Teresa - Parte III

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O lindo parecia embevecido com visual completamente absorto no Verde. Seus olhos estavam super distraídos, ele nem me viu chegar.
Aproveitei a distração para ir para trás dele é tampar seus olhos. Contato físico nessas horas é importantíssimo. O cara sente seu cheiro, sua respiração... Aos 16 anos, eu achava que sabia tudo de conquista. E sabia mesmo, porque não podia reclamar, os meninos gostavam da minha pessoa. E minha pessoa gostava dos meninos. Nunca tive problema com o sexo oposto.
-Se você acertar quem é ganha um beijo - eu disse.
Nossa eu estava impossível!
-É a menina mais bonita da Barra?
Oooowwwwnnn!, fiz em pensamento.
Tudo bem que o correto não a "Bonita" e sim "Linda", e não "da barra", mas "do mundo".
Mas tudo bem, fiquei feliz mesmo assim. Felizona.
Tasquei uma bitoca na sua bochecha imediatamente depois. Senti que ele corou, ficou todo encabulado.
Que fofo!
Ainda por cima tímido! OBRIGADA, CUPIDINHOS!, comemorei mentalmente, assim, em letras garrafais, mesmo.
Apesar de empolgada, resolvi desacelerar. Não havia necessidade de ir com tanta sede ao pote. Ate eu estava me estranhando. Tudo bem que minhas amigas viviam me dizendo que eu era fácil, dada e coisa e tal, mas é que sempre achei que se a gente quer muito uma coisa precisa batalhar por ela, e dentro do conjunto Coisa, está o conjunto Meninos.
Então, nada mais justo que parte para cima quando se quer um beijo.
E tudo o que eu queria naquela hora era sentir o gosto do beijo do Gaspar, aqueles três segundos mágicos que antecedem o beijo.
Esquisito...
Olha como o mundo dá voltas. Nunca tinha pensando em encostar a minha boca na do Gaspar, mas isso era o que eu mais desejava naquele minuto.
Passeamos pelo Jardim Botânico e falamos de tudo: esporte, ídolos, cultura, Internet, novas tecnologias. De câmera fotográfica em punho (um hobby que ganhara nos EUA), ele registrava tudo, quase babando. Descobri que o cara era louco por fotografia, por plantas e por fotografar plantas. Logo, ponto pra mim, que o chamara para um lugar perfeito para aficionados por fotos e plantas. Modéstia la na china, eu era simplesmente um espetáculo quando o assunto era relacionamento, um enciclopédia ambulante sobre conquista.
Ele fotografou vitorias-régias por uns dez minutos e depois sentamos sob uma árvore para ele me mostrar as fotos que tirara no visor da câmera. Não demorou muito para levantarmos e seguirmos na nossa tarde ecológica. Votamos a andar, agora entre as palmeiras, e fotografamos muito. E entre os cliques lançavamos um para o outro olhares, assim, insinuantes. Cada vez mais intensamente.
Paramos. Sentamos num banquinho branco. Ele encostou no meu braço. Eu me aproximei dela. Ela aproximou-se de mim e botou a mão na minha nuca.
Ui!
Que frio na barriga me deu nessa hora, você não pode imaginar.
Claro que você pode, como sou tolinha!
Devagar, ele aproximou sua boca da minha. De olhos e lábios entreabertos, nos olhamos pela última vez antes do beijo. E lembro de ter dado nota mil aos segundos mais maravilhosos daquele dia, daquele ano, quiçá da minha existência até então.
Foi incrível. Nossas bocas se encaixaram com uma harmonia impressionante, que beirava a perfeição. O beijo, macio e na velocidade correta, durou longos e inesquecíveis minutos. Antes de engatarmos no segundo, uma pausa para beijinhos na nuca e olhares derretidos. Mais beijo! Meu coração batia tanto,o gosto da sua boca era tão bom... sem contar que o Gaspar era exatamente o que o dicionário define como carinhoso.
Como estava cada vez melhor, esperava ansiosamente pelo terceiro beijo quando ele se afastou de mim e disse, muito sério:
-Preciso te dizer uma coisa, Teresa.
Ô-ou!
-Tem que ser agora? - arrisquei.
-Eu tenho namorada.
O quê? Como?
Muita hora nessa calma!
-É sério? Tipo assim... é um relacionamento sério?
-É. O nome dela é Arianne, ela tem 18 anos, é de Chicago e deve vir para cá o Réveillon. Se a gente chegar a conclusão de que se ama mesmo eu me mudo para os Estados Unidos de vez e a gente se casa no ano que vem.
"A gente se casa? (SE CASA!) no ano que vem"?! COMO ASSIM!?
Aquela surpresa caiu como uma bomba atômica na minha cabeça!
-Caramba! Você não podia ter dito isso antes de me beijar? Afinal, estamos conversando há mais de duas horas! - reagi, num misto de surpresa e decepção.
Um lado meu estava injuriado por ele não ter sido sincero comigo; o outro não queria4 me deixar desistir daquela coisa boa que eu estava sentindo só por causa de uma gringa láááá longe. E, pior, que nem sabia se amava o cara!
O meu dilema foi se agravando quando percebi que depois de conhecer a boca do Gaspar, eu passei a querer o Gaspar inteiro para mim, algo que jamais tinha sentido antes, com nenhum ficante. Nem com o Luiz André, meu ficante mais sério naquela época. Meu passatempo era beijar meninos, beijar meninos, beijar meninos. Nada sério, nada mesmo. Só beijo.
Com o Gaspar era diferente. Senti um frio na barriga indescritível, um nó na garganta esquisito, um tremor nas pernas inédito na minha história.
Com a cara mais sonsa do mundo, ignorei todas as revelações bombásticas do meu quase- gringo e arrisquei:
-O que você acha de um banho de cachoeira antes de irmos para casa?
Ah! Perguntei, sim! Pode me chamar do que quiser, devoradora de meninos com namoradas no exterior, fácil, sem noção, piranha (É piranha!), do que quiser, mas foi o que senti na hora. Segui meu instinto e ele urrava por Gaspar, queria que ele ficasse perto dos meus poros o máximo de tempo possível!
Seu olhar hesitante quase me pregou uma peça, mas, para meu alívio, ele respondeu assim à minha proposta:
-Maravilha! Eu nem lembrava mais que no Rio tem cachoeira assim, tão pertinho do mundo civilizado.
-Aqui perto tem uma deliciosa. Vamos?
Pegamos um ônibus e em cinco minutos estávamos no Horto. Depois de uns vinte minutos caminhando numa trilha, demos de cara com a cachoeira. Lá, ele acabou falando à beça da tal Arianne, a quem, dentro da minha cabeça, eu só me referia como "The coe", vaca em inglês. Parecia gostar sinceramente dela, mas, ao mesmo tempo, não estava arrependido de ter me beijado. Disse isso com suas palavras.
A água estava gelada, gelada daquela que endurece os músculos quando a gente se molha. Apesar do banho de agua fria por conta da Arianne, a cachoeira do fazia esquentar o clima entre nós dois, aos poucos o frio ia dando lugar a um magnetismo que atraía um para perto do outro. Era inexplicável, ele também parecia surpreso, mas nossos corpos agiam sozinhos, eles se atraíam, eles queriam estar juntos, fugia à nossa vontade racional.
Não consegui a parar de olhar para ele, de fazer dengo para ele. Em resposta, ele olhava para mim de um jeito que me derretia e lançava de tempos em tempos um sorriso perfeito e cativante que me deixava com vontade de voar pra cima dele.
Suas covinhas, seu tom de voz, seu corpo, seu andar, tudo nele me atraía. Por que essa Arianne tinha que estar no meu caminho?, era a grande questão da minha vida naquele momento.
Mas a Arianne foi esquecida em menos de dez minutos na Cachoeira. Ele era inteligente, me fazia rir, me fazia refletir. E eu fazia o mesmo com ele, porque Gaspar riu e se divertiu no tempo que passamos juntos. Um casal perfeito. Se fôssemos um casal.
Quando já estávamos nos secando para ir embora, ele me puxou para perto e me tascou um beijo... um beijo... um beijo do tipo "OH! MY! GOD! (traduzindo: Ó! MEU! DEUS!)".
Nossa! Fui à lua, flanei pela Via Láctea, dei a volta nos anéis de Saturno, chorei ao ver um cometa. Quando voltei à terra, ele ainda estava lá, com a boca na minha, as mãos nas minhas. Yes! Ele estava gostando daquilo tanto quando eu!
Os Estados Unidos estavam pequenos, a Arianne, eu suspeitava, começava a ficar pequena, pequena... grande mesmo era o nosso amor.
Peralá!
Que amor, o quê? Nos tinhamos acabado de nos conhecer!
Senti a consciência pesar de novo com aquele pensamento romântico nada a ver comigo. Que mané amor? Eu não planejava amar ninguém antes de fazer 18! Como tem uma corrente que diz amar é só sofrer, eu prometi a mim mesma que não iria correr esse risco. E fiz isso do alto dos meus 11 anos.
-Melhor a gente parar com isso. Não posso fazer isso com a Arianne.
-Você não esta fazendo nada com a Arianne - eu deixei escapar.
Sim, eu sei que ele estava fazendo uma coisa muito feia com a Arianne! Mas eu estava tão feliz dentro dos seus braços!
Então eu disse, sem pensar:
-O que os olhos não veem o coração não sente.
-É? Pensaria assim se fosse com você?
-Com certeza!
-Mentira.
-Juro! Sabe o que seria imperdoável pra mim, se fosse sua namorada? Saber que você ficou com uma garota no lugar cheio de gente que eu conheço. Ai, sim, seria péssimo! Mas assim? Ninguém vendo? Ninguém sabendo? Você não está humilhando ou desrespeitando a sua namorada. Apenas seguiu um instinto.
-Instinto é coisa de bicho. E o que difere a gente dos bichos é que temos a parte racional. Nós pensamos, Tereza. Eu devia ter me afastado de você, ter dito não pro meu instinto.
Droga! Ele era bom nisso! Eu tinha que pensar rápido!
-É, mas você não se afastou de mim. Pelo contrário. Sinal de que queria muito que esse beijo acontecesse. Era mais forte que você, mais forte que a sua razão. E esse tipo de coisa é única, é rara...
Mandei bem pra carambaaaa!
-É? Não sei... Mas acho que você tá certa...
Yes! Yes! Eu estava conseguindo levar o menino para o bom caminho! Para o meu caminho...
-Claro que tô certa. Além do mais, isso vai ser um segredo nosso... ninguém precisa saber o que aconteceu hoje.
Que mentira! Imagina se eu não ia contar para as minhas amigas!
-Tá. Então... eu nem conto nada para a Arianne? - ele perguntou, muito fofamente, já se aproximando de mim de novo.
-Não! Quer dizer, conta! Conta tudo! Traições precisam ser confessadas.
-Sério?
-Sério. Tem que falar!
Estava claro que eu não queria ser uma brincadeira de verão para ele. Queria que, por minha causa, ele esquecesse a "cow" Arianne para sempre. E que "cow" Arianne ficasse muito irritada com essa traição horrorosa e deixasse o Gaspar só pra mim.
-É? Será que ela vai entender? - ele ficou pensativo. - Acho que sim... até porque existem traições e traições, né?
-Claro! Umas perdoáveis, outras inadmissíveis. A nossa aqui, é totalmente normal, admissível, perdoável, corriqueira... Aposto que a Arianne vai entender. - menti descaradamente.
-Você é muito especial, Tereza. Tá sendo muito legal essa tarde com você.
"Fica quieto, assim você acaba me conquistando" pensei em dizer, como se não soubesse que já estava 1000% conquistada.
Não resisti e perguntei:
-Legal? Só legal?
Tantos adjetivos melhores para aquela tarde: "perfeita", "maravilhosa", "inesquecível"!.
-Muito legal - ele disse, pegando na minha nuca e me dando um selinho.
Achei que o selinho ia virar outro beijo sensacional e continuei de olhos fechados, inclinada na direção dele, esperando meu beijo de cinema. Como o beijo não vinha, arrisquei, supersedutora:
-Quero te dar mais um beijo...
-Eu também. Mas...
-Não! Sem "mas", sem "mas", por favor! - implorei.
Tarde demais.
-Acho melhor ir embora. Esta ficando tarde e eu preciso pensar.
O que é que esse menino tanto quer pensar?, eu adoraria saber.
Mas no fundo, eu sabia, claro, no que ele queria pensar. Na sem-graça "coe" Ariane e nos momentos lindos e românticos que passaram juntos. E na traição horrorosa que ele tinha acabado de cometer.
Puxa vida, ele tinha que pensar e descobrir que eu era a paixão da vida dele e que Arianne era só uma "cow", ups!, uma namorada sem importância! Será que eu mexi com ele como ele mexeu comigo?, eu me perguntava a toda hora, angustiada.

Era Uma Vez, Minha Primeira VezOnde histórias criam vida. Descubra agora