Prólogo

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Era mais um dia cinza na cidade de Nova Iorque, as pessoas já andavam na rua ostentando seus belos casacos e com seus copos de cafés sempre em mãos.

Era também mais um dia cinza dentro de mim. Havia passado mal pela milésima vez e pela milésima vez tinha deixado quieto. Tinha muitas coisas pra fazer, um filho pra cuidar, uma casa pra limpar e muito trabalho. Mas você, como sempre me salvando, chegou do serviço com a sua típica cara de cansado com aquele sorriso de canto que me ganhava tão fácil.

— Deixa que eu cuido da casa e do Adam, vai descansar amor.

— Eu não sei o que seria de mim sem você.

— E eu sem você.

Trocamos um beijo rápido, subi para nosso quarto e tomei um longo banho relaxante, mas ao sair do banheiro, me senti tonta e quase desmaiei, por sorte nós tínhamos uma poltrona bem ao lado da porta e eu, praticamente, me joguei nela. Venho vomitado já a alguns dias, me sinto tonta às vezes e sinto coceira em várias partes do corpo, me sinto enjoada quase o dia todo e tenho perdido o apetite. Venho me sentido mais fraca a cada dia que passa.

— Amor, está tudo bem? – Charlie agachou a minha frente, extremamente preocupado.

— Não estou me sentindo bem, me ajude a deitar.

— Não, vamos ao médico!

— Amor, não precisa, vem, deita comigo um pouquinho? Se eu não estiver bem amanhã, prometo que vou!

— Vou ligar pra Emily o dia todo pra saber!

Emily também conhecida como minha melhor amiga, madrinha do Adam e minha assistente.

Pegou-me no colo, me colocando delicadamente sobre a cama, pulando por cima de mim e deitando do outro lado, sem tirar seus olhos dos meus.

— Sabe, nunca imaginei que eu fosse viver um amor assim...

— Porque não?

— Era decepção atras de decepção, meus pais que eram sinônimos de amor verdadeiro para mim, se separando... todas essas coisas me faziam desacreditar mais no amor!

— Mas cá estamos nós, contrariando o mundo.

— Eu amo tanto você!

— Não mais do que eu, pode ter certeza!

Quando fui responder, uma voz infantil me interrompeu e me fez sorrir abertamente.

— Mamãe?

— Oi meu amor, vem cá.

Adam deitou ao nosso meio e sem perceber, adormecemos abraçados e unidos.

(...)

— E então, o que está sentindo?

— Bom, já faz duas ou três semanas que eu ando bastante enjoada, vomitando, com coceira e uma dor terrível no abdômen que vai até as minhas costas. Nenhum dos remédios que tomo faz essa dor amenizar, só dormindo pra esquecê-la.

— Como é está a dor?

— Como de fosse uma cólica, mas muito mais forte e às vezes com umas pontadas que parecem que estão me esfaqueando.

Já fazia duas horas que esperava pelo resultado dos vários exames que fiz, estava apreensiva, o médico sabia não estar tratando de algo simples.

— Angeline Boullervard? – ergui a mão – O Doutor está a sua espera.

Agradeci rapidamente e fui para a sala dele. Examinava os papéis a sua frente com o cenho franzido e podia botar uma leve preocupação. Coisa boa não podia ser.

— Bom, Angeline, não lhe trago boas notícias – SABIA! – e, infelizmente, tenho que lhe contar que o motivo de todos esses sintomas é o seu câncer no pâncreas, ele passou pra fase 4.

— O que?

(...)

Tinha preparado um jantar especial com a comida preferida Charlie e Adam: lasanha de quatro queijos. Chorei saindo do hospital, chorei sozinha em casa, chorei cozinhando e agora chorava no banho.

Câncer no pâncreas na fase 4 nada mais é que o câncer na fase terminal.

Eu já sabia sobre ele, descobri a cerca de um ano, mas guardei como um segredo, tentei fazer tratamento, mas meu corpo não reagia, então deixei que o tempo se encarregasse de mim e aproveitava cada segundo como sendo meu último, porque poderia ser, de fato. Ele já tinha se alastrado por todo o meu corpo e havia chego ao cérebro, algo raro de se acontecer, mas que diminuíam ainda mais minhas chances – já nulas – de sobreviver. Nas palavras do doutor, eu só tinha mais duas semanas. Quatorze dias. Trezentos e trinta e seis horas de vida. Mas se o destino quisesse ser um pouco mais gentil comigo, eu ainda teria 1 mês.

— Nossa, data especial hoje e não estou lembrando? – Charlie perguntou assim que terminei de por a mesa do jantar.

— Claro que não, só quis fazer a comida preferida de vocês.

Adam fazia gracinhas no meio do jantar com bigode de queijo, enquanto Charlie fazia o mesmo só que com bigode de molho, eu apenas ria, tentando gravar aquela cena em minha mente. Eu não veria meu filho crescer. Não o veria indo para o ensino médio. Nem conheceria sua primeira namorada. Não o veria ir para uma faculdade, se ele quisesse entrar para um. Não o veria sorrir feito anjo sempre que aprontava algo e queria se safar de uma bronca. Não o veria em um altar, esperando sua noiva, com Charlie emocionado ao lado. Não veria Charlie envelhecer. Nem com os cabelos completamente grisalhos. Não o veria com nossos netos ao redor. Eu não veria mais eles viverem e isso era o que mais doia: não estar com eles.

— Hey, você está tão quieta hoje... Como foi no médico?

— Precisamos conversar, amor.

O puxei até a cama, sentando no meio e esperando que ele fizesse o mesmo. Adam já dormia em seu quarto e nós estávamos sozinhos no nosso.

— Eu tenho câncer.

— O que?

— Câncer no pâncreas, fase 4.

— O que é a fase 4? – Charlie perguntou com as lágrimas já escorrendo em seu rosto me fazendo chorar junto.

— É... a...

— O que é, Angeline? Diga!

— É a fase final.

— Como assim?

— Eu só tenho mais duas semanas, 1 mês no máximo. Eu sinto muito.

— MAS E O TRATAMENTO? COMO ASSIM CÂNCER ANGELINE? VOCÊ SÓ PASSOU MAL ONTEM!

— Por favor, não grita, o Adam... Eu já sabia sobre... Faz 1 ano que descobri, o tratamento não surtiu efeito algum e agora ele toma conta de todo o meu corpo...

Charlie bateu a porta do quarto e em seguida bateu a porta da frente de casa.

Quando ele voltou, já era de madrugada, eu ainda chorava agarrada a um travesseiro, mesmo chateada, o esperava preocupada. Charlie cheirava a álcool barato, mas quando me puxou para junto de si e nos colocou de conchinha, eu me senti em casa.

— Eu não quero deixar você ir.

Deixe-me ir  [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora