Julia

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 Na posição em que o livro estava, era possível que a câmera fizesse uma gravação de todos os cantos da sala. Comecei a procurar desesperadamente pelo cartão de memória, mas o espaço de armazenamento estava vazio. Joguei o aparelho no chão e ele quebrou em centenas de pedaços.

Deitei na bagunça de livros que eu havia jogado no chão e ali mesmo dormi enquanto rezava para aquela câmera não ter filmado nada do que ocorrerá naquele dia.

1 mês depois

 "Estou tentando mudar a minha vida."

"Estou largando a bebida "

" Não tomo mais remédios para dormir. "

Essas foram as mentiras que contei durante o último mês. Depois de tudo o que aconteceu, eu realmente tentei mudar. Por uma semana inteira, não ingeri um gole de qualquer bebida alcoólica, limpei meu quintal e vasculhei toda a minha casa atrás de mais câmeras, encontrei outra escondida em meu quarto, no canto superior do guarda-roupas, onde poderia filmar todos os cantos do quarto. Novamente procurei por algum cartão de memória e não achei nada. Senti repulsa e vomitei quando a achei, alguém estava me vendo dormir e pior alguém me filmou tendo relações com outros homens.

Sai de mais uma consulta com meu psicólogo. Tenho duas reuniões por semana, as terças e sextas, das 13:30 as 14:30, fico jogando minha falsa mudança de vida e ele acredita, ou quer acreditar. Meu chefe achou isto excelente, já que sou uma das poucas repórteres que não tem medo de dizer a verdade e fazer as perguntas certas nas ocasiões mais inoportunas possíveis. Ele diz que é porque não tenho medo do que posso perder, mas a realidade é que não mais nada, então, o que mais pode acontecer?

Guilherme está parado na porta do consultório me esperando. Não o via a mais de uma semana, o que é muito raro, pois ele é meu melhor amigo desde que eu tinha meus 6 anos e nunca ficávamos mais de 2 dias sem ao menos uma ligação.

- Oi sumido.

Dou um leve soco em seu braço e ele sorri. Ele não é bem um homem bonito, mas devo admitir que seu sorriso, com esses dentes perfeitos, é maravilhoso. Ele tem os cabelos e os olhos pretos, sua pele é tão branca quanto a de Alice, mas definitivamente, muito mais alto que eu, com seus 1,80 metros de altura, fico parecendo uma formiga ao seu lado.

- Desculpe, estava com um projeto muito grande nas mãos. Acabei perdendo a noção do tempo.

- Tudo bem. – Falo enquanto dou um sorriso e chuto uma pedra em sua direção.

Sabe aquele casal de escola, em que duas melhores amigas, namoram dois melhores amigos e continuam juntos o resto da vida? Bom, esse casal de filme, eram nossos pais. Eram completamente unidos, viajavam juntos, faziam compras juntos e até trocavam o carro juntos. Eles eram os amigos perfeitos, mas tudo isso mudou, quando em uma noite chuvosa, o carro em que os pais de Guilherme estavam, caiu de uma ribanceira, explodindo logo em seguida. Por sorte Guilherme havia ficado com meus pais naquela noite. Ele então tornou-se o garoto órfão, uma herança enorme foi deixada em seu nome, já que seu pai era dono de uma das melhores empresas de arquitetura do pais. Meus pais o adotaram e seu tio cuidou de toda a sua fortuna, até ele terminar a faculdade. Gostaria de dizer que ele nunca roubou nada do meu amigo, mas não acredito muito em sua falsa bondade. Alice que tem a mesma idade, nunca gostou muito dele, o que tornou nossa convivência um pouco instável.

- Alice viajou. Então irei levar você para casa.

- Ela vai ficar muito tempo fora?

- Quem dera. Ela volta amanhã. Quer comer alguma coisa?

- Não, só quero ir para a minha casa.

- Então vamos.

- Vai me seguir com seu carro?

Ele enruga a testa, formando um charmoso V.

- Não, vamos no seu.

- Gui, você deve te uns 4 carros na sua garagem. Então, por que diabos, quer andar no meu?

- Não verdade, são 5 porque comprei um novo ontem - Viro os olhos e bufo. Ele não é o tipo "rico mesquinho", mas adora contar vantagem - Meu motorista vai me seguir e depois que a mocinha estiver na segurança do seu lar. Vou embora - Ele levanta as mãos em sinal de rendição - Eu só quero ficar com você e conversar.

Entramos no meu carro, que estava do outro lado da rua. Tentei puxar alguns assuntos aleatórios, mas nada que fizesse a conversa evoluir. Sei que ele está me inspecionando, pois sabe que estou escondendo algo dele. Ele se tornara meu confidente após a morte de minha mãe. Encontrei nele um irmão, um substituto que ocupou o vazio deixado por ela. Entro com o carro na garagem de casa, ele sai pelo portão e dá-me um beijo na testa ao se despedir.

- Não vou poder ficar por muito tempo dessa vez. Só queria ter certeza de que não mataria algum velhinho na rua.

- Sou uma boa motorista.

Dou um leve soco em seu braço e ele finge sentir dor.

- O cachorro daquela nossa antiga vizinha, não pode dizer o mesmo - Cachorro desprezível, latia a noite inteira na minha janela - Fala a verdade, você fez aquilo de propósito?

- Não.

"Sim, eu odiava aquele cachorro". Ouço uma voz cochichando em meu ouvido, olho rapidamente para o lado, mas não tem ninguém.

- Está tudo bem?

P.S.: Conheço seu crimeOnde histórias criam vida. Descubra agora