Parte 10

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Eu quis odiar André por me fazer caminhar quatro quilômetros por dia não só no sábado como também no domingo e na segunda-feira antes da aula, mas eu precisava admitir que o plano dele estava fazendo um certo efeito. Das duas, uma: ou a endorfina realmente tinha entrado em ação, ou eu estava cansada demais para afundar meu cérebro em ciclos perturbadores de pensamentos. Mas o fato é que eu me sentia menos deprimida. Então, de certa forma, estava funcionando.

Depois da caminhada, na segunda-feira, tomei um banho antes de ir para a aula.

Eu me sentia revigorada e, por mais que eu tenha enviado uma mensagem para o André dizendo "Você é a pior pessoa do mundo", eu precisei enviar outra logo em seguida dizendo, "Obrigada". Porque talvez eu pudesse, eventualmente, escalar para fora daquele buraco sozinha... mas era muito mais fácil fazer aquilo com ajuda.

"Quando a sua depressão for embora, nós dois vamos estar super saradões," André me respondeu. Ele não era um fã excepcional de esportes—aliás, ele era a definição do dicionário de sedentarismo—mas o esforço que estava fazendo por mim tinha também seus benefícios para ele. Deus abençoe a endorfina.

Entrei na sala de aula não me sentindo péssima pela primeira vez em meses. Caminhei lentamente até meu lugar típico no fundo da sala, mas algo dizia que eu sobreviveria até o final do dia. André tinha combinado de fazer uma tarde de filmes comigo e com o namorado dele, e ele nos entupiria de minhocas de goma até a gente vomitar. Parecia promissor. Eu só precisaria aguentar algumas horinhas de escola e receberia o merecido prêmio.

— Ei! Está se sentindo melhor? — Demorei um tempo para notar que estavam falando comigo, mas por fim virei o rosto e pisquei. João Victor estava na carteira à minha frente, apoiando os braços no encosto da cadeira de forma displicente. — Seu amigo disse que você passou mal.

Me permiti olhar para o meu colega, analisando-o demoradamente. Então, sem precisar forçar, sorri.

Ele era bonitinho. Talvez, algum dia... Quando eu não estivesse mais afundando...

— Estou melhor. Obrigada.

— Seu cabelo fica muito bonito assim — ele comentou, apontando para a trança que eu havia feito depois do banho, com os cabelos ainda molhados, para evitar que eles secassem de forma muito rebelde.

Brinquei com o finzinho da trança, sorrindo de lado. Eu teria ficado vermelha, mas o elogio era mais engraçado do que fofo. Minha trança não estava nem tão bem-feita assim. Ele só estava procurando uma desculpa para me elogiar.

— Obrigada, João — disse sinceramente.

— De nada. Você vai na próxima festa da Gabi? — ele mordeu o lábio inferior e ergueu as sobrancelhas.

Foi um ego boost imediato. Ele estava flertando comigo e não estava nem mesmo tentando disfarçar. Eu ri sozinha, me divertindo só de me imaginar contando tudo para André mais tarde. Ele iria adorar aquilo!

Era impressionante o quanto eu estava me sentindo melhor, como se eu tivesse caminhado quilômetros desde aquela cena no topo do prédio na sexta.

— Não sei — disse casualmente. — Quando vai ser?

— Só Deus sabe. Mas provavelmente não vai demorar. Você conhece a Gabi. Ela não consegue ficar muito tempo parada. — João riu e mordeu o lábio de novo. — Te vejo lá?

— Talvez — não quis me comprometer.

A resposta foi boa o suficiente para o garoto, que em seguida me deixou em paz, virando para falar comigo só algumas vezes durante a aula.

Eu não acreditava realmente que aquele iria virar um caso de amor, e nem estava pronta para me jogar de cabeça e me apaixonar... Mas apenas a possibilidade de existir alguma coisa entre nós dois era impressionante: significava que nem tudo estava perdido. Eu poderia criar algumas raízes.

Mais dois passos e adeus [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora