Capítulo 1 - Aura

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– Desça logo menina – mandou minha tia em um berro do primeiro andar.

– Já vou – gritei apanhando minhas coisas.

Por algum motivo desde quando eu acordei, sinto minha nuca ardendo.

– Achei que ia demorar mais! – exclamou minha tia impaciente, assim que me viu descendo a escada estreita.

– Acordei atrasada. – disse vendo sua cara de reprovação.

– Se não ficasse o tempo todo com a cara naquele maldito livro...– ela falou com desdém. – Esse negócio de estudar não serve pra nada.

– Claro que serve! – falei já sabendo que aquilo acabaria em nada.

Minha tia Eleonora é tão teimosa, mas não posso dizer nada, a convivência é o ofício, minha tia é a única coisa que eu tenho de família, pelo menos até onde eu sei. Você deve está se perguntando e os seus pais? É um pouco complicado, minha mãe está internada em um sanatório desde dos meus cinco anos, e meu pai...não faço questão de ouvir falar, não sei como ele é, apenas sei seu nome.

Hoje vai ser mais um dia típico na minha pacata vida, vou pra escola agora e depois vou para loja do senhor Geovani ajudá-lo com suas quinquilharias. Eleonora pra variar, vai falando suas ladainhas até o ponto de ônibus, a mesma só para quando seu ônibus chega.

Meu ônibus não demora para chegar, no trajeto para escola vou pensando em tudo que eu tenho na vida, praticamente não tenho nada. E a sua tia? Como ela diz eu sou um estrume que ela é obrigada a carregar, mesmo assim ela já deixou bem claro quando eu fizer meus vinte um, a rua vai ser a serventia. Ainda faltam quatro anos para Eleonora cumprir com sua palavra, mesmo assim já venho guardando uns trocados.

[...]

– Querida poderia apanhar aquela caixa nos fundos?! – o senhor Geovani pediu.

– Sim – falo deixando o jarro de prata que polia na bancada.

Sigo até os fundo da loja, eu já sabia que caixa o senhor Geovani estava se referindo, o mesmo passou o dia todo ajeitando o que ele iria expor na vitrine.

Minha nuca ao cair da noite passou a arder mais, passei o dia todo com essa queimação e por nada passava.

Sem demora vejo um caixa cheia de coisas perto de uma mesa antiga, abaixo para pegar as peças antigas, eram peças diferentes, pareciam coisas de piratas, mas só o senhor Geovani para achar que alguém que acredita e gosta desse tipo de coisa.

Enquanto volto para parte da frente da loja, sinto minha nunca arder como nunca havia ardido, sem querer deixo a caixa cair no chão fazendo um enorme barulho.

– Ah! – grito colocando minha mão na nuca com a intenção de que aquilo parasse.

– O que houve minha filha? – o senhor Geovani pergunta assustando com o barulho.

– Minha nuca arde muito! – choramingo não aguentando de dor.

Senhor Geovani vem até onde estou sentada, e tira meu cabelo da frente e olha minha nuca.

– Minha santa pirataria – ele exclama. – Melhor você ir para casa, já está tarde.

– Senhor Geovani o que tem na minha nuca? – perguntei apavorada.

– Não é nada menina, vamos – ele me ajudou a levantar. – Vá direto para casa, e não pare por nada.

– Senhor Geovani está me assustando – confesso segurando minha mochila que o mesmo havia acabado de me entregar.

– Não é nada, criança, apenas me lembrei que Olga não gosta que eu fique até tarde na loja – ele falou ainda me empurrando para fora da loja.

– Quem é Olga? – questionei já do lado de fora.

– Minha esposa, até em breve Aura – Senhor Geovani se despediu fechando a porta na minha cara.

Que estanho, ele ainda teve a audácia de vira a placa de fechado e me dar um tchauzinho, o que o senhor Geovani viu na minha nuca pra ficar tão estranho? E quem é Olga?

Coloco minha mochila nas costas e sigo andando, a ardência ainda continua, parece que minha pele está pegando fogo de dentro pra fora. Passo minha mão na nuca e sinto um relevo estranho e a região quente.

Por um momento de delírio, ou falta de sanidade querendo que essa ardência parasse caminho sem rumo pela avenida movimentada, apenas vejo um farol forte vindo na minha direção e ouço buzinas.

Um clarão e o fim da ardência...
Ouço gaivotas ao meu redor, parece que minha pele queima por debaixo da roupa molhada, abro os olhos e vejo um bando de homens estranhos ao meu redor olhando fixamente pra mim.

– La niña se despertó!– um dos homens exclamou.

A Herdeira dos MaresOnde histórias criam vida. Descubra agora