Edward chegou ao porto muito cedo. O capitão que iria levá-lo possuía traços peculiares. Sua barba era longa e grisalha, a pele levemente bronzeada e seu rosto abrigava olhos de um azul muito escuro e sobrancelhas grossas que uniam-se no meio, deixando confuso onde começava qual. Com um olhar curioso, o homem examinou Edward dos pés a cabeça. Não era difícil decifrar o que ele estava pensando porque era óbvio que se perguntava o que um homem de tão boa aparência estaria indo fazer na Irlanda.
- Não sei que raios o senhor pretende naquelas terras amaldiçoadas! - debochou com ar de desdém enquanto deliciava-se com seu charuto. - O senhor não sabe que o tifo se estende por toda aquela ilha? O que irá ver por lá serão apenas mortos vivos. Um inglês almofadinha como o senhor não irá sobreviver muito tempo naquele lugar. - O homem soltou uma lufada de fumaça que incomodou Edward.
- Grato pelas informações - agradeceu secamente e forçou um sorriso. - Mas eu posso cuidar da minha própria vida e sei bem o que estou fazendo.
O capitão do navio ergueu as sobrancelhas para ele mantendo seu sorriso de deboche e, em seguida, desapareceu dentro da embarcação. Aquele tratamento poderia parecer um tanto descortês e grosseiro à primeira visa, mas para aquele homem era inconcebível que, enquanto o objetivo de muitos que estavam nas ilhas verdes era tentar chegar à Inglaterra ou, em outros casos, até mesmo migrar para países distantes, aquele janota quisesse se expor daquela maneira. Para o capitão, aquilo era quase um insulto a quem não tinha a oportunidade de gozar de boa saúde e de riquezas; a quem estava confinado àquele lugar esquecido.
Havia poucas pessoas na embarcação quando o navio zarpou. A maioria dos tripulantes eram pessoas simples e, durante a viagem, Edward não pôde deixar de notar os olhares que dirigiam a ele. Todos, ponderou, certamente estariam pensando o mesmo que o capitão.
- E então o que o senhor fará na Irlanda? Um passeio? - perguntou um dos tripulantes de forma arrastada. Estava bêbado, aquele homem, apesar de ser cedo.
Edward pôde perceber aquilo não só pela forma como ele alongava as palavras, mas pelo mau cheiro que exalava. Não valia a pena trocar palavras com quem provavelmente não manteria um diálogo racional, então ele simplesmente dignou-se a ignorá-lo. Permaneceu debruçado, olhando para o mar azul. O dia estava particularmente bonito, ainda que o sol estivesse tímido e um vento frio soprasse.
- Não irá responder, inglês? - insistiu e acercou-se de Edward.- Já sei! - O bêbado gritou como se estivesse em um espetáculo no teatro e os demais tripulantes fossem os espectadores. - Deve ser uma mulher! - E ele fez um gesto que denotava que a mulher em questão devia possuir um corpo bastante atraente.
Alguns fizeram um gesto negativo com a cabeça e outros riram. Edward comprimiu o lábio numa linha fina e empunhou as mãos para baixo, procurando conter a onde de irritação que subia pelo seu corpo.
- Um conselho, inglês - o homem arrastou ao ouvido de Edward: - quem quer que seja essa mulher, deixe que ela morra lá. Essa meretriz que o seduziu não merece que o senhor acabe com sua vida e é provável que agora mesmo já esteja esquecendo o senhor com outro...
Edward não pôde deixar de pensar em Jane e, aborrecido com aquelas constatações infundadas, num fervor quase irracional, ele avançou sobre o homem e o agarrou pela parte superior da camisa. Antes, porém, que pudesse se arrepender de seus atos, controlou-se e, em vez de acertá-lo, soltou-o bruscamente. O homem estava tão bêbado que com aquele mínimo esforço foi ao chão. Uns gritavam incentivos para que um confronto se iniciasse; outros se retiravam, com receio de presenciarem atos tão primitivos.
O bêbado sorriu com seus dentes amarelos e limpou o líquido que escorria do nariz na manga suja de sua camisa. Levantou-se e precipitou-se até Edward, tentando acertá-lo com o punho fechado, mas ele defendeu o golpe, segurando-o e torcendo a mão dele e mais uma vez tentou afastá-lo. Não pretendia servir de atração para ninguém e queria manter-se longe de brigas.
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Tudo o Que Mais Importa (Versão Wattpad)
Historical Fiction[ESTE LIVRO NÃO CONTÉM CENAS HOTS] Todos os direitos autorais reservados a Naiara Aimeé. Proibida a copia ou reprodução, no todo ou em parte, através de quaisquer meios. Registro na biblioteca nacional. *PLÁGIO É CRIME!* Podendo haver pena - detenç...