Capítulo 9

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POR ALÍCIA

Olho em minha volta e prendo a respiração, estou nervosa e meu coração bate acelerado no peito, as esculturas me encaram e tento a todo custo dizer a minha mente que não há nada vivo além de mim nessa seção. Fecho os olhos e digo esse mantra em minha cabeça três vezes, respiro com calma para manter minha respiração em equilíbrio e abro os olhos.

- Ai meu Deus - Grito assustada, ao mesmo tempo que dou um passo para trás com a mão no peito.

Do outro lado minha chefe me olha com receio.

-Menina Alícia, o que está acontecendo? - Quando dona Eloise fica preocupada ou com raiva seu sotaque tende a ser mais intensivo, sorrio de leve por essa constatação e ela continua - Desde que chegou está estranha, é o seu pai?

Todas as pessoas a minha volta, sabem que o relacionamento com meu pai não é o dos melhores, então quado não estou com meu sorriso, eles já me perguntam se tem algo a ver com ele.

-Não, dona Eloise, não aconteceu nada, estou bem - Digo tentando não só convencê-la; dizem que se dissermos as coisas várias vezes ela tende a se tornar real, então, eu estou bem.

Sorrio a saio e direção ao salão principal. A cada minuto um grupo de turistas chega e nós precisamos guiá-los pelos corredores do museu, já teve gente que se perdeu do guia e foi parar do outro lado, nas seções privadas ao público.

Varro meus olhos pelo salão e vejo que tudo está em ordem, me concentro em algumas pessoas e uma me chama atenção. Um homem alto que está de costas para mim, ele analisa o quadro Arranjo em Cinza e Preto nº1 , ele é um retrato da mãe do artista, ele é simples, mais tem algo nele que encanta todos os visitantes. Me concentro no homem e sinto que o conheço e quando a ficha cai percebo de quem se trata, balanço a cabeça escondendo um sorriso e me aproximo do meu professor.

- Gosta do que vê? - O pergunto curiosa.

Ele se esquiva da minha pergunta e me pergunta o que faço por aqui.

- Trabalho aqui.

- Oh sim. Parabéns, vocês fazem um belo trabalho cuidando de tudo. - Sua voz demonstra sinceridade e me pego o agradecendo.

- Até amanhã na aula - Ele começa a se despedir.

Por alguma razão o convido para um tour pelo museu. Jean me questiona se sou uma guia de um jeito debochado.

- Algum problema? - O questiono rápido.

- Nenhum - Ele sorri abertamente e prendo a respiração, ele fica ainda mais lindo quando sorri.

-Vamos lá, professor - Soa animada, amo esse trabalho.

-Jean - Ele ergue a sobrancelha me desafiando a desafiá-lo.

-Jean - Confirmo. Ele não está em sala de aula, então posso chamá-lo pelo nome em voz alta.

Começo a guiá-lo pelo salão principal mesmo; o lado direito tem as obras acadêmicas, de grande porte, a maioria da mitologia Grega.

-Essas são lindas - Jean comenta encantado.

-É, elas são lindas e são as mais aceitadas pelo público.

Ele me interrompe logo completando minha linha de raciocínio:

- Porque o nu idealizado, os olhares contemplativos e as peles lisas e perfeitas são o que as pessoas querem ver realmente.

O olho curiosa, por essa eu não esperava.

-Bem, do lado esquerdo vemos as peças que ao longo do tempo começaram a não agradar o público, o fato de retratarem a realidade do campo foi um fator bem predominante para sair do gosto dos turistas.

Jean olha tudo com muito cuidado, analisando peça por peça.

- As obras estão expostas de acordo com cada época em que foram pintadas, temos os famosos movimentos em ordem cronológica.

O mostrei as peças mais belas e as mais tristes, e a cada introdução minha, Jean completava, e isso acontecia com as perguntas, ele as respondia com certeza e prontidão e me peguei tendo certeza que ele sabia o suficiente e até mais para ser mentor da turma avançada de artes.

Meus dias foram passando com rapidez e quando vi, já era sexta- feira, não tive nenhuma resposta de meu pai, eu liguei e Deus sabe o tanto que liguei e o tanto de recado que deixei quando o celular tocava e ninguém atendia, a maioria era de total desespero, eu quero saber se está tudo bem e não ter nenhuma resposta, está me deixando cada vez mais preocupada e apreensiva.

Não fiquei sabendo nada do corpo que caiu escada a baixo e por alguns segundos me vi sendo liberta de toda a culpa, quer dizer, se não teve corpo, se não teve jornalistas, não teve morte; então me vi imaginado-o se levantar e sair da minha casa vivo depois que sai, mas aí a realidade me bate, ele estava realmente morto e não há miníma possibilidade dele ter se levantado e ido embora.

Sophie me cutuca tirando-me do desvaneio, a olho a questionando e ela aponta com a cabeça pra frente. Imediatamente percebo do que se trata.

-Estamos esperando Alícia - Jean soa autoritário em minha direção.

Seu olhar demostra divertimento, ele sabe que eu não estava prestando atenção e quer ver até onde vou.

-Esperando o que? - Confesso minha distração.

Ouço alguns risinhos pela sala, mas mantenho meu olhar para frente.

-Eu disse que como você foi questionadora sobre a ideia da pintura livre, você poderia começar a explicar o porque da sua escolha.

Depois de sua visita no museu, as coisas se acalmaram entre a gente, eu não o questionei ao longo dos dias que se passaram e me permito dizer que Jean foi até mais simpático comigo.

-Claro, a obra que escolhi é bela e .... - Ele me interrompe.

-Aqui na frente e traga o quadro.

Ele se afasta e se encosta em sua mesa, pego meu quadro e coloco no cavalete a frente da sala. Ouço algumas exclamações de encantamento, acredito eu que daqueles que não viram minha obra antes.

Jean me olha com suavidade e eu apenas recomeço.

- Como estava dizendo esse é um belo quadro, os traços são leves e perfeitos, mas o escolhi porque além de passar beleza, ele passa tristeza. A garotinha está perdida, sem rumo e na maioria das vezes nos sentimos assim também, sem rumo e sem certeza nenhuma na vida. As vezes nos deixamos ficar no fundo e ela está lá agora, ela nos olha com lágrimas, ela tem um olhar vago procurando alguma coisa e na maioria das vezes, passamos a nossa vida inteira procurando algo para nos completar. Eu a escolhi por isso.

Termino minha explicação e antes de ir para meu lugar, o olhar de Jean me prende.

Olhando para ele, eu sei que algo acaba de mudar.

Os outros alunos foram na frente dizer o porque da escolha assim como eu, alguns porque estavam felizes, outros porque gostou do desenho e assim ia. No final da aula. Todos respiravam com calma, principalmente eu que coloquei toda minha matéria em ordem, meu final de semana seria para o que quisesse fazer.

-Bom fim de semana pessoal, vou dar as notas dessa apresentação na segunda, até lá só curtam esses dois dias, porque eu vou com certeza.

Jean soa misterioso.

- O que você vai fazer? - Pergunta um dos alunos restantes na sala.

-Eu vou viajar - Jean diz com a voz contida.

Seu olhar recai em mim e por alguma razão me sinto exposta.

Rosas De Sangue | Retorno Em BreveOnde histórias criam vida. Descubra agora