Capítulo 2

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Lydia

Passei o resto da tarde em meu quarto, não tinha a mínima vontade de sair quando vai saber Deus quando eu irei voltar para ele. Eu posso não ter deixado o prédio, mas a notícia da minha "saída" já havia se espalhado como folhas ao vento, só que, ao invés de rajadas de ar, eu tenho a minha própria agente transmissora de informações pessoais e constrangedoras, e ela se chama Emma.

Aquela menina pode até ter somente 1 metro e 53, mas faz uma fofoca correr como ninguém. E, acredite em mim, não tem lugar mais amplo para fofoca do que a Academia Anjo Gabriel, "a maior escola para anjos em treinamento do mundo". Escutei tanto essas palavras durante a minha infância que desconfio que elas tenham grudado no meu cérebro como se fossem chiclete colocado em baixo das carteiras na escola.

Eu terminei de arrumar a minha mala, se é que se pode chamar aquilo de mala. Uma mochila preta com todos os meus essenciais: duas trocas de roupa, documentos (falsos, é claro), dinheiro, algumas barrinhas de cereal para momentos críticos, mas estava faltando algo, a coisa mais essencial para um anjo que irá sair sozinho, armas.

Abri a segunda porta do meu armário de madeira, cada estudante deve ter em seus aposentos algo que nós gostamos de chamar de "armário da morte", são regras da escola para evitar ataques e coisas do tipo. Eu não posso dizer que desaprovo essa regra, faz tudo aquilo parecer mais real. Peguei facas, uma espada curta e a minha adaga favorita, e alguns frascos com remédios, instrumentos completamente normais para um anjo em treinamento, mas que deixariam os seguranças de qualquer aeroporto malucos. Esse é um dos motivos para nós nunca viajarmos de avião, pelo menos enquanto podermos evitar.

Achei que a minha mochila estava pronta, mas errei. Eu precisava levar alguma coisa que me lembrasse daquele lugar, ali era a minha casa e eu tinha que ter uma coisa para me lembrar do porque eu tenho que me sair bem na busca. Algo que me lembrasse o que me esperava quando eu voltar. O que eu escolhi? Não foi difícil, pelo menos não o quanto eu pensava que seria.

Simplesmente agarrei uma foto do meu mural onde é possível ver três crianças sorridentes: eu, Emma e Danny com nove anos de idade, no nosso primeiro ano aqui, éramos novos e inocentes e não sabíamos o que nos aguardava alguns anos para frente. Coloquei a foto na mochila e a fechei, olhei para o pequeno relógio vermelho sangue que fica na minha mesinha de cabeceira, já era hora de ir.

***

O meu quarto fica no final de um longo corredor repleto de portas que levam para os quartos de umas vinte meninas, esse é sem dúvida o prédio mais barulhento do campus, e a caminhada da minha porta até as escadas parecia durar uma eternidade. As lembranças começaram aí.

Danny e Emma me acompanharam e não deixaram o meu lado desde que passei pela porta do quarto. Eu absorvi cada detalhe daquele lugar, as paredes marfim com detalhes em pedra, o teto iluminado por lindos lustres, o chão de mármore escorregadio e, enfim, a escada com seus majestosos degraus. Por um segundo, eu juro que consegui ouvir as risadas de três pessoas. Uma imagem surgiu em minha cabeça, eu, Emma e Danny voltando de alguma festa em que, novamente, Emma ficou bêbada, por isso meu amigo e eu a carregávamos para o quarto, torcendo para que ela não vomitasse em nós. Apesar do clima de despedida, eu ri.

Sra. Campbell estava esperando no fim das escadas com a mesma aparência de sempre, uma beleza incontestável que faz um contraste interessante com a ferocidade no olhar. Ela estava acompanhada por um homem baixo e musculoso, ele parecia mais desconfortável do que furioso ou destemido, o reconheci como sendo um dos monitores que foram admitidos recentemente, nenhum aluno gosta dos monitores e eu não posso os culpar, eles são um tanto inconvenientes. E lá estava um deles, parecendo que estava tendo uma crise renal enquanto tentava (e falhava) disfarçar o fato de estar me encarando uma área muito particular do meu corpo. Ele me dava nojo.

Duelo de anjosWhere stories live. Discover now