Prólogo

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Era uma vez

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Era uma vez...

         Não, essa história não começa assim. Não há princesa em perigo e não há um príncipe em seu cavalo branco para salvá-la. Há eu. Uma garota perdida que não sabia o que era. Passei incontáveis noites da minha existência duvidando de mim mesma.
          "Sou um demônio? "
          A verdade é que todos nós temos um demônio interior. Alguns dias você controla o demônio. E em outros dias, ele controla você.
          Não se preocupe comigo. No momento, estou em paz. Descobri quem eu sou e não me sinto mais perdida. Me sinto leve, como se tivesse encontrado um sentido - mesmo que louco - nisso tudo. E mesmo que não tenha encontrado uma causa racional  para estar aqui, eu encontrei uma razão para continuar. Encontrei pessoas que eu não seria capaz de viver sem. Meu coração está em paz agora graças à elas.
          Obrigada.
          Me desculpe, essa não é a melhor maneira de iniciar uma apresentação. Vou pular essa parte. Vou direto para o começo. Onde tudo começou.

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•Mikaela Carter•__________________________

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Mikaela Carter
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          Minha mão desliza pelo chão frio e consigo sentir um pouco de neve em minhas mãos

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          Minha mão desliza pelo chão frio e consigo sentir um pouco de neve em minhas mãos. Abro meus olhos e observo o céu límpido. Inspiro o ar frio e aromático, sentindo meu corpo ficar leve. De súbito, sou invadida pelo desespero e forço-me a sentar. Onde estou? Talvez eu tenha batido a cabeça em algum lugar para não me lembrar de nada. Meu corpo é revestido por um tecido branco aveludado. Um lindo vestido branco. É familiar. A única coisa que eu conheço desse lugar totalmente misterioso para mim. Volto minha atenção para o solo. Há muita neve aqui. Está derretendo. Isso só pode significar uma coisa: A primavera está começando.
          Meus olhos curiosos observam tudo ao redor, tentando encontrar uma resposta lógica para minha pergunta. O sol está nascendo. Estou cercada por diversas árvores. Sim, definitivamente estou em uma floresta. Agora: como eu vim parar aqui? Sons de cavalgadas libertam-me de meus pensamentos. Sigo o som e vejo um cavalo se aproximando. Talvez seu dono possa me ajudar. O cavalo me vê e, em vez de parar, ele acelera a velocidade. Fico paralisada, sentindo o medo de ser pisoteada cravar em minhas veias. Cerro meus olhos para não ver o inevitável acontecer. Repentinamente ele para, diante de mim. Começo a analisá-lo. Seria um cavalo normal se não houvesse um chifre no topo de sua cabeça. Minha expressão muda de medo para curiosidade. Estendo minha mão querendo tocar a criatura branca de pé, bem na minha frente, como se ele fosse um pirulito e eu uma criancinha. O desejo natural do ser humano pelo desconhecido me domina. O unicórnio se aproxima de mim. Poucos centímetros separam minha mão daquela criatura fascinante. Tenho que toca-lo. Preciso saber se é mesmo real.
          Sons de tiros reverberam no ar. Assim como eu, o unicórnio se assusta. Recuo rapidamente. Ele foge, se escondendo entre as árvores. Fico sozinha novamente.
      — Corre! - alguém segura meu braço bruscamente, e me levanta do chão frio - e, ao mesmo tempo, reconfortante. A enorme saia se embola em meus pés e me desequilíbrio, quase caindo no chão.
          Uma mulher de cabelos castanhos atira em direção ao céu com sua calibre. Não consigo fazer nada além de seguir o que ela falou e ficar repetindo aquela palavra em minha cabeça. Corre.
          Corro o mais rápido que posso - o que meu vestido me permite - sem nenhum destino aparente. Suo frio por não saber aonde estou indo e, mesmo assim, continuo a correr sentindo o medo de ser pega controlar meus sentidos. A razão é uma palavra que desconheço agora.
Meus pés cansados, minha respiração ofegante e o medo gritam para que eu pare de correr. Apoio meu braço em um pinheiro para recuperar o fôlego. Pareço uma princesa perdida correndo do perigo iminente. Abro um sorriso em escárnio. Que irônico.
          Então, ouço passos se aproximando de mim. Não estou sozinha. Não deveria ter corrido tanto. Me sinto vulnerável e deslocada em meio aos enormes pinheiros. Tento me afastar da floresta sombria, dando passos largos para trás. A silhueta de uma mulher aparece na escuridão e forço minha visão para analisar melhor quem está diante de mim.
          — Está perdida, querida? - uma mulher de cabelos ruivos diz, com uma voz sedutora. Algo dentro de mim grita para que eu não me aproxime dela. Seguro o ímpeto de fugir.
          — S-sim. - pigarreio. Dou um passo para trás.
          — Venha comigo. - ela estende a mão, abrindo um sorriso macabro.
          Dou outro passo para trás.
Isso parece um convite para morte.
          — Não! - alguém grita atrás de mim.
Olho por sobre o ombro, tentando permanecer o mais imóvel possível. Uma garota posiciona seu arco e flechas na direção da mulher à minha frente.
          — Faz um longo tempo desde a última vez que nos vimos, Verônica. - a garota do arco e flechas diz, sarcástica, lançando a flecha em direção à cabeça de Verônica.
Prendo a respiração e me forço a olhar para ela. Verônica fecha seus olhos e quando os abre, estão totalmente negros e sombrios. Mais sombrios que a escuridão da floresta. Ela segura a flecha, que ia atingir sua cabeça, em uma velocidade surreal e demoro um pouco para processar a informação. Ela parte a flecha ao meio, como se fosse um simples graveto. Então, entra na floresta, dando passos largos, acompanhados por uma risada macabra que se perdem no ar conforme sua silhueta desaparece na escuridão.
          — Seus pais não te ensinaram a não falar com estranhos? - a estranha do arco e flechas pergunta.
Parece estar acostumada a fazer coisas assim. E parece gostar. O sorriso não lhe escapara dos lábios desde que segurou seu arco e flechas. A adrenalina percorre suas veias e a energia que transmite é contagiante. Mas parece estar incomodada com alguma coisa. Ela me observa dos pés à cabeça. Seu sorriso se contorce e se desfaz. Está incomodada comigo, percebo. Me sinto uma pedra em seu sapato. Um incômodo.
— Temos que sair daqui o quanto antes. - ela prende o arco em volta de si, posicionando-o diagonalmente pelo seu corpo. - Estamos no território deles. - a arqueira conclui, séria. Ela não se dá ao trabalho de se apresentar, dando meia volta para sair dali.
Ao girar seus calcanhares, suas madeixas dançam no ar, revelando parte de sua orelha. Uma orelha anormal. Uma orelha pontuda.
— Uau. - balbucio, encantada. Seguro o ímpeto de toca-la. Se ela me ouve, ignora. Parece não se importar com minha surpresa - parece não se importar comigo no geral. Ela se parece com um daqueles elfos que saiu de um filme para crianças, faço uma anotação mental.
          Respiro fundo. Sinto um cheiro estranho. Não preciso ser nenhuma especialista para saber que cheiro é esse.
Alguma coisa está queimando. E sei que isso não é um bom sinal.
          Dou meia volta e me deparo com uma garota em chamas. Seus punhos cerrados ao lado do corpo queimam e seus olhos perpassam nada além de fúria. Um calafrio percorre minha espinha.
          — Ãn... - cutuco a elfa que se vira para trás, rapidamente.
— Você estava lá, não estava?! - a mulher, totalmente transtornada, se aproxima de nós criando uma trilha de fogo atrás de si. Isso não vai acabar bem, penso, dando uma boa olhada na floresta de pinheiros ao nosso redor.
A arqueira não parece se abalar com a chegada da mulher. Ela permanece intacta, erguendo suavemente seu queixo, desafiando-a. O clima está esquentando. Diferentemente dela, eu me assusto. Dou um passo para trás e acabo caindo no chão. Fracote, repreendo-me.
— Olha o que você fez comigo! - a mulher aponta para si mesma - Isso é culpa sua! - seu olhos despejam uma fumaça acizentada como se suas lágrimas queimassem por causa do calor de seu próprio corpo.
— Calminha, fica fria. - a elfa ironiza, pegando lentamente seu arco e flechas.
— Você poderia ter evitado tudo isso mas não fez nada para me ajudar! - sua voz sai chorosa. Ela parece implorar por compreensão. Não consigo entender o que está acontecendo. Ela deve ter sido acusada por uma coisa que não fez. Deve ter sido injustiçada. Permaneço imóvel no chão.
A arqueira permanece sem demonstrar qualquer reação. Não parece se comover em nenhum momento. Quando ela lança a flecha de sua aljava, seu cenho demonstra nada além de desdém. É desprezo que vejo em seu olhar? A flecha se transforma em cinzas antes que pudesse atingir a mulher em chamas.
— A culpa de eu estar aqui é sua. E você vai pagar. - ela finalmente dirige o olhar à mim - Cada um de vocês vão! - ela vocifera. Sua mágoa foi substituída por ódio. Seus olhos fervilham. Sua alma queima. Antes que a mulher explodisse, a elfa o faz.
— Você é uma ameaça! Matou a família e acabou com a vida de pessoas inocentes. Talvez você só sirva para isso, afinal: para destruir. - a arqueira olha de cima a baixo para a mulher e dá seu golpe final: - Deveria me agradecer por livrar aquelas pessoas de você.
          O fogo se intensifica e alguns pinheiros começam a queimar. O som dos estalos se torna mais alto. Não há mais neve no chão. A mulher, impulsionada pelo ódio, agarra o pescoço da arqueira com suas mãos em chamas e levanta-a do chão. Prendo a respiração. A boca da elfa se abre mas nenhum som sai. Ela não consegue gritar. O sangue escorrendo de seu pescoço pinga na primeira flor da primavera. A elfa se debate mas suas tentativas de se soltar falham. Ela se contorce. Parecia usar todas as suas forças para tentar sair dali. O cheiro de carne queimada paira no ar.
          Repentinamente ela para. Seu arco e flechas cai no chão. Mais gotas pingam. A flor, antes amarelada, se torna vermelha e por um segundo me pergunto como ela não queimou. Os pés da arqueira começam a tremer levemente como se estivesse tendo espasmos. A mulher abre um sorriso malicioso, se deliciando com a vingança. Meu corpo está petrificado no chão. Não sei o que fazer não sei o que fazer não sei o que fazer. A cabeça da elfa pende para minha direção. Seus olhos estão arregalados. Uma das veias em seu olho estourou, reparo. Sua boca se abre. Seus lábios tremem. Quer me dizer alguma coisa. Fuja. Ela quer que eu fuja, quer que eu me salve. Seus olhos se fecham e sua cabeça pende para trás. Seu pescoço está tão mole que temo que a cabeça se desprenda do corpo.
          Impulsionada por uma força que eu não sabia que tinha, me levanto e pego, velozmente, o arco e flechas caído no chão.
          — Ei! - chamo a mulher que estava matando minha amiga.
          Ela olha para mim e não consigo ver nada além de sua alma vulcânica e vazia. Ela solta o corpo da elfa e uma poça de sangue rapidamente se forma ao seu redor. Ela se aproxima de mim com certa curiosidade. Me obrigo a deixar meus pés colados no chão. Não vou recuar.
          — Essa guerra não é sua, garotinha.

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