Me levantei da cama

386 31 6
                                    

Me levantei da cama, como todos os dias retóricos da minha vida, ele estava igual. Nada havia mudado, apenas uma coisa, por algum motivo me sentia leve, sem culpa, não sentia dor. Isso me alivia, porque dói. É uma dor pesada. Decidi continuar, como sempre, nunca desistir...nunca desistir é o que eu sempre digo. Para todos. Ai de mim, cuida dos outros e esquece da própria, irônico não?

Sai do quarto sem culpa, eu sempre sinto culpa! O que tem de diferente hoje? Eu não sentia nada! Na verdade, hoje eu sinto, mas até ontem eu não sentia nada, apenas dor, sofrimento. Eu estou feliz e ninguém vai estragar isso, pelo menos não hoje.

Fui para a cozinha, meus pais já estavam acordados, mas como sempre nem notaram minha presença, passei pela sala e minha irmã estava sentada, sentei ao seu lado e fiquei por uns 5 minutos, ela não falou nada! O que eu fiz? Nada como sempre! Eu só sou mais um fardo para essa família. Ninguém me nota. Quando eu saio da sala, todos se sentam no sofá. Decidi sair de casa, estava muito feliz para aguentar as pessoas me tratando assim.

Enquanto caminhava, ninguém me notava, mas o que está acontecendo, sou tão invisível assim? Para as pessoas que não sabem nem meu nome me ignorarem. Estou com medo! Deveria estar triste, mas não consigo, estou aliviada, mesmo sabendo que deveria estar triste. O que aconteceu? O que eu fiz? Meus olhos se encheram de lágrimas. Lágrimas... uma coisa tão normal na minha vida que eu nem notei a contradição, estava chorando estando aliviada? Estava chorando por que não estava triste? Não sei!

Continuei andando durante horas. Ninguém me via! Ninguém me olhava! De repente uma sensação obscura de medo, um calafrio subiu ao meu corpo, eu estava tremendo por dentro! Isso é ruim! Eu quero que pare! Olho para meus pulsos e vejo o sangue! Sangue! Meu Deus, o que eu fiz? Eu não sabia o que estava acontecendo. Mesmo tendo todos esses conflitos dentro de casa, eu os amo e lá é o lugar onde me sinto segura, é lá que quero estar nos piores momentos da minha vida! Ao lado deles, eu os amo! É lá que eu quero estar agora! Me virei correndo, estava tonta, não sabia de nada! Onde eu estava? Chamava alguém para pedir informação e ela me ignorava, como se eu não estivesse lá. Eu quero ir para casa!

Meus braços estão cheios de sangue! Cheios de cortes em minhas veias! Eu quero voltar! Eu quero voltar para casa! Corri! Corri sem direção, era como se alguém me chamasse, eu não sabia para onde estava indo, mas corri para essa voz. Uma luz branca surgiu na minha frente e de repente uma pessoa apareceu na frente dessa luz! Foi minha salvação, ela estava me vendo! A sensação de estar aliviada voltou e meu corpo parou de tremer por conta de calafrios seguidos. Eu estava bem. Sorri e perguntei se ele sabia onde ficava minha casa. Ele apontou em direção a luz branca e sorriu. Eu me senti segura e decidi seguir as orientações desse estranho. Fui em direção a essa luz e me veio um pensamento, como um estranho sabe onde eu moro? Me virei e ele sorriu, sorri, eu confiava, me virei novamente para agradecer e ele havia sumido. Olhei para baixo e não havia mais cicatrizes, apenas sangue em minhas roupas e esse sangue me assustava, eu não sabia de quem era. Continuei em direção a luz e de repente estava na porta de minha casa. Entrei gritando, chamando pelos meus pais, pela minha irmã. Meu cachorro estava deitado, levantou a cabeça quando passei e abaixou. O clima dentro de casa estava esquisito, muito quieto, onde estavam todos? Acho que saíram, fui em direção a meu quarto e cada vez que chegava mais perto uma sensação me consumia, tristeza, sofrimento, ansiedade, felicidade e por último, quando abri a porta, alivio. Eu não acreditava no que estava vendo! Minha mãe e meu pai abraçados, chorando, lendo um papel, uma carta. Reconheci o papel e as manchas de lágrimas que estavam nele. Eu lembrei! Lembrei de tudo. Esse papel era meu, eu havia escrito antes de parar com a dor. Fechei meus olhos e me virei lentamente em direção a minha cama e lá estava, meu corpo sobre meus lençóis manchados de sangue, meus pulsos cortados, em uma mão a lâmina e em outra uma caixa de remédio. Acabou. Eu não havia levantado hoje.

Sentimentos e emoções Onde histórias criam vida. Descubra agora