14 - Reencontro (REVISADO)

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—Alê? – bati à porta e esperei, logo ouvi a chave rodando e um Alexandre com os olhos vermelhos, e o rosto inchado apareceu na minha frente.
Eu abracei ele e abraçados deitamos na cama.
—Desculpa… – falei fazendo cafuné naquela coisa fofa de olhos vermelhos – Eu não queria ter falado aquilo,  mas tinha que ser realista…
—Eu sei meu Leãozinho. – disse fungando – Eu entendo, mas eu sempre quis ter um filho, sabe…
—Você ainda vai ter meu amor.
—Não, eu sei que não…
Nesse momento ouvimos o choro do quarto ao lado, e o Alexandre levantou num pulo.
—Isso, vai lá e já vai se acostumando – disse encostando minha cabeça mais confortavelmente no travesseiro – Semana que vem, quando tivermos a guarda dele definitiva, você que vai levantar!
Alexandre me olhou assustado e saiu correndo, retornou minutos depois com o Pedro, que coçava os olhinhos.
—Me explica isso direito!
Depois de explicar a ele toda a conversa que tive com o Valdomiro, ele ficou num silêncio extremo, que só se quebrou com a risada do Pedro que estava olhando diretamente nos meus olhos e dava risada.
—Isso parece ser bom demais pra ser verdade!
—Pois acredite, vem Pedrinho – disse pegando meu futuro filho no colo – Vamos ver algo pra você comer, aposto que está com fome, meu amorzinho.
Fomos pra cozinha e fiz leite pra ele, na verdade eu nunca fui bom com crianças, o Pedro é o único que parecia confortável no meu colo, os meus priminhos sempre choravam quando eu carregava.
A semana passou rápido, um dia depois fomos a delegacia e mesmo mostrando interesse em ficar com a criança o Pedro foi levado de nós, no mesmo dia eu e o Alexandre conseguimos assinar o contrato de união estável, acho que hoje em dia ninguém mais pensa em se casar, o cartório estava vazio. Apesar de não ter sido o casamento que esperávamos, foi ótimo, é maravilhoso e gratificante estar casado com alguém como o Alexandre, juramos a nós mesmos fazer uma festa depois.
Como o Valdomiro tinha prometido a gente, em uma semana o Pedro moraria conosco, e ainda teríamos uma visita da assistente social, eu já esperava com isso. Alexandre estava radiante, mas continuava preocupado com seus pais que não davam noticia a três dias e a vinda deles estavam demorando muito.
Quando consegui um tempo pra pensar, reparei nas mudanças drásticas que estavam acontecendo na minha vida, coisas significativas e que mudaram a minha história. Recapitulando, eu estava casado com um portador do vírus HIV, estava a três dias de ser pai, e não estava falando com o homem que sempre admirei e amei acima de tudo… Vocês tem ideia de como estava a minha mente?
Mas tudo na vida acontece com um propósito, não importa se bom ou ruim, se triste ou alegre, nada na vida é em vão. Foi com esse pensamento que fui na casa dos meus pais. Cara, eu amava o meu pai, amava o Allan, apesar dos pesares, são pessoas essenciais na minha vida.
Estava no meu quarto deitado, quando a porta se abriu e um rosto cansado e triste apareceu por ela
—Oi… – disse cauteloso – A gente pode conversar?
—Depende. – disse me sentando na cama – Se o senhor for agir feito um babaca preconceituoso, não!
Ele caminhou e se sentou do meu lado, e lentamente foi deitando e colocando a cabeça no meu colo, por um momento toda a mágoa se esvaiu e eu me recordei de todas as vezes que ele fez a mesma coisa comigo.
—Perdão, eu não tinha o direito de te julgar daquele jeito e muito menos de te agredir, eu me arrependo tanto! – disse e eu apenas deixei que ele falasse e fazia carinho na sua cabeça raspada – Você tem que entender, é difícil pra um pai saber que seu filho está com uma pessoa com HIV… DROGA! – exclamou se sentando – Eu não quero passar pelo que os pais desse cara passaram, Math!
—Eu sei pai, mas eu o amo, e tomamos todos os cuidados, e tem mais uma coisa…
—O que? – disse me olhando apreensivo.
—Uma não, duas… Bom, primeiro nós nos casamos, segundo o senhor vai ser avô!
—O QUÊÊÊ?????? – ele se levantou e começou a andar de um lado pro outro – meu filho, meu filhinho casou… Tudo bem que você estava com raiva, mas não nos convidar pro seu casamento? QUAL O SEU PROBLEMA? – gritou novamente e me deu um tapa na cabeça – E ESSA HISTORIA DE EU SER AVÔ? EU NO AUGE DOS MEUS 40 ANOS! ESTOU NOVO PRA SER AVÔ!
Eu apenas me deitei e comecei a rir.
—QUEM VOCÊ PENSA QUE É PRA CASAR? NÃO LEMBRO DO ALEXANDRE TER VINDO ME PEDIR A SUA MÃO!
—Vem aqui, seu ciumento! – resmungando ele se jogou em cima de mim, e expliquei toda a história da adoção pra ele.
—Eu te amo muito, Math! – disse se levantando – Nunca esqueça disso, agora tenho que correr pro bar!
—TAMBÉM TE AMO! – berrei quando ouvi ele descer as escadas.
—EU SEI, E ACHO BOM MESMO!
Finalmente minha vida estava entrando nos trilhos, e acima de tudo, eu estava MUITO FELIZ!
Meu celular começou a tocar me tirando dos meus devaneios
—Alô? Gostaria de falar com o Math? – disse uma voz feminina do outro lado.
—Eu mesma, querida!
—Bom senhor, seu número é o contato de emergência do senhor Alexandre e ele acabou de dar entrada no hospital.
Ela soltou a bomba toda de uma vez, me fazendo perde os sentidos e quase desmaiar.
Apenas sai correndo pro hospital, nessas horas a gente deseja ter aprendido a dirigir, peguei o ônibus e a sorte é que o hospital não era tão longe, fica aí uma das vantagens de se morar numa área nobre da cidade.
Depois de fazer uma baixaria na recepção depois que a atendente deu um risinho porque eu disse ser o marido do Alexandre, o médico apareceu e me pediu para o acompanhar até sua sala.
—RIDÍCULA DO CACETE!! – gritei pra atendente e as pessoas que estavam na recepção me olhavam horrorizadas – Sua sorte é que aqui é um hospital, você ia ficar careca!
Entramos na sala e eu estava espumando de raiva
—Se acalme, senhor – disse o médico sorrindo sentado na minha frente – Bom, o senhor sabe que o paciente tem HIV, não? Pois bem… – prosseguiu depois de um aceno de cabeça meu – Os medicamentos quase não estão mais fazendo efeito, o Alexandre vai precisar se cuidar muito mais agora. E o senhor, está tomando os medicamentos?
—Eu? – perguntei confuso – Medicamento de quê?
—O coquetel?
—Eu não tenho HIV criatura! – disse bufando.
—Ah… Desculpe, bom, oque aconteceu com o Alexandre foi que como os remédios estão fazendo pouco efeito, ele adquiriu uma bactéria no intestino, mas que já foi tratada, creio que queira ver o seu marido?
—Obviamente! – disse forçando um sorriso.
Segui por um corredor de paredes azuis e portas brancas, essa foi a primeira das muitas vezes que eu passaria por esse corredor, o número do quarto seria a única coisa a mudar.
Abri a porta do quarto 135 e lá estava ele, sentado na cama com o celular no ouvido e quando me viu abriu um sorriso imenso, corremos um pro outro e em silêncio ficamos abraçados pelo que me pareceu bastante tempo.
—Leãozinho, meus pais chegaram! – disse ainda me abraçando.
—COMO ASSIM? – gritei empurrando ele e me sentando na cama.
—Eles queriam fazer uma surpresa, e na verdade foi eu quem fiz, eles estão a caminho.
—Hum, mas e você? Tá melhor? Fiquei louco da vida. – disse me deitando e colocando a cabeça no seu peito – E quando chego ainda tenho que aturar aquele recepcionista ridícula, antes de sair daqui ainda dou uns tapas nela!
—Vai fazer nada disso seu maluco! – rindo ele beijou meus cabelos – amo o cheiro dos seus cabelos…
—E eu amo você!
—Essa é a primeira vez que você me diz isso.
—Achei que soubesse! – falei rindo.
—Eu também te amo, agora canta pra mim, até esse maldito médico vim com minha alta.
—Vou cantar uma musica que não saiu da minha mente, desde a hora que acordei:

“Me abraça, me beija, me arranha, me chama de seu preto
Te pego, te agarro e te mostro porque eu sou do gueto
Carinho, respeito, meu dengo, amor eu quero dar
E o mundo inteiro já sabe, eu nasci pra te amar…”

—HAHAHAHA! "Daquele Jeito" ? – perguntou rindo – não sabia que você ouvia pagode.
—Meu amor, eu ouço tudo, inclusive estou viciado no CD da Marília Mendonça, queria estar morta.
Fomos interrompidos com a porta se abrindo com a entrada do médico e de um casal que olhava pro Alexandre com um sorriso imenso no rosto e o próprio retribuía com a mesma intensidade.
—PAI, MÃE!!! – gritou se levantando com os olhos cheios de lágrimas e abraçando meus sogros.

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