Acontecia que até os próprios passeios, feitos antes de recolher-nos aos Buissonnets, me deixavam na alma um sentimento de tristeza. A família, então, já não se reunia toda, porque Papai, querendo agradar a Titio, deixava-lhe Maria ou Paulina todas as tardes de Domingo. Havia a única circunstância de que, para mim, era grande alegria poder ficar também. Gostava que assim acontecesse, mais do que ser convidada exclusivamente, porque então se ocupavam menos comigo. Meu máximo prazer era escutar tudo quanto meu Tio falava. Não apreciava, porém, que me fizesse perguntas, e sentia bastante medo, quando me punha sobre um joelho só, enquanto cantava o Barba-Azul com voz formidável... Era, pois, com satisfação que aguardava a chegada do Papai para nos buscar.
Na volta, olhava para as estrelas que cintilavam docemente, e esta vista me enlevava... Havia, sobretudo, uma constelação de pérolas de ouro que notava com alegria, por achar que tinha a forma de um T (aqui ponho mais ou menos sua forma). Fazia com que Papai a visse, dizendo-lhe que meu nome estava inscrito no Céu. Depois, não querendo ver nada desta terra mesquinha, pedia-lhe que me guiasse. Então, sem olhar onde punha os pés, erguia a cabecinha bem alto para o ar, e não me cansava de contemplar o azul do Céu estrelado! ...
Que direi de nossos serões de inverno, mormente dos de Domingo? Ah! como me era agradável, depois do jogo de damas, sentar-me com Celina nos joelhos de Papai... Como sua bela voz, entoava canções que enchiam a alma de pensamentos elevados... ou então, embalando-nos de mansinho, recitava poesias inspiradas nas verdades eternas... Depois, subíamos para fazer a oração em comum, e a rainhazinha ficava só ao pé do seu Rei, não precisando senão olhar para ele para saber como rezam os Santos... Afinal, íamos por ordem de idade dar boa-noite a Papai e receber um beijo. A rainha vinha naturalmente por última. Para a beijar, o rei tomava-a pelos cotovelos, e ela exclamava bem alto: "Boa noite, Papai, boa noite, dorme bem". Todas as noites era a mesma repetição...
Em seguida, minha mãezinha tomava-me nos braços e levava-me à cama de Celina. Então eu dizia: "Paulina, fui boazinha hoje?... Será que os anjinhos voarão em redor de mim?" A resposta era sempre que sim. Do contrário, passaria a noite toda a chorar. .. Depois de me beijar, como também o fazia minha querida madrinha, Paulina tornava a descer, e a coitada da Teresinha ficava completamente só na escuridão. Por mais que imaginasse os anjinhos a voarem em derredor, o pavor logo a dominava, as trevas faziam-lhe medo, porque da cama não divisava as estrelas que fulgiam levemente...
Considero verdadeira graça que vós, minha querida Mãe, me acostumastes a vencer meus temores. De vez em quando, mandáveis-me de noite ir buscar sozinha algum objeto num cômodo distante. Se não fora tão bem orientada, teria ficado muito medrosa, ao passo que agora é realmente difícil assustar-me... Ocasiões há em que indago a mim mesma como pudestes educar-me com tanto amor e delicadeza sem me deixar baldosa; pois, a verdade é que não me deixáveis passar nenhuma imperfeição. Nunca me censuráveis sem razão de ser, como também nunca voltáveis atrás numa coisa já decidida. Sabia-o tão bem que eu não teria podido nem desejado dar um passo se mo proibistes. Até papai era obrigado a conformar-se com vossa vontade. Sem o consentimento de Paulina, não ia a passeio e quando papai dizia para eu ir eu respondia: "Paulina não quer". Então, ele ia pedir por mim. Para agradar-lhe, algumas vezes Paulina dizia sim, mas Teresinha percebia pela sua fisionomia que contra sua vontade. Punha-se a chorar sem aceitar consolo até que Paulina dissesse sim e a beijasse cordialmente.
Quando Teresinha adoecia, o que acontecia todos os invernos, não é possível dizer com que ternura era tratada. Paulina fazia-a dormir em sua cama (favor indizível) e lhe dava tudo o que ela queria. Um dia, Paulina pegou debaixo do travesseiro uma linda faquinha que lhe pertencia e, dando-a à sua filhinha, deixou-a mergulhada num deslumbramento indescritível: "Ah! Paulina", exclamou ela, "tu me amas muito para te desfazeres por mim da tua linda faquinha que tem uma estrela de madrepérola... Mas, sendo que me amas tanto, farias o sacrifício do teu relógio para eu não morrer?..." "Não só para tu não morreres, daria meu relógio; mas faria logo o sacrifício dele para ficares boa logo". Ao ouvir essas palavras de Paulina, meu espanto e minha gratidão foram tantos que não sei expressá-los... No verão, às vezes, eu tinha náuseas; Paulina tratava-me ainda com ternura. Para distrair-me, o que era o melhor remédio, carregava-me num carrinho de mão em volta do jardim e, fazendo-me descer, colocava no lugar um bonito pé de margaridas que ela carregava com muita precaução até meu jardim, para onde ele era transplantado com grande solenidade...
Paulina recebia todas as minhas confidências íntimas, dissipava todas as minhas dúvidas... Uma vez, estranhei que Deus não desse glória igual no Céu a todos os eleitos e receava que não fossem todos felizes, Então, Paulina fez-me buscar o copo grande de papai e colocá-lo ao lado do meu pequeno dedal e disse para encher os dois. A seguir, perguntou-me qual dos dois estava mais cheio. Respondi que os dois estavam cheios e não podiam conter mais. Minha mãe querida fez-me então compreender que o Céu Deus dá a seus eleitos tanta glória quanto podem conter e que, assim, o último nada tem a cobiçar ou invejar do primeiro. Assim é que, pondo ao meu alcance os mais sublimes segredos, sabíeis, Madre, dar à minha alma o alimento que lhe era necessário...
Com quanta alegria via, a cada ano, chegar a premiação pelo estudo!... Aí, como sempre, a justiça reinava e só recebia as recompensas merecidas. Sozinha, de pé no meio da nobre assembléia, ouvia minha sentença, lida pelo Rei França e de Navarra. Meu coração batia forte ao receber os prêmios e a coroa... para mim, era como uma representação do juízo final!... Logo após a distribuição dos prêmios, a rainhazinha tirava o vestido branco e apressavam-se em fantasiá-la para tomar parte na grande peça teatral!...
Como eram alegres essas festas familiares... Como eu estava longe, então, ao ver meu rei querido e radiante, de prever as provações que iriam visitá-lo!...
Um dia, porém, Deus mostrou-me, numa visão verdadeiramente extraordinária", a imagem viva da provação que Ele estava preparando para nós, seu cálice já enchia".
Papai estava viajando há vários dias e ainda faltavam dois para seu regresso. Era duas ou três horas da tarde, o sol brilhava e a natureza parecia em festa. Eu estava sozinha na janela de uma água-furtada que dava para o grande jardim; olhava diante de mim, a mente ocupada por pensamentos alegres, quando avistei frente à lavanderia que se encontrava logo adiante um homem vestido exatamente como papai, mesma estatura e mesmo modo de andar, apenas muito mais curvado... Sua cabeça estava coberta por uma espécie de avental de cor indefinida, de sorte que eu não podia ver-lhe o rosto. Estava com chapéu igual ao de papai. Vi-o andar em passos regulares, beirando meu jardinzinho... Logo, um sentimento de pavor sobrenatural invadiu minha alma. Num instante, imaginei que papai tivesse voltado e que se escondesse a fim de surpreender-me. Então, chamei-o em voz bem alta, com voz trêmula de emoção: "Papai, Papai!..." Mas o estranho personagem não parecia ouvir-me. Continuou sua caminhada regular sem olhar para trás. Seguindo-o com os olhos, vi-o dirigir-se para o pequeno bosque que cortava ao meio a grande alameda. Esperava vê-lo aparecer do outro lado das grandes árvores, mas a visão profética esvaíra-se!... Tudo isso só durou um instante, mas gravou-se tão profundamente em meu coração que hoje, depois de quinze anos... a lembrança me é tão presente como se a visão estivesse ainda diante dos meus olhos...
Maria estava convosco, Madre, num quarto que se comunicava com aquele onde eu me encontrava. Ouvindo-me chamar por papai, sentiu impressão de pavor, percebendo que, contou-me depois, devia estar acontecendo algo extraordinário. Sem externar sua emoção, correu junto a mim e me perguntou por que eu estava chamando papai, que fora a Alençon. Contei, então, o que acabara de ver. Para me acalmar, Maria disse que, sem dúvida, Vitória quisera pregar-me uma peça e escondera a cabeça com seu avental. Interrogada, essa afirmou não ter saído da cozinha. Aliás, eu tinha certeza de ter visto um homem que se parecia com papai. Então fomos as três ao bosque, mas como não achamos sinal nenhum da passagem de alguém dissestes-me para não mais pensar nisso...
Não mais pensar estava além do meu poder. Muitas vezes minha imaginação representou-me a cena misteriosa que eu presenciara... Muitas vezes procurei levantar o véu que me escondia o sentido, pois no fundo do meu coração conservava a convicção íntima de que essa visão possuía um sentido que havia de ser-me revelado um dia... Esse dia demorou a chegar, mas após catorze anos Deus rasgou o véu misterioso. Estando de licença com Irmã Maria do Sagrado Coração, falávamos, como sempre, das coisas da outra vida e das nossas recordações de infância, quando lembrei-lhe a visão que eu tivera na idade de 6 para 7 anos. De repente, relatando os pormenores dessa cena estranha, ambas compreendemos o que significava... Era papai, sim, que eu vira andando, curvado pela idade... Era ele carregando no seu rosto venerável, na sua cabeça branca, a marca da sua gloriosa provação... Como a Face Adorável de Jesus, velada durante sua Paixão, assim a face do seu fiel servo devia ficar velada nos dias dos seus sofrimentos, a fim de poder resplandecer na Pátria Celeste junto a seu Senhor, o Verbo Eterno!... Foi do seio dessa glória inefável onde reina no céu que nosso pai querido obteve para nós a graça de compreender a visão que sua rainhazinha tivera numa idade em que não é necessário temer a ilusão! Foi desde o seio da glória que obteve para nós esse doce consolo de podermos compreender que, dez anos antes da nossa grande provação, Deus no-la mostrou como um pai deixa seus filhos entreverem o futuro que lhes prepara e se compraz em considerar por antecipação as riquezas incalculáveis que lhes são destinadas...
Ah! por que foi a mim que Deus deu essa luz? Por que mostrou a uma criança tão nova unia coisa que ela não podia compreender, uma coisa que, se a tivesse compreendido, a teria matado de dor, por quê?... Sem dúvida, esse é mais um daqueles mistérios que só compreenderemos no céu e que nos causará uma admiração eterna!...
Como o Bom Deus é bom! ... Como põe as provações em exata equação com a forças que nos confere. Nunca, como acabo de afirmá-lo, poderia aturar a própria ideia dos amargos sofrimentos que o futuro me reservava... Sem frêmito não conseguia sequer pensar em que o Papai podia morrer... Certa vez trepara ele ao topo de uma escada de mão. Como me encontrava justamente por debaixo, gritou-me: "Arreda-te, pobre bichinho, se despencar, esmago-te''. Ao ouvir isso, tive uma reação interior. Em vez de afastar-me, apoiei-me contra a escada, pensando comigo: "Pelo menos, se o Papai cair, não terei a dor de vê-lo morrer, pois morrerei com ele". Não consigo externar quanto amava Papai. Tudo nele me causava admiração. Quando me explicava suas idéias (como se fora menina crescida), dizia-lhe com sinceridade que, por certo, se falasse tudo isso aos grandes homens do governo, toma-lo-iam para o constituir Rei, e que então a França seria feliz como nunca o fora antes... No fundo, porém, alegrava-me (e disso me inculpava como de um pensamento egoísta) por não haver ninguém senão eu que conhecia bem Papai. Pois, se viesse a ser Rei de França e de Navarra, sabia que se daria por infeliz, porque tal é a sorte de todos os monarcas, e sobretudo porque já não seria o meu Rei, só para mim!...
Tinha eu seis ou sete anos, quando Papai nos levou a Trouville. Jamais esquecerei a impressão que o mar me causou. Não podia coibir-me de contemplá-lo sem interrupção. Sua majestade, o bramir das ondas, tudo me falava à alma a respeito da Grandeza e do Poder do Bom Deus. Recordo-me de que, no passeio que fazíamos pela praia, um senhor e uma senhora, como me vissem a correr alegre em redor do Papai, aproximaram-se e perguntaram-lhe se eu era dele, dizendo que era uma menininha muito graciosa. Respondeu-lhes Papai que sim, mas notei que lhes deu sinal para não me elogiar... Era a primeira vez que ouvia dizer que eu era graciosa. Isto me deixou bem contente, pois não supunha que o fosse. Vós tomáveis, minha querida Mãe, tanta precaução em não permitir, junto a mim, nada que pudesse comprometer minha inocência, principalmente em não me deixar ouvir alguma palavra que insinuasse vaidade em meu coração. Como só dava atenção às vossas palavras e às de Maria (e de vossa parte nunca me dirigistes uma única lisonja), não liguei muita importância às palavras e aos olhares admirados da senhora.
Ao entardecer, à hora que o sol parece banhar-se na imensidão das ondas, deixando atrás de si um sulco luminoso, ia sentar-me sozinha com Paulina no rochedo ... Então, acudia-me à lembrança a comovente história do "Sulco de ouro" Fiquei a contemplar longamente a esteira luminosa, imagem da graça a clarear a rota do barquinho de graciosa vela branca... Junto a Paulina, tomei a resolução de nunca distanciar minha alma do olhar de Jesus, a fim de que navegue tranquila em direção da Pátria dos Céus! ...
Minha vida deslizava tranquila e feliz. A afeição de que era cercada nos Buissonnets, fazia-me crescer, por assim dizer, mas não havia dúvida de que já era bem desenvolvida, para começar a conhecer o mundo e as misérias de que anda cheio...
Tinha meus oito anos e meio, quando Leônia deixou o internato, e tomei o lugar dela na Abadia. Ouvi dizer, muitas vezes, que o tempo passado em colégio é o melhor e o mais doce da vida. Para mim, não foi assim. Os cinco anos que ali passei foram os mais tristonhos da minha vida. Não tivesse comigo minha querida Celina, ali não poderia ter ficado um mês sequer, sem cair doente... A pobre florzinha estava habituada a lançar suas débeis raízes em terra de escol, feita sob medida para ela. Parecia-lhe, também, muito desagradável viver entre flores de toda espécie, com raízes freqüentemente pouco delicadas, e ver-se na obrigação de procurar em terra comum a seiva necessária para sua subsistência! ...
Vós, porém, me instruístes tão bem, minha querida Mãe, que chegando ao internato era a mais adiantada das crianças de minha idade. Entrei em classe de alunas todas superiores a mim em tamanho. Uma delas, com seus 13 a 14 anos, era pouco inteligente, mas sabia, contudo, impor-se às colegas e às próprias mestras. Vendo-me tão nova, quase sempre a primeira da classe e estimada de todas as religiosas, sentiu por certo inveja, cousa muito perdoável em aluna interna, e fez-me pagar de mil modos os meus pequenos bons êxitos...
Com minha índole tímida e delicada, não sabia como defender-me e limitava-me a chorar sem dizer nada, não me queixando, nem sequer a vós, daquilo que padecia. Não tinha, contudo, bastante virtude para me sobrepor a tais misérias da vida, e meu pobre coraçãozinho sofria deveras. ... Por sorte minha, todas as tardes retornava ao lar paterno, e então meu coração expandia-se. Pulava aos joelhos do meu Rei, a quem dizia as notas que tinha recebido, e o seu beijo fazia-me esquecer todas as minhas mágoas... Com que alvoroço não anunciei o resultado de minha primeira composição (composição de História Sagrada). Faltou-me um só ponto para a nota máxima, pois não soubera o nome do pai de Moisés. Era, portanto, a primeira e tirei uma bela condecoração de prata. Papai deu-me em recompensa uma linda moedinha de quatro soldos. Coloquei-a num estojo que ficou destinado a receber nova moeda, sempre da mesma importância, quase todas as quinta-feiras... (Do mesmo estojo ia tirar, quando em algumas festas queria contribuir do meu bolso na coleta de esmolas, quer para a propagação da fé, quer para outras obras congêneres). Encantada com o bom êxito de sua pupila, Paulina deu-lhe de presente um lindo arco de brincar, com o fito de encorajá-la a continuar bem estudiosa. A pobrezinha tinha real necessidade das alegrias de família, sem as quais a vida de colégio lhe seria árdua demais.
Quinta-feira de tarde, não havia aulas. Não era, porém, como as folgas dadas por Paulina. Não ficava no mirante com Papai. Tinha que brincar, não com minha Celina, o que me agradava, quando sozinha com ela, mas em companhia de minhas priminhas e das meninas Maudelonde. Era para mim verdadeira mortificação, pois não sabia brincar, como as demais crianças. Não era companheira agradável. No entanto, sem o conseguir, fazia todo o meu possível para imitar as outras. Sentia muito tédio, principalmente quando tinha que passar toda a tarde a dançar quadrilhas. A única cousa do meu gosto era ir ao Jardim da Estrela. Então, eu era a primeira em tudo, colhendo muitas flores, e, por saber encontrar as mais bonitas, , provocava a inveja de minhas coleguinhas...
O que também me agradava, era ficar por acaso a sós com Mariazinha. Por já não contar com Celina Maudelonde que a levava a jogos comuns, deixava-me livre escolha, e eu escolhia então um jogo inteiramente novo. Maria e Teresa passam a ser duas solitárias, que não dispunham senão de uma mísera choupana, de um pequeno trigal, e de alguns legumes para cultivar. A vida delas corria numa contemplação contínua; quer dizer, uma das solitárias substituía a outra na oração quando era preciso cuidar da vida ativa. Tudo se fazia num acordo, num silêncio, em moldes tão religiosos, que raiava à perfeição. Quando titia vinha buscar-nos a passeio, nosso jogo continuava até na rua. As duas solitárias rezavam juntas o terço, valendo-se dos dedos, a fim de não exibir sua devoção ao público indiscreto. Um dia, entretanto, a mais jovem solitária distraiu-se. Tendo recebido um bolo para o lanche, antes de comer fez um grande sinal-da-cruz, o que provocou o riso de todos os profanos do século...
Maria e eu tínhamos sempre os mesmos palpites. Os próprios gostos afinavam-se tão harmoniosamente que, certa vez, nossa união de vontades passou da conta. Ao voltarmos uma tarde da Abadia, disse à Maria: "Conduze-me, que vou fechar os olhos". - "Eu também quero fechá-los", respondeu-me. Dito e feito. Sem discutir, cada qual pôs em obra sua vontade... Estávamos na calçada, não havíamos de temer os carros. Depois de passear assim por alguns minutos, tendo apreciado as delícias de andar sem ver, as duas tontinhas caíram juntas sobre umas caixas colocadas à porta de uma loja. Melhor, derrubaram-nas. Muito encolerizado, saiu o negociante para pegar sua mercadoria. As duas ceguinhas voluntárias se levantaram por si mesmas em boas condições, e corriam a passos largos, com olhos esbugalhados, enquanto ouviam as justas reprimendas de Joana, que ficara tão zangada quanto o negociante!... Por isso, para nos punir, resolveu separar-nos uma da outra. E daquele dia em diante Maria e Celina iam juntas, enquanto eu caminhava com Joana. Isto pôs fim à nossa grande união de vontade. Não foi um mal para as mais velhas, que nunca entravam em acordo e discutiam durante todo o trajeto do caminho. Desta forma a paz foi completa.
Nada disse ainda a respeito do meu relacionamento íntimo com Celina. Oh! se fosse preciso narrar tudo, não acabaria nunca...
Em Lisieux, inverteram-se os papéis. Celina tornara-se uma criança terrivelmente arteira e buliçosa, enquanto Teresa já não passava de uma menininha muito tratável, mas choramingas a mais não poder... Isto não impedia que Celina e Teresa crescessem cada vez mais em sua mútua afeição. De vez em quando, havia algumas pequenas discussões, sem maiores conseqüências, e no fundo elas sempre se entendiam. Posso afiançar que minha querida maninha jamais me causou desgosto, mas foi para comigo como que um raio de sol, sempre a alegrar-me e a consolar-me... Quem descreveria a intrepidez com que tomava minha defesa na Abadia, quando me acusavam?... Tão grande era seu cuidado pela minha saúde, que por vezes me importunava. O que não me enfadava era observá-la, quando brincava. Punha em certa ordem todo o magote de nossas bonequinhas, e dava-lhes aula como uma mestra competente. Só que dava um jeito de serem suas filhas sempre bem comportadas, enquanto que as minhas eram, muitas vezes, expulsas da classe, por mau comportamento... Falava-me de todas as cousas novas que vinha aprendendo na classe, o que muito me entretinha, considerando-a um poço de ciência.
Haviam-me apelidado "filhinha de Celina". Por isso, quando ela estava descontente comigo, seu maior sinal de aborrecimento era declarar-me: "Já não és minha filhinha. Acabou-se. Disso nunca esquecerei. . . " Então só me restava chorar como Madalena, suplicando-lhe ainda me considerasse sua filhinha. Logo me abraçava e prometia-me de já não se lembrar de nada... Para me consolar, tomava uma de suas bonecas e dizia-lhe: "Minha querida, dá um abraço em tua tia". Certa ocasião, a boneca foi tão ardorosa em abraçar-me com carinho, que me enfiou os dois bracinhos pelo nariz... Celina, que não o fizera de caso pensado, olhava espantada... para mim com a boneca suspensa ao nariz. A tia não levou muito tempo em se desfazer dos abraços por demais carinhosos de sua sobrinha, e desatou a rir, gostosamente, de tão singular aventura.
O mais divertido era ver-nos comprar juntas nossos presentes de boas-festas no bazar. Cuidávamos de ficar escondidas uma da outra. Dispondo de 10 soldos para gastar, precisávamos pelo menos de 5 ou 6 objetos diferentes, e tratava-se de ver quem compraria as cousas mais bonitas. Encantadas com nossas aquisições, aguardávamos com impaciência o primeiro dia do ano, a fim de oferecermos, uma à outra, nossos grandiosos presentes. Quem acordasse antes da outra, apressava-se em lhe desejar feliz ano novo, e logo nos dávamos uma à outra os presentes de boas-festas. Cada qual de nós ficava extasiada com as preciosidades, que se vendiam por 10 soldos! ...
Estes mimos nos causavam quase tanto prazer quanto os lindos presentes de boas-festas que vinham de Titio. Isto, aliás, era apenas o começo das alegrias.. Naquele dia, vestíamo-nos num instante, e cada qual se punha à espreita para saltar ao pescoço de Papai. Logo que ele saísse do quarto, eram gritos de alegria por toda a casa, e nosso bom Paizinho mostrava-se feliz por nos ver tão contentes ... Os presentes de boas festas que Maria e Paulina davam às suas filhinhas, não eram de grande valor, mas também lhes proporcionavam grande alegria... Oh! naquela idade não éramos enfaradas. Nossa alma expandia-se em toda a sua frescura, como uma flor que é feliz por receber o orvalho da manhã... a mesma aragem balouçava nossas corolas, e o que para uma fosse motivo de alegria ou de mágoa, sê-lo-ia ao mesmo tempo também para a outra. Com efeito, nossas alegrias eram em comum. Bem o percebi no belo dia da primeira Comunhão de minha querida Celina. Só tendo sete anos, ainda não frequentava a Abadia, mas conservei no coração a gratíssima lembrança da preparação que vós, minha querida Mãe, ministrastes à Celina. Todas as tardes, vós a tomáveis aos joelhos, e com ela conversáveis sobre o grande ato que ia praticar. Eu cá escutava, muito desejosa de preparar-me também, mas freqüentemente me dizíeis que fosse embora, por ser ainda muito pequena. Sentia então um desgosto muito grande, pensando comigo que quatro anos não eram demais como preparação para receber o Bom Deus...
Uma noite, escutei-vos falar que, feita a primeira Comunhão, se devia começar vida nova. Resolvi, imediatamente, a não esperar por esse dia, mas começá-la ao mesmo tempo que Celina... Nunca sentira tanto que a amava, como vim a senti-lo durante seu retiro de três dias. Pela primeira vez na vida, estava longe dela e não dormia em sua cama... No primeiro dia, esquecida de que não ia voltar, guardei uma mão-cheia de cerejas para as comer com ela. Quando percebi que não chegava, fiquei muito pesarosa. Papai consolou-me com a declaração de que no dia seguinte me levaria até a Abadia para visitar minha Celina, e que eu lhe daria outra mão-cheia de cerejas! ... O dia da Primeira Comunhão de Celina deixou-me uma impressão semelhante à que tive na minha própria. Ao despertar de manhã, sozinha, na cama grande, senti-me inundada de alegria. "É hoje! ... Chegou o grande dia..." Não me cansava de repetir estas palavras. Parecia-me que era eu quem ia fazer minha Primeira Comunhão. Creio ter recebido grandes graças nesse dia, e considero-o como um dos mais belos de minha vida...
Voltei um pouco a fim de recordar essa deliciosa e suave passagem. Devo, agora, falar da dolorosa provação que veio partir o coração de Teresinha, quando Jesus lhe arrebatou a querida mamãe, a sua Paulina, tão afetuosamente amada! ...
Um dia dissera à Paulina que queria ser solitária, partir com ela para um deserto longínquo. Deu-me por resposta que meu desejo era também o seu, e que esperaria até que eu fosse bastante grande para a partida. Isto, sem dúvida, não fora dito seriamente, mas Teresinha tinha-o levado a sério. Por conseguinte, qual não foi sua dor ao ouvir, um dia, sua querida Paulina falar com Maria de sua próxima entrada no Carmelo... Não sabia o que era Carmelo, mas entendia que Paulina me deixaria para entrar em convento. Entendia que não esperaria por mim, e que eu perderia minha segunda Mãe! ... Oh! Como descrever a angústia do meu coração? ... Compreendi num instante o que era a vida. Até ali não a tinha visto tão tristonha, mas então se me deparou em toda a sua realidade. Vi que não era senão sofrimento e separação contínua. Bem amargas as lágrimas que derramei, pois ainda não compreendia o gozo do sacrifício. Era fraca, tão fraca, que tomo por grande graça ter podido suportar uma provação que parecia colocar-se muito acima de minhas forças... Se ficasse sabendo, aos poucos, da partida de minha querida Paulina, talvez meu sofrimento não fora tanto. Mas, tê-lo sabido de surpresa foi como se uma espada se me cravasse no coração.
Sempre me lembrarei, minha querida Mãe, com que ternura me consolastes. Depois, explicastes-me a vida do Carmelo, que me pareceu muito bonita! Rememorando tudo o que me dissestes, senti dentro de mim ser o Carmelo o deserto onde o Bom Deus queria que fosse também esconder-me... Senti-o com tanta veemência que não tive a mínima dúvida no coração. Não era um devaneio de criança que se deixa levar, mas a certeza de um chamado divino. Queria eu ir para o Carmelo, não por causa de Paulina, mas por Jesus tão somente... Pensei muitas coisas que se não podem exprimir por palavras, mas que me deixaram grande paz na alma...
No dia seguinte, confiei meu segredo à Paulina. Tomando meus desejos como vontade do Céu, disse-me que eu iria logo com ela visitar a Madre Priora do Carmelo, e precisava dizer-lhe o que o Bom Deus me fazia sentir ... Escolheu-se um domingo para a solene visita. Grande foi meu acanhamento, ao saber que Maria G. ficaria junto a mim, por ser eu muito pequena para visitar as Carmelitas. Entretanto, precisava descobrir um meio de estar sozinha. Eis a ideia que me ocorreu. Disse à Maria que, tendo o privilégio de visitar a Madre Priora, devíamos ser muito atenciosas e delicadas. Por isso, tínhamos de confiar-lhe nossos segredos. Portanto, cada qual, por sua vez, sairia um instante e deixaria a outra sozinha. Maria acreditou no que eu dizia, e a despeito de sua relutância em confiar segredos que não possuía, permanecemos, uma após outra, sozinha junto à nossa Madre. Tendo ouvido minhas grandes confidências, essa boa Madre acreditou em minha vocação. Declarou-me, todavia, que não eram recebidas postulantes de nove anos, e seria preciso aguardar meus dezesseis anos... Resignei-me, não obstante meu vivo desejo de entrar o mais cedo possível, e de fazer minha Primeira Comunhão no dia que Paulina tomasse o hábito... No mesmo dia, pela segunda vez, recebi louvores. Tinha vindo ver-me a Irmã Teresa de Santo Agostinho e não cansava de repetir que eu era engraçadinha... Minha intenção não era ir ao Carmelo para receber elogios, por isso, depois de sair, não parava de repetir ao Bom Deus que era única e exclusivamente por Ele que queria ser carmelita.
Procurei aproveitar bastante da minha Paulina querida durante as poucas semanas que ainda ficou no mundo. Todos os dias, Celina e eu comprávamos para ela bolo e bombons, pensando que dentro em pouco já não os comeria. Estávamos sempre ao seu lado, e não lhe dávamos um minuto de sossego. Chegou, afinal, o dia 2 de outubro, dia de lágrimas e de bênçãos, quando Jesus colheu a primeira de suas flores, que devia ser a mãe daquelas que poucos anos depois viriam unir-se de novo a ela.
Vejo ainda o lugar, onde recebi o derradeiro beijo de Paulina. Em seguida, Titia levou-nos todas para a missa, enquanto Papai subia a montanha do Carmelo para oferecer seu primeiro sacrifício... Toda a família se debulhava em lágrimas, de sorte que as pessoas, vendo-nos entrar na igreja, olhavam-nos com espanto. Mas isto importava-me pouco e não me impedia de chorar. Creio que, se tudo desmoronasse em redor de mim, não teria tomado nenhum conhecimento. Contemplava o belo céu azul, e ficava surpresa de que o Sol luzisse com tanto esplendor, enquanto minha alma submergia em tristeza!...
Pensais, talvez, minha querida Madre, que exagero a aflição que estava sentindo?... Levo em conta que não podia ser lá muito grande, pois tinha a esperança de encontrar-vos novamente no Carmelo, mas é que minha alma estava LONGE da maturidade. Por muitos crisóis devia eu passar até atingir o termo que tanto almejava...
Dois de outubro era o dia fixado para a reabertura de aulas na Abadia. Por isso precisei ir para lá, não obstante minha tristeza... Pela tarde veio Titia buscar-nos para irmos ao Carmelo, e vi minha querida Paulina atrás das grades... Oh! como sofri nessa visita ao Carmelo! Já que escrevo a história de minha alma, tenho a obrigação de dizer tudo à minha querida Mãe. Confesso que os sofrimentos anteriores à sua entrada não eram nada em comparação com os que lhe sucederam... Cada quinta-feira, íamos toda a família ao Carmelo, e eu, habituada que era a entreter-me com Paulina, de coração a coração, conseguia a muito custo dois ou três minutos ao terminar a visita. Entende-se que os passasse a chorar, e me fosse embora como o coração em frangalhos... Não percebia que, por atenção à Titia, preferíeis dirigir a palavra à Joana e à Maria, em vez de falar com vossas filhinhas... Não o percebia, e no fundo do coração punha-me a dizer: "Paulina está perdida para mim!!!" Surpreende ver como meu espírito se abriu no meio do sofrimento. Abriu-se a tal ponto que não tardei em cair doente.
A doença que me atingira, provinha certamente do demônio. Furioso com vossa entrada no Carmelo, quis desforrar-se contra mim do grande dano que nossa família lhe infligiria para o futuro, mas não sabia que a carinhosa Rainha do Céu velava por sua débil florzinha e lhe sorria do alto de seu trono, dispondo-se a deter a tempestade no momento que sua flor poderia quebrar irremediavelmente...
Pelo fim do ano, fui acometida de contínua dor de cabeça, que quase não me fazia sofrer. Estava em condições de continuar os estudos, e ninguém se preocupava por minha causa. Assim ficou a situação até a Páscoa de 1883. Tendo Papai ido a Paris com Maria e Leônia, Titia levou-me com Celina para sua casa. Certa noite, Titio que ficara comigo, falou-me de Mamãe, de recordações antigas, de uma maneira tão bondosa, que profundamente me comoveu e fez chorar. Disse-me, então, que eu tinha um coração demasiado sensível e necessitava de muita distração. E, com Titia, resolveu proporcionar-nos folguedos nos feriados de Páscoa. Naquela noite, devíamos ir ao Círculo Católico. Achando, porém, que estava muito cansada, Titia fez-me deitar. Ao trocar de roupa, fui sacudida por estranho tremor. Crendo que eu estava com frio, Titia rodeou-me de cobertores e botijas com água quente. Nada, entretanto, fazia reduzir minha agitação, que durou quase a noite inteira. Ao regressar do Círculo Católico, com minhas primas e Celina, Titio ficou muito surpreso de encontrar-me em tal estado. Tinha-o por muito grave, mas não o quis declarar, para que Titia se não sobressaltasse. No dia seguinte, mandou chamar o Dr. Notta que achou, como Titio, estar eu com doença muito grave, da qual nunca fora atingida criança tão nova. Todo o mundo ficou consternado. Minha Tia viu-se obrigada a deixar-me na casa, e cuidou de mim com um desvelo verdadeiramente maternal. Quando Papai voltou de Paris com minhas irmãs maiores, Aimée recebeu-os com um ar tão desconsolado, que Maria me supôs já morta... A doença, porém, não era ainda para morrer. Era, antes, como a de Lázaro, para que Deus fosse glorificado.. De fato, Ele o foi, graças à admirável resignação do meu pobre Paizinho, cuja ideia era que "sua filhinha ficaria louca, ou então morreria". Ele o foi, outrossim, graças à resignação de Maria! ... Oh! quanto não sofreu por minha causa... Como lhe sou reconhecida pelos cuidados que com tão grande desprendimento me prodigalizou... O coração ditava-lhe o que me era necessário. Na verdade, o coração de mãe é muito mais sagaz do que o de um médico. Sabe adivinhar o que convém na doença da filha...
A coitada da Maria teve de acomodar-se em casa do meu Tio, por não haver então possibilidade de me transportarem aos Buissonnets. Aproximava-se, entretanto, a tomada de hábito de Paulina. Diante de mim, evitavam de falar a respeito, sabendo do desgosto que teria em não poder assistir, mas era eu quem muitas vezes tocava no assunto, quando dizia que estaria bastante melhor para visitar minha querida Paulina. Realmente, o Bom Deus não quis privar-me dessa consolação. Quis antes consolar sua querida Desposada, que tanto sofrera com a doença de sua filhinha... Notei que, no dia do noivado, Jesus não quer submeter suas filhas a provações. Deve a festa correr sem contratempos, como antegozo das alegrias do Paraíso. Disso, não deu Ele prova já cinco vezes?... Pude, por conseguinte, abraçar minha Mãe querida, sentar-me em seus joelhos, e cobri-la de afagos... Pude contemplá-la, tão encantadora, em seu branco ornato de noiva... Oh! foi um dia radiante, de permeio em minha sombria provação, mas o dia passou com presteza... Tive logo de tomar a carruagem que dali me levou, bem longe de Paulina. . . bem longe do meu amado Carmelo. Depois de chegarmos aos Buissonnets, fizeram-me deitar, a contragosto meu, pois afiançava estar perfeitamente curada e já não precisar de tratamento. Ainda mal, não me encontrava senão no começo de minha provação!. .. No dia seguinte, tive uma recaída, e a doença agravou-se de tal maneira, que, por cálculos humanos, eu já não podia sarar... Não sei como descrever doença tão estranha. Persuadi-me agora de ser obra do demônio. Mas, bastante tempo depois da cura, acreditava ter ficado doente por acinte, o que constituía verdadeiro martírio para minha alma...
Falei disso com Maria que me tranquilizou o mais que podia, com sua bondade de sempre. Falei disso também em confissão, e meu confessor tentou acalmar-me, alegando que não era possível fingir estado de doença ao ponto em que ficara. O Bom Deus que indubitavelmente queria purificar-me, e antes de tudo humilhar-me, deixou comigo tal martírio íntimo até minha entrada para o Carmelo, onde o Pai de nossas almas me tirou, como que com a mão, todas as minhas dúvidas, e desde então ando perfeitamente tranquila.
Não é de surpreender que receasse ter-me fingido de doente, sem o ser na realidade? Pois, dizia e fazia cousas em que nem pensava, quase sempre parecia estar em delírio, a proferir palavras incoerentes. Apesar disso, tenho a certeza de não ter ficado, um instante sequer, privada do uso da razão... Muitas vezes parecia estar desfalecida, e não fazia o mínimo movimento. Então, deixaria praticar comigo o que quisessem, até que me matassem. Não obstante, escutava tudo o que se dizia em redor de mim, e ainda estou lembrada de tudo... Certa vez, aconteceu-me ficar sem poder abrir os olhos por mais tempo, nem abri-los por um instante, quando estava sozinha...
Creio que o demônio recebera um poder exterior sobre mim, mas não podia acercar-se de minha alma nem de meu espírito, senão para me inspirar enormes receios de certas cousas, por exemplo, de remédios muito simples, que em vão se esforçavam por me fazer tomar. No entanto, se o Bom Deus permitia ao demônio achegar-se a mim, também me enviava anjos visíveis ... Maria ficava sempre junto à minha cama, cuidava de mim e consolava-me com a afeição de mãe. Jamais externou o menor enfado, e eu, todavia, lhe dava muito incômodo, não admitindo que se arredasse de mim. No entanto, ela tinha a justa necessidade de ir tomar refeição com Papai, mas eu não parava de chamar por ela todo o tempo de sua ausência. Vitória que me fazia guarda, era bastantes vezes obrigada a ir chamar minha querida "Mamãe", como eu lhe chamava. Quisesse Maria sair, havia de ser para ir à missa, ou então para visitar Paulina. Então, eu não falava nada...
Meu Tio e minha Tia eram igualmente muito bons para comigo. Minha boa querida Titia vinha visitar-me todos os dias, e trazia-me uma infinidade de agrados. Vinham também visitar-me outras pessoas, amigas da família. Eu, porém, suplicava à Maria lhes dissesse que não queria receber visitas. Não me era agradável "ver, em redor de minha cama, pessoas sentadas, ENFILEIRADAS, a olharem para mim como se fosse um bicho raro". A única visita que me dava prazer era a do Titio e da Titia.
Depois da doença, não poderia precisar quanto minha afeição por eles subiu de ponto. Mais do que nunca, compreendi melhor que, para nós, não se tratava de parentes comuns. Oh! o pobre de nosso Paizinho tinha muita razão em nos repetir, de vez em quando, as palavras que acabo de escrever. Mais tarde, teve prova de que não se enganara, e agora deve por certo proteger e bendizer os que lhe tributaram tão abnegadas atenções ... Quanto a mim, como estou ainda no exílio, e não posso demonstrar meu reconhecimento, só disponho de um único meio para aliviar meu coração: rezar pelos parentes que estremeço, e que foram e ainda são tão bondosos para comigo!
Leônia também usava de muita bondade para comigo. Tentava distrair-me do melhor modo ao seu alcance. Eu é que algumas vezes a magoava, pois ela bem se capacitava de que, junto a mim, Maria era insubstituível... E que não fazia minha querida Celina por sua Teresa?... Em dia de domingo, em vez de sair a passeio, vinha fechar-se horas inteiras dentro de casa, ao pé de uma pobre menininha que tinha a aparência de idiota. Realmente, precisava haver amor para que se não esquivassem de mim... Ah! minhas queridas maninhas, quanto não vos fiz padecer! ... Ninguém, mais do que eu, vos causou tanto sofrimento, e ninguém recebeu tanto amor, quanto vós me prodigalizastes... Por sorte, terei o Céu para me desforrar. Muito rico é meu Esposo, e de seus tesouros de amor tirarei para vos retribuir, ao cêntuplo, tudo quanto sofrestes por minha causa...
Na doença, meu maior consolo, era receber carta de Paulina... Eu a lia, tornava a ler, até sabê-la de cor... Certa vez, minha querida Mãe, enviastes-me uma ampulheta e uma das minhas bonecas vestida de carmelita. Dar uma ideia de minha alegria é algo de impossível... Titio não ficou satisfeito, dizendo que, em vez de me fazerem lembrar do Carmelo, seria preciso mantê-lo longe do meu espírito. Mas, eu sentia pelo contrário, que a esperança de ser um dia carmelita, me alentava viver... Meu gosto era trabalhar para Paulina. Fazia-lhe pequenos artefatos de cartolina, e minha maior ocupação era tecer grinaldas de boninas e miosótis para a Santíssima Virgem. Estávamos no belo mês de maio. Toda a natureza se guarnecia de flores e trescalava de alegria. Só a "florzinha" é que se finava, e parecia emurchecer para sempre...
Sem embargo, tinha junto a si um Sol. Esse Sol era a Estátua milagrosa da Santíssima Virgem que, por duas vezes, tinha falado à Mamãe. Amiúde, sim, bem amiúde, a florzinha pendia sua corola em direção do Astro bendito... Certo dia, vi quando Papai entrou no quarto de Maria, onde eu estava acamada. Deu-lhe, com expressão de grande tristeza, várias moedas de ouro, dizendo-lhe escrevesse para Paris, mandando celebrar missas em honra de Nossa Senhora das Vitórias, para curar sua pobre filhinha. Oh! O como me comoveu ver a fé e o amor do meu querido Rei! Queria poder dizer-lhe que estava curada, mas já eram demais as falsas alegrias que lhe tinha preparado. Não eram, pois, meus desejos que poderiam produzir milagre, e para minha cura se fazia mister um milagre... Havia mister um milagre, e foi Nossa Senhora das Vitórias que o praticou. Num domingo (durante a novena de missas), Maria saiu para o jardim, e deixou-me com Leônia, que lia perto da janela. Ao cabo de alguns minutos, pus-me a chamar quase que à surdina: "Mamã... Mamã". Habituada a ouvir-me sempre chamar assim, Leônia não me deu atenção. Isso durou muito tempo. Então chamei mais forte, e por fim Maria voltou. Vi perfeitamente quando entrou, mas não conseguia dizer que a reconhecia, continuando a chamar cada vez mais forte: "Mamã..." Padecia muito com a luta violenta e inexplicável, e Maria talvez sofresse mais do que eu. Após baldados esforços para me mostrar que estava junto a mim, pôs-se de joelhos perto de minha cama, com Leônia e Celina. Voltando-se depois para a Santíssima Virgem, e rezando-lhe com o fervor de uma mãe que pede pela vida de sua filha, Maria alcançou o que desejava...
Por não encontrar nenhuma ajuda na terra, a coitada da Teresinha também se voltara para sua Mãe do Céu, suplicando-lhe de todo o coração, tivesse enfim piedade dela... De repente, a Santíssima Virgem me pareceu bela, tão bela, como nunca tinha visto nada tão formoso. O rosto irradiava inefável bondade e ternura, mas o que me calou no fundo da alma foi o "empolgante sorriso da Santíssima Virgem". Nesta altura, desvaneceram-se todos os meus sofrimentos. Das pálpebras me saltaram duas grossas lágrimas e deslizaram silenciosas sobre as faces. Eram lágrimas de uma alegria sem inquietação... Oh! pensei comigo, a Santíssima Virgem sorriu para mim, como sou feliz... Mas, nunca jamais o contarei a ninguém, porque então desapareceria minha felicidade. Sem nenhum esforço, baixei os olhos e enxerguei Maria que olhava para mim com amor. Parecia emocionada e dava impressão de suspeitar o valimento que a Santíssima Virgem me concedera... Oh! era exatamente a ela, às suas edificantes orações que devia a graça do sorriso da Rainha dos Céus. Quando viu meu olhar fito na Santíssima Virgem, disse de si para si: "Teresa está curada!" Sim, a florzinha ia renascer para a vida, o Raio luminoso que a reanimara, não pararia suas beneficências. Não atuou de uma só vez, mas de modo manso e agradável foi levantando e revigorando sua flor, de tal sorte que cinco anos depois ela desabrocharia na montanha do Carmelo.
Como o disse, Maria adivinhara que a Santíssima Virgem me tinha outorgado alguma graça oculta. Por isso, logo que fiquei a sós com ela, como perguntasse o que vira, não pude resistir às suas indagações, tão carinhosas e insistentes. Admirada de ver meu segredo descoberto, sem que o tivesse revelado, confiei-o em toda a sua extensão à minha querida Maria... Mas, infelizmente, como o tinha pressentido, minha felicidade ia desaparecer e redundar em amargura. Por quatro anos, a lembrança da inefável graça recebida foi para mim verdadeiro tormento espiritual. Não recuperaria minha felicidade senão aos pés de Nossa Senhora das Vitórias, quando então me foi devolvida em toda a sua plenitude... Mais tarde, tornarei a falar desta segunda graça da Santíssima Virgem.
Tenho agora que vos contar, minha Mãe querida, como minha alegria se converteu em tristeza. Depois de ter ouvido o relato ingênuo e sincero da "minha graça", Maria pediu-me autorização de comunicá-la no Carmelo, e por mim não podia dizer que não... Por ocasião de minha primeira visita ao querido Carmelo, fiquei inundada de alegria, quando vi minha Paulina com o hábito da Santíssima Virgem. Foi para nós duas, um momento muito venturoso... Havia tanta cousa por dizer, que não pude absolutamente falar nada. O coração estava cheio demais... A bondosa Madre Maria de Gonzaga ali estava também, e dava-me mil demonstrações de afeto.
Vi ainda outras freiras, diante das quais me inquiriram a respeito da graça que recebera, e quiseram saber de mim, se a Santíssima Virgem trazia ao colo o Menino Jesus, ou também se havia muita luminosidade etc. Todas essas perguntas me conturbaram e atormentaram. Só podia declarar uma cousa: "A Santíssima Virgem pareceu-me muito linda... e eu a vi sorrir para mim". Foi sua simples figura que me impressionara, razão por que me parecia ter mentido (meus tormentos espirituais acerca de minha doença já tinham começado), ao verificar que em seu íntimo as carmelitas imaginavam cousa muito diferente...
Não padece dúvida, tivesse guardado meu segredo, teria também guardado minha felicidade, mas a Santíssima Virgem permitiu tal tormento para o bem de minha alma. Sem ele, teria talvez algum pensamento de vaidade. Quando, pelo contrário, a humilhação se tornou minha partilha, não podia considerar a mim mesma senão com sentimento de profunda aversão... Oh! só no Céu poderei revelar o quanto sofri! ...
Por falar em visitas às carmelitas, lembro-me da primeira, pouco após a entrada de Paulina. Esqueceu-me falar disto, mas trata-se de um detalhe que não posso deixar de lado. Na manhã do dia em que devia dirigir-me ao parlatório, estando a refletir sozinha na cama (pois ali fazia minhas orações mais recolhidas, e sempre encontrava meu Bem-Amado, ao contrário do que acontecia à esposa dos Cantares), perguntava-me qual seria meu nome no Carmelo. Sabia que lá existia uma Irmã Teresa de Jesus. Apesar disso, meu belo nome de Teresa não me podia ser tirado. De repente, pensei no Menino Jesus a quem tanto amava e disse para mim mesma: "Oh! Como seria feliz em ser chamada de Teresa do Menino Jesus!" Nada disse no parlatório do sonho que tivera acordada, mas essa boa Madre M. de Gonzaga, perguntando para as irmãs qual o nome que deveria usar, veio-lhe à mente chamar-me pelo nome que eu tinha sonhado... Minha alegria foi grande e esse feliz encontro de pensamento pareceu-me uma delicadeza do meu Bem-Amado Menino Jesus.
Esqueci mais alguns detalhes da minha infância antes do meu ingresso no Carmelo. Não vos falei do meu gosto pelas estampas e pela leitura... No entanto, minha querida Madre, às belas estampas que me mostráveis, como recompensa, devo uma das mais doces alegrias e uma das mais vivas impressões que me incitavam à prática da virtude... Ficava horas esquecidas a contemplá-las. A Florzinha do Divino Prisioneiro, por exemplo, falava-me de tantas cousas, que me deixavam embevecida. Vendo o nome de Paulina escrito na parte de baixo da florzinha, queria que o de Teresa também o fosse, e oferecia-me a Jesus para ser sua florzinha...
Se não sabia brincar, gostava muito de ler, e nisso levaria minha vida. Por sorte, para me guiarem, havia anjos da terra, que para mim selecionavam livros que me distraíssem e ao mesmo tempo me alimentassem o espírito e o coração. Depois só devia aplicar certo tempo na leitura, o que me impunha grandes sacrifícios, interrompendo às vezes minha leitura no meio do trecho mais empolgante... O atrativo pela leitura durou até minha entrada para o Carmelo. Não poderia indicar o número de livros que me passaram pelas mãos. Mas, o Bom Deus nunca permitiu que lesse um só deles, capaz de me prejudicar.
Verdade é, na leitura de certas histórias de cavalaria, nem sempre apanhava desde logo o lado autêntico da vida. O Bom Deus, porém, de pronto me fazia intuir que a verdadeira glória é a que dura eternamente, não havendo, para sua consecução, necessidade de realizar obras aparatosas, mas de esconder-se e praticar a virtude, de molde a não saber a mão esquerda o que faz a direitas... Foi assim que, lendo a narração dos feitos patrióticos de heroínas francesas, mormente da Venerável JOANA D'ARC, sentia grande desejo de imitá-las. Perecia verificar em mim o mesmo ardor, de que estavam animadas, a mesma inspiração celestial.
Recebi, então, uma graça que sempre tomei como uma das maiores de minha vida, pois nessa idade não recebia, como agora, as luzes em que estou imersa. Cuidava que nascera para a glória, e como procurasse um meio de alcançá-la, o Bom Deus inspirou-me os sentimentos que acabo de descrever. Fez-me, outrossim, compreender que minha glória característica não apareceria aos olhos dos mortais, consistiria em tornar-me grande Santa!!!... Poderia tal desejo parecer temeridade, tomando-se em consideração quanto era fraca e imperfeita, e quanto ainda o sou, depois de passar sete anos em religião. Muito embora, sinto sempre a mesma audaciosa confiança de tornar-me grande Santa, pois não conto com meus méritos, por não ter nenhum, mas espero em Aquele que é a Virtude, a própria Santidade. Só Ele é que, cingindo-se aos meus débeis esforços, me elevará a Si próprio, e, cobrindo-me com seus méritos infinitos, fará de mim uma Santa. Não calculava, então, que seria preciso sofrer muito para chegar à santidade. O Bom Deus não tardou em mo demonstrar, quando enviou as provações que mais acima relatei... Agora retomarei minha exposição, desde o ponto em que a tinha largado. Três meses após minha cura, Papai levou-nos em viagem a Alençon. Era a primeira vez que para lá voltava. Bem grande foi minha alegria rever os lugares onde vivera minha infância, e de poder principalmente rezar junto à sepultura de Mamãe, pedindo-lhe que sempre me proteja...
O Bom Deus concedeu-me a graça de conhecer o mundo na medida suficientemente exata para o desprezar, e dele me conservar afastada. Poderia afirmar ter sido na minha permanência em Alençon que fiz minha primeira entrada no mundo. Em redor de mim, tudo era gozo e felicidade. Tornava-me alvo de festas, de mimos e admirações. Numa palavra, dentro de quinze dias, tive uma vida semeada só de flores... Não nego que tal vida tinha encantos para mim. Muita razão tem a Sabedoria em ponderar: "Porque a fascinação das frivolidades seduz até o espírito arredado do mal"'. Na idade de dez anos, o coração deixa-se facilmente embelezar. Por isso, considero como grande graça não ter ficado em Alençon. Os amigos que ali tínhamos eram muito dados ao mundo, sabiam aliar demais as alegrias da terra com o serviço de Deus. Não pensavam bastante na morte, e no entanto veio a morte visitar grande número de pessoas, minhas conhecidas, jovens, ricas e felizes!!! Gosto de volver em pensamento aos lugares encantados, onde elas viveram, e de perguntar a mim mesma onde estão, o que usufruem dos castelos e dos parques, donde as vi gozarem as comodidades da vida?... E vejo que debaixo do Sol tudo é vaidade e aflição de espírito. . . que o único bem consiste em amar a Deus de todo o coração e ser pobre de espírito aqui na terra...
Jesus quis, talvez, mostrar-me o mundo antes da primeira visita que estava para me fazer, a fim de que eu com mais liberdade escolhesse o caminho que lhe prometeria seguir. A época de minha Primeira Comunhão ficou gravada no coração como uma lembrança sem penumbras. Parece-me, não podia estar mais bem disposta do que estava. Além do mais, meus sofrimentos espirituais deixaram-me em sossego durante quase um ano. Queria Jesus fazer-me gozar de uma alegria tão perfeita, quanto possível neste vale de lágrimas...
Lembrai-vos, minha querida Madre, do maravilhoso livrinho que fizestes para mim, três meses antes da minha Primeira Comunhão?... Foi o que me ajudou a preparar o coração de uma maneira contínua e rápida. Pois, se desde muito já o vinha preparando, era bem necessário dar-lhe novo impulso, enchê-lo de novas flores, para que nele pudesse Jesus repousar com alegria... Praticava diariamente grande número de piedosos exercícios, que constituíam outras tantas flores. Fazia número maior ainda de jaculatórias, que escrevestes para cada dia em meu livrinho, e tais atos de amor formavam os botões das flores...
Toda semana, escrevíeis-me uma linda cartinha, que me enchia a alma de profundos pensamentos e me ajudava a praticar a virtude. Era um consolo para vossa pobre filhinha, que fazia tão grande sacrifício em se conformar com não ser, todas as tardes, preparada em vossos joelhos, como o fora sua querida Celina... No meu caso, era Maria que fazia as vezes de Paulina. Eu sentava nos joelhos dela, e nessa posição escutava com avidez o que me dizia. Parecia-me que todo o seu coração, tão grande, tão generoso, se transferia para dentro de mim. - Como guerreiros famosos ensinam aos filhos o traquejo das armas, assim também ela me falava dos combates da vida, do laurel outorgado aos vitoriosos... Maria falava-me ainda das imorredouras riquezas que são fáceis de juntar todos os dias, da infelicidade de passar ao largo, sem querer dar-se ao trabalho de estender a mão para as agarrar. Depois, mostrava-me o meio de ser santa pela fidelidade nas mínimas coisas. Deu-me o folheto "Sobre a renúncia", que eu meditava com toda a delícia ...
Oh! como era eloquente minha querida madrinha! Quisera que não fosse a única a ouvir-lhe os profundos ensinamentos. Sentia-me tão atingida, que em minha ingenuidade acreditava que os maiores pecadores teriam sido atingidos como eu, deixariam então suas riquezas caducas, e já não quereriam ganhar outras senão as provenientes do Céu... Nessa época, ninguém ainda me ensinara o modo de fazer oração, apesar da grande vontade que tinha de aprendê-lo. Como, porém, me achasse bastante piedosa, Maria só me deixava fazer minhas preces. Um dia, uma das minhas mestras da Abadia me perguntou o que fazia nos dias de folga, quando estava sozinha. Respondi-lhe que me punha atrás de minha cama num vão que ali havia, fácil para mim de fechar com o cortinado, e nesse lugar ficava a "pensar". Mas, em que pensáveis? perguntou-me. - Penso no Bom Deus, na vida... na ETERNIDADE, enfim, penso!... Muito se divertiu a boa religiosa à minha custa. Mais tarde, gostava de lembrar o tempo em que pensava, e perguntava-me se ainda me punha a pensar... Compreendo agora que, sem o saber fazia oração, e que o Bom Deus já me instruía em segredo.
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HISTÓRIA DE UMA ALMA (Santa Teresinha do Menino Jesus) COMPLETO
SpiritualALENÇON (1873 - 1877) J.M.J.T. Jesus Janeiro de 1895 História primaveril de uma Florzinha branca escrita por ela mesma e dedicada à Reverenda Madre Inês de Jesus.