Enry Iggins

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O Professor Doutor Genilson, estava atordoado quando saiu da Faculdade de Física em direção ao seu carro, ou pelo menos foi isso que os estudantes que o estavam observando acharam. Um estudante de bermuda cáqui cochichou para a garota ao seu lado que talvez o Professor Genilson houvesse bebido. Não seria a primeira vez que um professor universitário apareceria de ressaca no ambiente de trabalho.

Ligou o carro e pôde ver no painel digital o horário e a data. Eram 9h15 da manhã do dia 3 de março de 2189. Encostou a palma da sua mão no painel e suspirou. Depois de ter digitado as coordenadas do trajeto no painel, encostou-se ao confortável banco de coro, enquanto o carro deslizava para fora da universidade.

O carro estacionou no 39º andar e o professor pôde descer do carro em segurança para o seu apartamento situado no mesmo andar.

Inseriu o cartão magnético, fazendo com que a porta deslizasse para o lado e assim entrou no apartamento. Era um apartamento pequeno, com o salário dele não poderia se dar ao luxo de bancar um apartamento maior, porém, como morava sozinho, pouco se importava com isso.

Aproximou-se da janela, o número de edifícios eram tão grandes que impossibilitavam a vista para o Rio Guamá. O barulho de duas pequenas rodas pôde ser ouvido e um pequeno robô apareceu para lhe entregar um copo d'água.

- Era justamente o que eu precisava - disse o professor ao segurar o copo e começar a bebericar.

200 anos era um bom tempo. Nem Genilson, nem os amigos e talvez nem os filhos dos filhos dele iriam estar vivos daqui a 200 anos, mas seria muito egoísmo pensar apenas dessa forma. Quantos milhões de pessoas não iriam mais ter a chance de acordar todas as manhãs? E se a vida existisse somente nesse planeta, e mais em nenhum outro. Ou se não existir nenhuma alma ou nenhum espírito imortal, então tudo aquilo que a humanidade conquistou será destruída em questões de segundos.

Terminou de beber a água e iria entregar o copo ao seu pequeno robô, mas não antes sem olhar o próprio reflexo no copo. O rosto cansado logo de manhã cedo. Genilson era careca, barba por fazer, usava óculos de aro, estilo aviador, como a moda é uma coisa que não existe, esse costume tinha voltado mais uma vez. Ele deu pequenos tapas no rosto para tentar se recompor.

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Genilson programou o carro para dirigir-se novamente à Faculdade de Física, por um caminho um tanto mais longo, pois iria fazer uma parada na casa da sua única amiga. Na metade do percurso para a casa dela, viu o holograma de mais de seis metros de altura do atual presidente. O rosto do presidente levantado para cima, junto com o braço direito, como se quisesse alcançar aos céus. No pé da imagem, havia os seguintes dizeres: ESTOU MUITO À FRENTE DO MEU TEMPO...

- Ou muito atrás - completou Genilson, em um tom de desprezo.

Quando se deu conta, Genilson havia chegado à porta da casa de Dhullyia. Era uma das pouquíssimas casas espalhadas por Belém e ficava imprensada - como ela costumava dizer - entre prédios colossais. Ela tinha acabado de abrir a porta no momento em que ele chegou, usava um vestido cinza colado ao corpo, uma leve maquiagem e os cabelos louros amarrados. Como se nós fossemos a um encontro, pensou Genilson. Ele tocou no painel e a porta do carro abriu-se automaticamente para Dhullyia entrar.

Mal tinha acabado de se sentar no banco e o carro voou novamente em rumo à Faculdade de Física. Fora o cumprimento que deram no carro, Genilson não pronunciou nenhuma palavra até chegarem ao local.

- Eu preciso te mostrar isso - ele disse, com uma fita cassete na mão. - São gravações do Tesla Power, aquele experimento que nós estávamos trabalhando. Ainda não falei isso para ninguém. Pode ser bobagem, mas queria contar a alguma pessoa próxima de mim. Agora, veja.

- Muito bonito. O que é isso? - perguntou Dhullyia. A imagem exibida pelo televisor de iOLED mostrava um cenário com pequenos arbustos. Uma extensão por quilômetros apenas de folhas verdes.

- É a Terra - respondeu Genilson.

- De que ano? Nós não temos mais locais assim na Terra. Aposto que é do ano de 2000.

- Aí que você se engana. A imagem é do futuro. Por alguma razão, não conseguimos visualizar o passado, apenas o futuro com o TP. Eu calculo que ainda tenhamos duzentos anos pela frente, ou menos.

- Está dizendo que essa imagem mostra uma Terra recuperada de uma possível catástrofe? Por isso, podemos ver as árvores? E se for um paradoxo?

- As análises mostram que não é um paradoxo - ele respondeu. - E na verdade a catástrofe é real. Tenho outras gravações que mostram isso. Você não deve vê-las. São horríveis. Mas sei que haverá uma destruição. E essa hecatombe só poderá ser provocada por nós mesmos, com as nossas guerras. Então, eu pensei: e se nós mandássemos uma mensagem? Se enviássemos junto com as imagens seria melhor! Nós podemos mandar uma mensagem para a Humanidade daqui a alguns anos para, seja lá quem for o responsável por isso, possa ser impedido. Ao menos temos que tentar. Você vai dizer que não?

- Você não é Gandhi, nem Jesus Cristo. Não podemos salvar a nós mesmo. Só quem tem esse poder é Deus, se é que Ele existe - respondeu Dhullyia.

- Ah, você vai desistir sem ao menos tentar?

- Não é essa a questão - Dhullyia tentou dizer, sem ferir os sentimentos de Genilson. - O planeta Terra existiu sem os humanos antes, e continuará a existir quando nossa espécie se for. A Inglaterra irá sobreviver sem você, Enry Iggins. Por que tentar salvar o insalvável? Não está em nossas mãos!

- Por que eu falei isso para você mesmo? - rosnou Genilson. - Eu vou tentar salvar a Humanidade.

- Você não vai conseguir, e ainda vai ficar louco. Espere para ver, Enry Iggins, espere para ver.

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Dhullyia não tinha notícias de Genilson em meses.

- Ele deve ter viajado pelo tempo - Dhullyia pensou com seus botões.

De repente, ocorreu a ideia de ligar para a Faculdade de Física e saber por onde Genilson andava. Espantou-se quando a secretária disse que o Professor Doutor falecera. Uma nota fora enviada a fim de comunicar todos os membros da instituição. A secretária a informou que Genilson, possivelmente, cometera suicídio. Ela também disse a Dhullyia que fora encontrado um bilhete no bolso da calça com os dizeres: Eu consegui.


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