Capítulo 2 - Agridoce

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    - Vamos, Cora! Vá lavar as mãos para o chá. - a sra. Barden estimulou a pequena a sair, em seguida virou-se para Zelda - E a srta pode me seguir até a cozinha, apresentarei o resto da criadagem.

 A jovem seguiu a senhora por um sistema infindável de corredores e uma curta escada descendente até chegarem finalmente a aconchegante cozinha. Tanto as paredes e o chão quanto os utensílios usados  no preparo das refeições estavam impecavelmente limpos e um cheiro suave de cozido escapava das panelas sobre o antigo fogão de lenha.No centro do cômodo estava posicionada uma enorme mesa acompanhada por dois longos bancos, a área destinada aos criados, que nunca deveriam se misturar com os donos da casa, especialmente para comer.

 A mocinha com a qual a sra. Barden havia gritado antes estava servindo o chá. Sentado numa das extremidades da mesa um rapaz muito loiro cujas sobrancelhas e cílios eram quase brancos e o rosto  possuía um ar jovial, quase infantil e de pé segurando a cartola entre as mãos o cocheiro que a trouxera, um senhor de meia idade, cabelos grisalhos e rosto marcado pelo tempo. Todos aprumaram-se ao ouvirem o pigarrear da sra. Barden, como um general incomodado pela apatia de seus soldados.

- Esta é a srta. Zelda Hudson. Ela cuidará da educação da pequena Coraline à partir de hoje - fez uma curta pausa e voltou-se para apresentar os presentes - estes são Emma, uma das criadas da casa. O jardineiro Tom e o cocheiro Phineas, que já conheceu.

 Zelda sorriu para todos. Aparentavam serem pessoas muito bondosas. Se era verdade ela descobriria com o tempo.

 Neste instante outra empregada entrou carregando uma bandeja, provavelmente servira o chá a Coraline. Aparentava ter mais ou menos quarenta anos. Os cabelos muito encaracolados presos num coque no alto da cabeça e uma expressão severa no olhar.

- ... E esta é Muriel... - a sra. Barden finalizou.

 A mulher deu um leve sorriso azedo, como se estivesse descontente com algo, em seguida danando-se a falar:

- Alguém já foi servir o chá a lorde Peterson? Daqui a pouco ouviremos os gritos daqui!

 Todos os presentes se retesaram ou viraram o rosto, fingindo não terem ouvido.

- Eu já levei o chá ontem! - Emma retrucou, ousada. - Agora é sua vez, Muriel!

- Mas eu já servi o almoço de hoje! - a  mais jovem replicou, com igual ousadia.

- Parem já as duas de brigar! Parecem crianças! Ou se resolvem como adultas ou ponho as duas agora mesmo no olho da rua! - a sra. Barden apartou, ameaçadora.

 As duas empregadas empertigaram-se, silenciosas. Apesar da demonstração óbvia de submissão à mais velha nem Emma ou Muriel fizeram menção de aceitar a tarefa de levar o chá ao senhor da casa. 

 Zelda viu nessa estranha recusa dos empregados em completarem suas funções uma ótima alternativa para dialogar com o novo patrão. Sendo assim dirigiu-se decidida a sr. Barden:

- Eu levarei!

 Todos a olharam com estranheza, como se ela tivesse acabado de emitir uma profanação tamanha no meio na igreja, numa missa de domingo.

- Querida... - a velha mulher começou - tem certeza? Além deste não ser seu trabalho, você apenas acabou de chegar e...

- Sra. Barden - Zelda apressou-se em cortar a mulher - não há incômodo algum nisso, pelo contrário. Eu já havia expressado a senhora a vontade de ter com o senhor da casa. Sinto que seja o momento certo.

- É louca a pobre menina! - Muriel soltou - Certamente nunca nem ouviu falar sobre nosso "amável" senhor!

- Já mandei que se calasse, Muriel! - a sra. Barden foi bem séria agora - Se tem alguma reclamação a fazer sobre seu trabalho esta é a hora pertinente. Enviarei logo pela manhã uma carta à cidade requisitando outra para seu lugar!

A Megera (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora