Não tenho sonhos com frequência. Por isso me assusto inconscientemente ao perceber que estou sonhando com uma luz ofuscante. Não é o tipo de luz que toma conta de todo o ambiente. Há escuridão e reconheço que a iluminação vem de algum lugar. Um ponto fixo, talvez. Mas não estou raciocinando. Quero acordar o quanto antes.
É meu celular. Um sopro de percepção me desperta.
Custo até perceber que já acordei. Olhos doem ligeiramente, as costas parecem travadas. Acabei dormindo numa posição desconfortável por muito tempo.
Meu campo de visão capta a luz oscilante do meu celular, apoiado a poltrona ao meu lado. Não sei que horas são. Não faço ideia de quem possa estar me ligando agora. Com o braço esticado, consigo recolher o aparelho. A claridade da tela faz meus olhos rejeitarem a leitura. Mas pela penumbra da foto de chamada, sei que é Madre.
– Já imagino que te acordei. Mas notícias boas não podem ficar esperando!
Ela recita cada palavra como se estivesse cantando. Não sei se é felicidade dela ou efeito da minha mente ainda chapada demais.
– Não tem problema. – Sinto um gosto horrível na boca. Ergo o corpo de uma hora a outra. Minha cabeça lateja. – O que aconteceu?
– Você consegue ficar pronta nessa meia hora? Tenho uma visita pra você.
– Do que você está falando, Madre?
– Seu computador está funcionando?
– Acho que sim. Não o ligo há algum tempo, então. Mas, Madre, eu não estou... entendendo.
– Consegui o contato da Bella. Ela está fora do estado, mas irá conversar com você por Skype.
– Madre, eu não vou... Na verdade, eu não posso me comprometer com isso.
– Fique pronta nessa meia hora. Eu não estou pedindo, é uma ordem.
Ouço Madre rir.
– É assim? Mesmo?
– Exatamente assim.
Já passa do meio dia quando finalizo a ligação.
Eu deveria agradecer por ter conseguido dormir mais de dez horas sem interrupção. Isso é, sem dúvida alguma, um fato considerável. Ainda me sinto cansada demais e fatalmente poderia voltar a dormir em poucos minutos, no entanto reúno forças pra levantar da cama e pelo menos abrir as cortinas.
Pela janela, observo o movimento da rua. Tudo no lugar que deveria estar. Eu já havia decorado a posição dos carros que paravam naquele perímetro. As placas também. Eu gosto de decorar coisas. É uma boa distração.
Há mais poças de água do que havia no dia anterior. A neve da última tempestade vem derretendo acanhadamente. Como se não quisesse ir embora.
Tento procurar alguma cor naquela paisagem. Observar apenas tons escuros e frios me traz uma vibração triste. Eu acho que odeio o frio. Minha disposição reduz a zero nessa época. Parece que não é nada razoável sair de casa em dias como esse. Como se o dia não tivesse nada a lhe oferecer além de meias molhadas e o peso de uma dúzia de peças de roupa sobre o corpo.
Minha memória me transporta pra uma lembrança recente. Ela é tão real que se eu fechar os olhos e me concentrar, consigo sentir o acalorado da areia fina abaixo dos meus pés.
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DIANTE DOS SEUS OLHOS
RomancePor quanto tempo você seria capaz de guardar um punhado de memórias? John jamais imaginava reencontrar a garota por quem foi apaixonado secretamente durante o ensino médio. Ele também não fazia a minima ideia de quem ela havia se tornado depois...