Parte I - Capítulo II

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O príncipe se despediu de Pandora com seu mais luminoso sorriso, deixando-a com o sangue ardendo. A memória daquele amor invadiu o coração do rapaz apaixonado e foi difícil fingir atenção às broncas de Max quando chegou à estrebaria.

Maximiliano Martino era irmão mais moço do falecido pai de Lúcio e, enquanto este se alistava na marinha, Max entrava para o exército, onde rapidamente ganhou boa reputação. Após o exílio de César, Max fora indicado em seu lugar como tutor do sobrinho; uma das várias concessões que o rei tivera que negociar no tratado de paz com o conde. Max tinha a compleição firme e dura de um veterano de guerra, com um rosto anguloso de sorriso fácil. Sua espada era tão rápida e ferina quanto a língua.

A aporrinhação do tio passava voando pela cabeça do príncipe. Era somente em Pandora que conseguia pensar. Seus lábios, seus olhos, seu cheiro, sua pele.

‒ Alteza. ‒ Diana apareceu no curral, com um sorriso cheio de dentes.

A prima vinha com Dex, que já chegou abanando o rabo para o dono. Lúcio o abraçou e o afagou atrás das orelhas compridas, onde tanto adorava. Diana Martino era prima do príncipe e Pandora tinha certa razão ao sentir ciúme. Podia ser não a mais bela, mas tinha curvas sedutoras. As calças e o corselete de couro curtido se aderiam ao corpo torneado sem deixar muito à imaginação. Os cabelos dourados estavam trançados de modo a não atrapalhar a visão em combate.

‒ Muito bom dia, Diana ‒ respondeu Lúcio, igualmente radiante.

‒ Que bom encontrá-lo assim tão animado. Para onde vão?

Lúcio contou sobre a cavalgada com o pai dela e o amigo. Diana se entusiasmou, e até esqueceu que havia combinado de treinar com Marco. Seu pai foi logo jogando um balde d'água fria, falando que daquela vez iriam apenas os rapazes. Não havia nada que a deixasse mais indignada que ser excluída por ser menina, e ela protestou com fogo nas ventas. Max sorriu e coçou a bochecha, sem dar a mínima.

‒ Calma, Diana ‒ disse Lúcio. ‒ Assim que voltar a gente conversa melhor.

‒ Se Sua Alteza promete... ‒ respondeu ela, toda se querendo.

‒ Eu prometo ‒ garantiu o príncipe sorridente.

Diana saiu do curral enlevada como uma menina apaixonada. A simpatia do príncipe a encantava e ela se pegou sonhando acordada. Os dois no baile, dançando feito namorados e, depois, se amando em sua cama. Diana sorria e quase perdeu o caminho até o campo de treino da guarnição.

‒ E agora, onde está Marco? ‒ perguntou Max, quando ela se foi.

‒ Marco disse que vai ficar para treinar com Diana ‒ comentou seu amigo Justiniano.

Era um rapaz bem-feito, de rosto redondo e franco, e o sorriso emoldurado por uma barba rala e ruiva.

Max deu de ombros e os três montaram nas selas. O portão do castelo foi aberto e, tão logo o atravessaram a galope, foi fechado com o estrondo de um tronco desabando. A fortaleza erguia-se sobre o mais alto morro da capital, cercada por grossas muralhas cinzentas e altas torres.

Um atacante em sítio precisaria escalar cerca de vinte metros de um paredão de rocha escarpado antes de se arriscar contra os muros; isso tudo sob o assédio de flechas, óleo fervente e pedras.

Sobre os mastros das torres, flâmulas negras com a águia dourada estendida da família Dante tremulavam com o vento suave. O clima estava bastante agradável, sem uma nuvem sequer no céu de um azul profundo. Sem dúvida, um dia perfeito para uma cavalgada no Bosque Real.

Passagem para a Escuridão - Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora