento e tentei pensar em outra coisa, o que durou muito pouco, por que as cenas dela me batendo logo voltavam tem minha cabeça dando looping.

Eu em momento algum cheguei perto dela, eu dormia no chão perto da porta mas me recusava a chegar perto dela.

(...)

- É só dizer uma simples palavra.

- Se é apenas uma simples palavra, porquê quer que eu a diga?

- Porque é o que está me prendendo aqui.

Fico a encarando enquanto como minha comida estraga e tomo  minha água com gosto de xixi.

- Tudo bem. Eu vou falar a palavra. - Digo já cansado de ficar olhando para sua cara enjoada.

- Finalmente.

- Ma... - Porque é tão difícil?

- Vai... Tô esperando. - Ela dizia inquieta.

- Ma... Mãe.

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