Lydia.
Eu corri. Corri como se a minha vida dependesse daquilo, e ela realmente dependia. Eles me perseguiam a uma velocidade surpreendente, mas eu fui mais rápida. Sim, também sou muito humilde.
Conseguia sentir as batidas do meu coração ecoarem pelos meus ouvidos à medida que eu aumentava a corrida. Porém, de uma coisa eu sabia: Não podia correr para sempre, uma hora eu irei cansar, uma hora eles irão me pegar. Olhei por cima do ombro e vi três figuras deformadas me perseguindo, suas faces são semelhantes a de humanos, mas seus olhos são vazios, e as expressões se perdem em meio a sede por sangue. Meu sangue, sangue de anjo.
Eles estavam a uma distância considerada vantajosa para mim, levariam no mínimo sete segundos para me alcançar caso eu parasse. Ainda correndo, eu puxei a espada curta de dentro da mochila presa firmemente as minhas costas. Essa era a minha chance.
Virei em direção aos vultos sombrios que me perseguiam e contei. Contei os segundos até eles se aproximarem. Minha noção sobre o tempo sempre me impressionou, eu nunca erro. Um, dois, três, quatro. Quando eu mentalmente cheguei ao número sete, eles estavam perto o suficiente para eu atacar. Então eu me lancei sobre eles. Três contra um não seria considerada uma luta justa, entretanto era o sangue que eles tanto queriam que me dava vantagem.
Eu girava e cortava em uma dança mortal, na qual toda e qualquer tipo de variação da coreografia, eu ensaiei a vida inteira. Um dos meus golpes acertou uma das criaturas no pescoço e uma substância gosmenta vermelho escuro fluía da ferida fatal enquanto o corpo estendia no chão. Um já foi.
Ao meu redor, o mundo se dissolvia. Os sons se anulavam e tudo o que existia era eu, minha arma e uma luta que não posso perder. Eu girava, e a minha espada girava junto comigo, como se deslizasse em correntes de vento. Um deles, uma mulher, atira uma pequena, porém afiada faca em mim. Eu abaixo para me desviar dela e com isso retribuo o seu favor. Passo minhas pernas ao redor de seus tornozelos e a derrubo com toda a minha força. Ela bate no chão com um barulho estrondoso e, em um movimento rápido e preciso, minha espada transpassa seu abdômen.
Só resta um.
Enquanto me levanto, um garoto magro, porém ágil, me enforca e pressiona o que deduzo ser uma adaga a base da minha coluna. Ele estava pronto para me matar. Ele hesita por um segundo inteiro. Grande erro. Consigo sentir sua risada contra a minha nuca, mas ela se sessa quando o puxo pelos braços e ele vai ao chão. Um dos meus joelhos prende a sua mão, o outro pressiona seu peito e minha mão se fecha firme no punho de minha espada que descansa horizontalmente em sua garganta.
Paro por um instante para recuperar o folego, e consigo ver a pouca idade que aparenta ter. No máximo dezessete anos, talvez nascido em meio a uma vida desgraçada, talvez sugado involuntariamente para ela. Não importa quão novo ele seja, não posso hesitar.
- Fica esperta, isso não acabou. – O encaro por uma fração de segundo mas seus olhos não revelam nada. Essas foram suas últimas palavras. Sua garganta jazia aberta, e a gosma respinga em mim. Não era mais sangue, porque ele não era mais humano,
Sinto o aroma ácido em meu rosto e em minhas roupas. Meus olhos varreram o local para ter certeza de que não havia ninguém olhando. A última coisa que eu precisava era ter que lidar com alguma pessoa apavorada e, provavelmente, traumatizada.
Eu limpo a espada com um pedaço da blusa de uma das criaturas que me atacaram, eu arrasto os três corpos com um pouco de esforço. Eles com certeza eram mais pedados do que parecem. Eu largo os três em uma mata perto de onde eu estava, a última coisa que eu precisava era que alguém visse aqueles corpos enquanto eu ainda estava por perto. Começo a caminhar lentamente pelas ruas desertas de São Francisco. O horário me permite passar despercebida, já que não tem quase ninguém na rua ás 4 horas da manhã de uma segunda-feira. Meu ônibus parte daqui a três horas, e eu sou obrigada a entrar em um banheiro de uma lojinha de conveniência de um posto de gasolina para trocar de roupa. Não preciso nem comentar o quanto ele era nojento.
A jaqueta já foi guardada em minha mochila a muito tempo, assim que saí de Oregon. Troquei a calça por um short preto e tirei a blusa de manga comprida, me deixando somente com uma blusa vermelha de meia manga. Só o que continuou o mesmo é o par de botas e o meu cabelo que se encontrava em um estado deplorável.
Guardo tudo na mochila e lavo meu rosto na pia do minúsculo banheiro. Faço um grande esforço para ignorar a imundice do local. Fecho os olhos por um instante, deixando a água escorrer pela minha pele, bem no fundo tenho a esperança de que vou levantar o rosto e estarei no meu banheiro, de volta a academia. No entanto, eu sei que é uma simples ilusão.
Essa é a realidade que me encontro agora, tenho que achar esse garoto e leva-lo até a escola, no meio tempo eu rezo para que não sejamos atacados, porém acontecimentos mais recentes provam que o meu desejo não vai acontecer. A viajem não será fácil. Encaro o meu reflexo no espelho e pergunto mesmo sabendo que não haveria uma resposta: "No que você foi se meter, Lydia?"
O meu reflexo não disse nada, mas eu já sabia a resposta, e ela não é nada boa.
YOU ARE READING
Duelo de anjos
FantasiToda menina comum vai ao shopping, faz compras, e morre de tédio à tarde em casa, mas não é assim que as coisas funcionam para Lydia. Sua casa é sua escola, mas não é um colégio tradicional, ao invés de aula de matemática, ela tem aula de combate c...