1901-PHOENIX

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Música: 1901 - Phoenix.

Título: The Contesters

- Não questione!

- Siga as instruções!

- Evite o caos!

A voz metálica, vinda dos alto-falantes, alcança a todos. Para cada frase curta, o intervalo é de aproximadamente dez segundos. Haverá ainda outros dois comunicados, no total são quatro, exatamente nas mesmas horas: seis, meio dia, dezoito e vinte e quatro horas. Nem um segundo a mais, nem um segundo a menos.
De acordo com a Aliança, a repetição nos leva à plenitude. Plenitude, em Anagnórisis, quer dizer prevenção. Conhecendo as regras, não se corre o risco de desobedecê-las.

Hoje é o primeiro dia em que essas mensagens me irritam, pois aos meus ouvidos soam inéditas e eles só conseguem escutar "controle", "controle", "controle".

Eu e Artie continuamos andando sem que ninguém nos note. Aliás, sempre foi assim. Porém, antes era normal, quer dizer, acreditava que fosse.

Percebo a expressão preocupada de Artie, algo que quase consegue estragar a harmonia de seu rosto. Temo que as gotas de suor que se formam em sua testa nos denunciem. Geralmente não fica ninguém na entrada, mas prefiro contar com o imprevisível. Discretamente apanho em sua mão.

- É o certo – digo baixinho, apertando levemente sua mão.

- É o certo – concorda, enquanto nossas mãos se separam.

O grande complexo, totalmente na cor cinza, tem um formato singular que, no mundo pregresso, foi conhecido como colmeia. Para nós, é tão somente o Limbo, ou o Ostracismo, como dizem os mais antigos.
Em nossa sociedade ir para o Limbo significa desaparecer. Apenas a hoste, responsável por preservar o equilíbrio e debelar qualquer agitação, e os curae, incumbidos de nos manter saudáveis, entram e saem do prédio. Todos os outros que vão para o Limbo jamais retornam aos seus.

Desaparecer é diferente de perecer. Embora nossa tecnologia esteja bem avançada e, cada dia menos tenhamos perecimentos que não tenham sido previstos, eles ainda acontecem. Em nossa aula sobre o mundo pregresso, aprendemos que o perecimento era chamado de Morte. Fora das aulas, o termo foi extinto, pois segundo os preceptores, a Morte, diferente do perecimento, não podia ser prevista, muito menos controlada. Controlá-la fez com que nosso mundo se instaurasse e o homem responsável pelo feito se tornou nosso regente, passando seu seus conhecimentos e seu cargo apenas para seus descendentes diretos.
Assim, para o Limbo não são levados aqueles cujos perecimentos estão previstos. Ao contrário, estes são deixados junto às suas famílias para que seus últimos momentos sejam ternos. Apenas pessoas consideradas ameaças à estabilidade do nosso mundo são levadas para o Limbo. Ou seja, aquelas em cujos sangues são detectadas quaisquer anomalias que possam trazer de volta todas as doenças e males. Bem, pelo menos, assim nos foi ensinado, assim nos foi repetido até que acreditássemos.

Se não tivesse acontecido tão perto de nós, nunca descobriríamos que a Aliança estava mentindo.

Artie está tremendo tanto que tomo sua frente e coloco meu olho no visor para a identificação de minha retina. A luz vermelha do painel fica verde em segundos e a porta é destravada. Somos da hoste, portanto nossa entrada é permitida.

Sinto que ela hesita e, por esse motivo, resolvo tomar a dianteira, a partir dali.

Se fosse comigo, também estaria abalado, portanto não recrimino minha parceira de ronda. Antes, eu a entendo, pois a conheço muito bem, desde a primeira infância para ser mais exato. Sei o quão difícil está sendo para ela deixar que suas fraquezas venham à tona. Logo, não havia possibilidades de deixá-la vir sozinha.

Embora discorde do Stan, sobre estar me arriscando por Artie, tenho plena consciência de que com o mesmo passo que entrarei no Limbo, deixarei o sistema.

Não pretendemos sair sozinhos e, quando o fizermos, nossa única certeza será a de que descumpriremos as regras tão exaustivamente anunciadas.

Instauraremos o caos, ao contestarmos o que nos disseram e, principalmente, ao nos recursarmos a seguir o código.

Lic Nunes

LicNunes

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