Parte 11

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André havia marcado uma consulta para mim na quinta-feira com um médico que era amigo de seu orientador de faculdade. O garoto conversou com meu pai, insistindo para ele ir junto. Meu pobre pai, apesar de não entender realmente sobre o que aquilo se tratava, ficou preocupado. Então pegou uma folga no trabalho para me acompanhar.

Eu estava nervosa. Nunca tinha dito em voz alta todos os meus sintomas. Para André eu tinha dito alguns sentimentos, mas coisas realmente subjetivas, nada muito técnico. Depressão é uma doença catalogada, clínica. Não é simplesmente chegar no médico e dizer "Oi, doutor, eu me sinto um pouco triste", e você ganha um diagnóstico automático. Não.

Então meu maior medo era que tudo aquilo estivesse apenas na minha cabeça. Talvez eu estivesse exagerando, talvez eu estivesse confundindo as coisas. Só porque me sentia mal, não necessariamente eu tinha depressão. Apesar de eu ter debochado de André quando ele sugeriu a hipótese, naquele momento, sentada em um dos bancos da sala de espera, eu nunca tinha duvidado tanto de mim mesma antes.

E, para piorar, eu me sentia infinitamente melhor. Não estava péssima como uma semana antes. Não estava me sentindo particularmente suicida. Alguns pensamentos ainda me assombravam de vez em quando, mas André estava fazendo sua parte em me distrair.

Então, mais do que tudo, eu tinha um pavor terrível de que o médico fosse me acusar de ser uma farsa. Como se os poucos dias de leve felicidade anulassem todo o resto do sofrimento.

Não sei se preciso realmente dizer, mas meus temores foram completamente infundados: assim que o doutor me perguntou o que eu estava fazendo ali, comecei chorar como uma criancinha. Aos soluços, tentei lhe explicar mais ou menos o que estava sentindo.

Eu estava sozinha no consultório com ele, a pedidos do próprio médico, que disse que preferia conversar em particular comigo antes para que eu me sentisse mais confortável.

Ele me ouviu com uma paciência inacreditável, esperando que eu retomasse o fôlego em alguns momentos e fazendo perguntas encorajadoras quando eu parecia perder minha linha de raciocínio.

Ele me fez todas as perguntas técnicas: como estava meu sono? E a alimentação? Eu estava conseguindo me concentrar nas aulas? Havia perdido ou ganhado muito peso recentemente? Tinha pensamentos suicidas?

Eu respondi como pude. Meu sono estava péssimo: alternava entre momentos de insônia pura e prolongados intervalos de nem conseguir levantar da cama. Minha alimentação não tinha tido uma alteração muito visível, mas eu andava sem apetite. Concentração na aula = zero. Eu havia  perdido alguns quilos nos últimos meses, mas nada que eu considerasse relevante. Pensamentos suicidas... o tempo todo. Mesmo quando eu estava bem.

Para mim, minhas respostas não faziam tanto sentido. Eu ainda estava com medo de o médico começar a rir da minha cara e me mandar parar de brincar com doença séria. Mas o que ele fez foi o completo oposto.

Ele me contou sobre a depressão, sobre como ela afeta cada área das nossas vidas. Ele me disse o mesmo que André tinha dito alguns dias antes, sobre como era uma combinação de elementos químicos e psicológicos. Reforçou no final que ele me prescreveria anti-depressivos, que deveriam começar a ser efetivos em torno de quatro semanas com pouco ou nenhum efeito colateral, e que me recomendava fortemente que começasse a fazer terapia. Ele anotou numa página de caderno números de especialistas renomados, conhecidos seus, e me pediu para ligar para algum deles o quanto antes e experimentar até que eu encontrasse um terapeuta que se encaixasse comigo.

Por fim, ele pediu para que eu chamasse meu pai, porque ele queria conversar com ele.

Eu assenti, deixando a porta aberta. Meu pai entrou, parecendo ainda confuso, enquanto eu tomava seu antigo lugar, ao lado de André.

Mais dois passos e adeus [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora