✉ Capítulo 1 ✉

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Valentina

Você deve estar se perguntando como, de repente, apareci na vida do Pedro.

Pois é, é complicado explicar como tudo começou, mas para isso, preciso falar um pouco de mim.

Nasci em Belo Horizonte e morei durante toda a infância e início de adolescência num bairro simples. Nunca fui muito de sair de casa nem tive muitos amigos. Cuidava dos meus dois irmãos mais novos enquanto minha mãe trabalhava dia e noite, para garantir o nosso sustento.

Na infância, fui marcada pela dolorosa imagem de meu pai maltratando minha mãe quando chegava bêbado do trabalho aos fins de semana. Tapas, gritos, puxões, socos e lágrimas eram preenchidos pela visão da minha versão mais nova, sempre escondida em algum canto da casa enquanto presenciava o relacionamento abusivo de meus pais. Até que um dia ele se foi, a bebida o levou ao fundo do poço. Meu pai faleceu de cirrose e, com apenas 8 anos, eu tive de amadurecer e cuidar de meus irmãos.

Em minha vida não tinha espaço para amizades e amores. Na adolescência, me dediquei em estudar para ajudar minha família a, um dia, ter o que tanto sonhavam. Foi quando conheci a pessoa que marcaria minha vida para sempre.

Aos treze anos, estava comprando frutas sozinha para meus irmãos em uma feira de rua, quando ao pagar por algumas bananas e mamões, saía tranquilamente em direção à minha casa.

Um grito me conteve.

— Peguem aquela garota! Ela me roubou! — Uma voz masculina bradou.

Continuei meu trajeto, contendo a curiosidade de saber quem era a tal garota ladra. Mas não durou muito, pois descobri que a garota era eu.

— Ei mocinha! Aquele senhor disse que você a roubou! — Uma mulher pálida de cabelos grisalhos me puxou na calçada.

Virei na direção dela, cheia de medo.

— Não, eu não roubei nada. Comprei algumas frutas para meus irmãos, nada mais.

O homem que deu os gritos iniciais era o dono de uma das barracas da feira, mas logo deixou tudo e conseguiu me alcançar.

— Sua neguinha insolente! Me devolve minhas frutas! — Ele, um homem alto, forte, pardo e de voz estrondosa, me intimou.

Estava com medo, não só por ser confundida com uma ladra, mas por estar sendo ameaçada por alguém do porte dele. Contive as lágrimas que ameaçavam descer de meu rosto, além de ter sido acusada de algo que não cometi, ainda fui rotulada como inferior pelo meu tom de pele.

— Não me chame assim, eu não fiz nada! Olha. — Mostrei a sacola. — Comprei apenas as bananas e os mamões que estão aqui, eu paguei por eles com muito sacrifício! — me defendi.

— Gente como você não aprende mesmo! Já deve ter dado sumiço nas frutas roubadas. — O homem esbravejou. — Dane-se! — Voltou correndo para sua barraca.

A mulher que presenciava tudo olhava com compaixão para mim, que permaneci estática no meio da rua, com uma pequena multidão aglomerada em volta daquela cena.

— Desculpe — disse e se foi.

Eu ainda estava estática no meio daquele turbilhão. Meu coração gelou, e eu quis chegar logo em casa para chorar em paz.

— Ei, menina! — Uma voz surgiu no meio das pessoas. — Ei, qual seu nome?

Da multidão surgiu um menino magro de olhos sorridentes. O menino era bonito, um pouco bronzeado, com os cabelos ondulados.

2- Imensurável {AMOSTRA}Onde histórias criam vida. Descubra agora