Teresa - Parte IV

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Cheguei em casa e chorei a noite inteira. Rios e mais rios de lágrimas. Não quis nem conversar com a minha mãe, que sempre foi minha amigona.
-Sai daqui, mãe! Que saco! Não quero falar com ninguém! Ninguém! Saia! Eu quero paz! Paz! Será que é difícil entender isso? - berrava, atirando almofadas e revistas na direção da porta fechada.
Já com minhas amigas...
-Oi, Cla... Não estou legal para conversar hoje, bela... desculpe, foi mal... também te amo, depois te ligo... juro... beijo... - eu dizia docemente.
Queria ficar sozinha, pensando nos beijo maravilhosos daquela tarde e na revelação que teimava em ecoar na minha cabeça. "Eu tenho namorada". "Eu tenho namorada". "Eu tenho namorada".
Eu não sou ciumenta!, era o que eu devia ter dito a ele.
Mas não consegui. Teria dito isso se quisesse somente usá-lo para fins beijoqueiros. Mas não. Eu não queria só beijá-lo. Eu queria mais.
Ele não podia me achar uma menina fácil. Eu queria que ele me achasse a menina mais linda do mundo e ficasse a fim de namorar comigo. Por tempo indeterminado. Que ele desse um belo chute no travesseiro da pálida-sem-sal da "cow" Arianne para ficar com a sua branquela-porém-artificialmente-bronzeada amiga de infância.
Eu estava me corroendo de ciúmes da cofona da Arianne. Nem conhecia seu rosto, mas conseguia imaginá-lo. Devia ter cara de Barbie, cabelo palha de Barbie e corpo de jamanta, sem uma curvinha pra contar historia. E devia falar com um sotaque insuportavelmente nasalado, além de ser chata e modorrenta.
Não... se o Gaspar tinha se apaixonado por ela, a menina não podia ser nada disso. Não podia ser outra coisa a não ser gente boa. Muito gente boa.
-Por quê? Por quê? - eu fazia drama, aos berros, devorrando caixas e mais caixas de chocolate ao leite na solidão do meu quarto sempre bagunçado.
Amar sem ser amada é a pior coisa do mundo desde que o mundo é mundo. Ainda mais quando você tem 16 anos. E eu sabia que jamais conseguiria declarar meu amor para uma pessoa que amava outra pessoa. Que armadilha o destino me pregada.
Mas não pense que num primeiro momento eu admiti que amava o Gaspar. Imagina! Para mim, inventei a mentira de que apenas gostara muito, muito do seu beijo e de sua beleza interior. E de que era bom, muito bom, ficar com ele é conversar com ele. E estar com ele. E rir com ele. Só isso.
Passou um dia, nada de Gaspar. Mais outro, nada de Gaspar. Uma semana se passou e nem sombra de Gaspar. A essa altura eu já tinha absoluta certeza: estava completamente apaixonada. Tomei coragem, larguei a tristeza por alguns minutos e liguei para ele. A mãe atendeu, disse que ele não estava.
Aposto que era mentira. O Gaspar estava com medo de mim. De me ver, de sentir coisas por mim que não estavam em seus planos, ou melhor que mudaria seus planos. Só podia ser isso.
Mais três dias se passaram. O telefone tocava, meu coração disparava e logo em seguida tudo voltada ao normal, quando eu descobria que do outro lado era um amigo do meu pai, ou da lavanderia ou alguém perguntando se minha mãe quero a mudar de cartão de crédito ou de celular. Nunca era para mim.
As meninas pararam de me ligar. Fizeram um mutirão e bateram lá em casa: Clara, Tuca e Fernanda.
-Você esta nessa cama se entupindo de chocolate e espinhas desde a semana passada. Não vê que tem alguma coisa errada? - sugeriu Tuca.
-Isso seria absolutamente normal se estivesse acontecendo com qualquer uma de nós, mas com você? VOCÊ ficar triste por causa de um garoto? - completou Clara.
-VOCÊ que vive dizendo que meninos estão aqui para nos paparicar e nos fazer felizes? - arriscou Fernanda
-VOCÊ que não acredita no amor, e sim no prazer do beijo? - Tuca tentou mais uma vez.
-VOCÊ que nunca quis se apaixonar porque acha que amar é sofrer? - irritou-se Fernanda.
-VOCÊ que nunca se apegou a ninguém, a não ser ao Tadeu, aquele rato idiota e horroroso que te faz chorar dias seguidos quando morreu? Bicho frágil! - pegou pesado Clara.
-Rato é a sua mãe! O Tadeu era um hamster. E eu matei o bichinho! Ele caiu da minha mão e quebrou o pescoço! Normal eu chorar, né? Pode não parecer, mas eu tenho coração! - desandei a chorar.
-Ah, não, Teresa! Chega! Bota uma roupa, vamos espantar esse baixo astral. - decretou Clara.
-Planejamos uma tarde de sorvete, shopping e cinema para te animar - contou Tuca.
-Valeu, gente, mas quero ficar em casa.
-Teresa! Agora eu estou sinceramente preocupada. O que esse menino fez com você? O que aconteceu no jardim botânico? Você sumiu, não atende a gente, sua mãe disse que você vive cabisbaixa, não estuda mais, só chora e grita, mal conversa com ela...
-Já te ocorreu que você pode estar... a-ap-apaixonda por esse G-G-Gaspar? - perguntou Clara, cheia de dedos.
-Vira essa boca pra lá! Sou muito nova para me apaixonar, antes que isso aconteça vou beijar muitas bocas! - fiz cena.
-Acho que não, hein? Você negou imediatamente, sequer cogitou uma tarde de sorvete, shopping e cinema, isso é muito grave. Esse menino mexeu muito com você.
-Ai, Tuca, claro que não. Vocês estão viajando. Eu apenas gostei de ficar com ele, nosso beijo encaixou, só isso.
-E como foi sua tarde com ele no Jardim Botânico? Pode liberar os detalhes, anda... - pediu Fernanda.
-Ah... - os meus olhos brilharam. Só a lembrança do nosso passeio pelas aleias do parque, dos papos que tivemos perto do lago das vitórias-régias, do cheiro do verde e do barulho da cachoeira me davam arrepios de saudades dele. - A gente fez um monte de coisas.... - eu disse, com a cabeça caindo para o lado direito e o olhar perdido em algum lugar no branco do meu armário.
  Antes mesmo que eu começasse a contar como tinha sido minha maravilhosa tarde na companhia do maravilhoso ( e estupendo, lindo, bombom, dez mil vezes belo) Gaspar, gerei reações como:
-Não! - verbalizou Nanda.
-Não! - frisou Tuca.
-Sim! Sim, meninas. Aconteceu: a Teresa está apaixonada! - anunciou Clara.
-Não! -Não! -Não! Isso é só reflexo da MINÚSCULA dor, que já, já vai passar, causada PELO MINÚSCULO contratempo de que o Gaspar tem uma vaca americana estacionada no coração! É só isso! - expliquei para as meninas.
  Quem eu queria enganar?
-E você acha que se fosse só essa coisa minúscula você já não teria esquecido o cara e passado para outra? Não é você que vive dizendo "Rei morto, rei posto", "A fila anda!"? - questionou Tuca.
- Não é você que adora passar o rodo? - Clara piorou a minha situação.
  Ai, que saco ter amigas que te conhecem melhor do que você mesma!
-Eu estou triste não é só por isso....
-Está triste por que, então?
  Ui!
-Porque... porque... porque estou em crise sobre o que fazer no vestibular.
  Gargalhada geral. As três choraram de rir como se eu tivesse contado a piada mais hilária do mundo. Quando, enfim, o riso frouxo cedeu e elas se acalmaram diante do meu semblante apático, Fernanda decretou:
-Não é crime se apaixonar, menina! Não se culpe por isso!
-Eu sei que não é crime! Mas por que logo na minha primeira paixão eu arrumo uma pessoa que não esta disponível? Por quê? E eu só vi o menino duas vezes, como é que eu posso sentir tanta falta de uma pessoa que só vi duas vezes?
-Elementar, minha cara: paixão. O nome disso é paixão.
-Mas eu não quero! - choraminguei.
-Não tem essa de querer ou não querer. Paixão acontece assim, num estalar de dedos. 'O coração tem razões que a própria razão desconhece', nunca ouviu falar esse ditado? - disse Tuca, em tom professoral.
  As meninas me fizeram pensar. Saíram de lá quase duas horas depois, cansadas de tentar me animar. Belas, queriam me ajudar. Mas eu estava numa maré de pessimismo, certa de que o Gaspar, depois do nosso encontro, tinha pensado bem e percebido que Ariane, 'the cow', era a mulher da sua vida e que eu tinha sido apenas uma diversão carioca, um passatempo enquanto o grande dia do seu casamento gringo com a gringa vestida de bolo não chegava.
  Ele queria ser feliz para sempre com ela. Burro, eu estava tão mais perto, tão mais à mão do que ela, falando a mesma língua dele como ninguém. Porcaria esse negócio de paixão não correspondida. Logo comigo?
  Que sacanagem!
  Mais uma semana se passou e nada do Gaspar. Noticias dele, só pela minha mãe, que conversava quase diariamente com a mãe dele pelo telefone. Um belo dia, as notícias sobre Gaspar mudaram. Saíram "Gaspar foi visitar a tia" e "Gaspar passou a tarde numa loja de miniaturas de avião com o pai", que me davam uma espécie de esperança, entraram "Gaspar comprou um skate" , "Gaspar foi para Búzios com os amigos" , "Gaspar passou o dia inteiro na praia".
  O subtexto de todos esses recados era: Gaspar está ótimo. Excelente. Gaspar está feliz, nem ai para você é para sua tristeza, sua idiota. Enquanto você esta engordando e enriquecendo ainda mais a indústria do chocolate, ele está aproveitando a vida, rindo com os amigos e se divertindo.
  E eu corroendo de dor na solidão do meu quarto.
  Foi muito duro me tocar de que minha tarde encantada no Jardim Botânico tinha sido encantada só para mim. Aquele período de tempo que passamos juntos fora só uma diversao gaspariana em solo brasileiro.
  Porcaria!
  Estava decidida: precisava arranca-lo da minha memória, do meu coração, da minha cabeça, aquilo já tinha ido longe demais.
  Sai à noite. Botei minha saia mais curta e fomos a um show da banda Mico Sujo, de uns meninos do condomínio. Estava lotado de gente linda. Ótimo, já que eu queria ficar com alguém. Tinha certeza de que ressuscitar a boa Teresa velha de guerra seria a forma mais imediata a de espantar a tristeza a as lembranças daquele dia romântico-natureba.
  Dei tanto mole para o Ricardo Maicon, vocalista da banda, que acabamos ficando. Beija daqui, beija de lá, as meninas todas morrendo de inveja de mim, os cintilantes olhos azuis do menino mais cobiçado da Barra piscando para os meus e eu não conseguia tirar o Gaspar da cabeça. Por nem um segundo.
  Eis que, de repente, não mais que de repente, quem adentra o recinto?
  Ele! Gaspar!
  E eu estava atracada com o Ricardo Maicon!
  Não deu outra: quando vi o quase-gringo mais fofo do mundo, meu coração desandou a bater num ritmo bate-estaca, parecia que todas as minhas células se agitavam numa 'rave' animadíssima.
  Ao mesmo tempo que eu queria que ele me visse nos braços de outro, para que morresse de ciúmes (pelo menos que morresse só um pouquinho), eu não queria que ele me visse nos braços de outro. Não queria que ele ficasse chateado e achasse que eu estava namorando, ou que não pensava mais nele. Não queria que ele ficasse triste de me ver fora do meu quarto aproveitando a vida.
  Larguei o Ricardo Maicon e voei com a Clara para o quartel-general feminino, o banheiro:
-Mas o Gaspar não é nada seu! Vocês não tem nada! Desencana! -sacudiu-me Clara. - Você não pode e não deve se importar com nada que o Gaspar pense ou diga.
  Certa, certíssima.
  Estava pronta para voltar para os braços de Ricardo Maicon. Mas... é o choro? E os olhos inchados e vermelhos? O que fazer com eles? O que fazer para que ninguém (principalmente o Gaspar) visse que eu estava chorando? Droga! Por que eu estava chorando? Lavei o rosto pela milésima vez e tentei para de chorar. Pela milésima vez.
-Teresa, estou te achando muito amarrada nesse menino. Vai lá falar com ele, então!
-Ele tem namorada, Clara!
-Que está longe. E que não deve ser lá muito amada, porque ele passou uma tarde linda com você.
-E nunca mais ligou.
-Não é só a gente que tem medo dos sentimentos, inseguranças em relação ao que o outro pensa, tem pânico de amar, de cair do cavalo, de sofrer. Meninos sai de carne e osso. Como a gente. E se ele continuar sem saber que não foi mais um para você, fica mais difícil esquecer a americana.
-'The cow'
-Que feio, Teresa! Você nem conhece a menina! - repreendeu-me Clara.
  Certa, certíssima.
-Nunca vou ter coragem de falar com ele. E se ele dizer que ama a gringa na minha cara?
-Vocês se beijaram, ate cachoeira rolou. Ele não vai fazer isso. Mas se fizer, beleza, tira o time de campo. Cá de a sua postura de quem consegue tudo o que quer? Falar é fácil, fazer é que é difícil.
  Certa, certíssima.
  Eu falava, falava, vivia dando conselhos para as amigas, vivia exibindo minha felicidade em conquistar, minha falta de comprometimento com as regras impostas pela sociedade, meu super amor-próprio, minha vontade de lutar pelos meus objetivos.
  O objetivo do meu coração, Clara lembrou muito bem lembrado, estava ali, do lado de fora do banheiro. E eu estava ficando com outro. Sem a menor vontade. Tudo errado!
  Chorei mais um tantinho no ombro dela antes de sair do banheiro e enfrentar o touro na arena. Mais eu queria só passar por ele, sabe? Para uma rápida troca de olhares e e um breve levantar de sobrancelha.
-Não faz isso, Teresa! Fala com ele, diz a verdade, diz o que você Ta sentindo!
-Ta louca? Não vou conseguir. Nunca... Não insiste, Clara!
  Com o coração tremendo e o estômago em brasas, procurei meu quase-gringo com os olhos e logo o avistei. Frio na barriga intenso, duradouro. Doido. Aquele menino mexia comigo mesmo.
  Eu precisava vê-lo de perto.
  Do outro lado, Ricardo Maicon me procurava. Foi ai que me peguei dando uma ligeira abaixadinha, para tentar me encolher e me esconder na pequena multidão que lotava a boate.
  Cena ridícula.
  Fui firme na direção do Gaspar. Pronta para olhar, levantar a sobrancelha para ele é seguir caminho. Clara atrás de mim, louca pra me fazer mudar de ideia.
-Eu não vou conseguir dizer nada para ele, não insiste - eu disse entre os dentes. - Vou no máximo dar um "oi" e só.
-Se você não dizer nada, eu digo.
-Você não seria capaz. - Eu tremi nas bases.
-É o que você pensa. - ela rebateu, desafiadora.
  Andamos mais um pouco desviando da galera e finalmente o olho do Gaspar encontrou o meu. Ufa! Ele sorriu com os olhos. Depois baixou-os, meio envergonhado, e levantou-se de novo, para terminar seu sorriso ocular. Retribui com os olhos felizes e, confesso, um tanto marejados. Mas aguentei firme, não chorei.
  Quando passei por ele, paramos frente a frente.
-Oi Gaspar. Tudo bem? - perguntei, tentando ser natural.
-Tudo. E você? - ele disse, sem aparentar muito entusiasmo.
  Então aconteceu o inesperado. Sabe aquela sensação de não querer falar com ele que eu contei nas linhas acima? Esquece!
-Tudo ótimo. Ótimo! Maraaaaraaavilhoooso! Melhor que maravilhoso, excelente. Excelente é melhor que maravilhoso, né? É, com certeza é, é sim. Minha vida está, assim sensacional, excelente, um espetáculo, coisa de louco! Perfeita mesmo. Nunca esteve melhor. Sabe quando tudo dá certo? Tudo, tudo tudo? Então! Até minhas notas em Química melhoraram, acredita? E eu odeeeeio Química, cê sabe né? Não, não sabe. Dana-se. Coisa mais inútil, Química. Química e bala de anis. Tem coisa pior do que bala de anis? Não, não tem.
  Paris o discurso por motivo maior: um chute certeiro da Clara no meu tornozelo.
-Que bom que tá tudo bem com você - ele reagiu, seco.
-É, é bom sim. Bom, nada, é um espetáculo.
-Hum...
-Arrã, Arrã... Arrã.
  Silêncio. O maior silencio que aquela boate barulhenta já ouviu. O silencio mais desconfortável e demorado que o planeta Terra presenciou desde o tempo dos dinossauros.
-Soube que você comprou um skate...
  Ele olhou para baixo.
  Ô-ou...
-Dei uma sumida, né? Desculpa.
-Que desculpa, o quê? Sumiu nada! Imagino quantos amigos querem te rever. Deve estar difícil ser um só, aposto que parentes, amigos e seu pai e sua mãe estão sugando toda a sua atenção. Na novela ontem, aquele ator que eu não sei o nome estava usando um casaco idêntico ao seu, acredita? E o skate? Você comprou um skate... mas eu já falei sobre o skate. Você que não respondeu minha pergunta sobre o skate.
  Estava mais verborrágica do que nunca, falando sem respirar, comendo as palavras, que vergonha! Ainda bem que o Gaspar me cortou:
-É. Comprei um skate.
-Olha só, quem diria... Uau.... U-huu-huuu... - eu disse, sem encontrar nada melhor para dizer.
-E terminei com a Arianne - ele prosseguiu, deixando meu coração doidinho, à Beira de um treco. Um treco bom, mais um treco em chamas por dentro, eu tentava aparentar pouco interesse quando, na verdade, tudo o que eu queria era arregalar o máximo meus olhos e abrir o mais que pudesse minha boca enorme. - A gente resolver dar um tempo, para eu ajustar a minha cabeça antes de pensar em casar, em mudar de país. Sou muito novo. Ela também.
-Ah, isso eu acho também. Os dois são muito novos, muuuiitooo novos. Muito jovens, jovens demais, exageradamente jovens, estupidamente jovens. E juventude é para ser vivida. Vi-vi-da! Vivida pelos jovens. Gente nova é gente jovem, gente jovem gosta de novidade, de juventude, de jovens, de pessoas jovens. Jovens.
  Um novo e mais potente chute de Clara foi a senha para eu calar a boca. Salve, Clara!
  Ele prosseguiu:
-Eu preciso ter certeza dos meus sentimentos, Tereza. Depois daquela tarde, eu... eu fiquei bastante confuso em relação a eles.
  Póóóóin!, ouvi um martelo de criança bater na minha cabeça.
  Caraca!!! Caraca com 1.200 pontos de exclamação era a palavra que não saia da minha cabeça.
  Ele tinha terminado com Arianne, a feia, a ridícula, 'The cow'! Terminado! E estava confuso em relação aos seus sentimentos! Fiquei chocada, foi a frase mais adulta que tinha ouvido até então.
  Tomei coragem e disse:
-A gente precisa conversar, Gaspar.
-Não, nada de conversar, Teresa, por favor. Eu ainda estou mastigando a ideia do termino com a Arianne, não estou preparado nem para conversar, nem para começar alguma coisa agora. Quero ficar sozinho um tempo, preciso de um tempo para mim.
  Tempo para mim? Foi isso o que ele disse? Pééééé!, soou a campainha ensurdecedora em toda a minha cabeça. A velha história que, do alto dos meus 16 anos, eu conhecia de cor e salteado. O cara terminava um relacionamento significativo e nunca queria emendar noutro, precisava se encontrar, se descobrir, aproveitar a solteirice, andar com as próprias pernas, sempre o mesmo e batido nhenhenhém. Descobri, anos mais tarde, que na fase adulta o homem substitui o insosso "preciso de um tempo para mim" pelo pseudossério, pseudofreudiano, "o problema não é com você. É comigo". Sim, e ainda tem o terrível "estou num momento muito meu".
  Esse momento muito deles é o momento para galinhar, para beijar muito e muitas.
  Explicações sobre o sexo oposto à parte, que grosseria do Gaspar! Quem ele pensava que era? Quem dava a ele o direito de falar daquele jeito comigo?
-Desculpe, desculpe, eu estou nervoso. Além de todo esse rolo, briguei com a minha mãe, ando irritado, mal-humorado, tenho sido um péssimo filho. Desculpe. A gente se vê.
  E me deu as costas e foi embora. "A gente se vê"? Não era esse o combinado!
  Dei um chutão na canela da Clara.
-Posso saber por que ele não se jogou em mim e me deu um beijo desentupidor de ralo?
-Porque a vida não é do jeito que a gente quer... e porque você esta ficando com o Ricardo Maicon.
-O Ricardo Maicon! - lembrei, levando as mãos à boca, e sai correndo para o outro lado da boate.
  Ricardo Maicon tinha desistido de me e esperar. Sentindo-se um pop star, dava autógrafos para as menininhas histéricas da Barra e tirava fotos e dava em cima de uma aqui, outra acolá.
  Paguei a conta e fui para casa com a Clara.

Era Uma Vez, Minha Primeira VezOnde histórias criam vida. Descubra agora