Samanta possuía um olhar penetrante, daqueles indecifráveis, que poderiam sugerir um milhão de coisas ao mesmo tempo. Seu sorriso, quase sempre estampado em seu rosto, mas de um modo frequentemente sarcástico, quando aberto, estampava suas covinhas na bochecha de imediato, e estas, eram cobertas de sardinhas que encobriram as maçãs de seu rosto até as laterais de seu nariz.
Mabel, era quase uma cópia fiel da aparência de sua irmã, com exceção de seus cabelos que eram mais dourados do que ruivos. Não era muito difícil identificar mulheres na família de Aurora Maia, pois, todas elas, eram detentoras do mesmo sorriso inconfundível, em um rosto marcado por sardas.
Ao entrarem a passos cautelosos, prendendo a respiração, no quartinho proibido da casa, Samanta se deu conta de que com a lanterna que carregava naquela noite, era possível identificar alguns quadros pendurados nas paredes. Estes emolduravam imagens de diferentes mulheres, muito parecidas com ela.
- Já parou para pensar em como esse quarto é misterioso? - Mabel interrompeu o silêncio absoluto que se formava, enquanto vasculhava pequenas caixinhas vazias empilhadas sobre as prateleiras empoeiradas.
- Já. - Samanta respondeu, secamente.
- Não quer conversar? - Mabel perguntou, distraída.
- Se fizermos muito barulho, e alguém nos ouvir, estamos muito ferradas. - Samanta parou de contemplar os arredores com a lanterna, para fixar seu olhar em Mabel. - O papai não deixa ninguém entrar aqui dentro, nem mesmo Glorinha. Me surpreendo que ele ainda assim, deixe a porta aberta.
- Não há nada demais dentro desse quartinho imundo. Não entendo por que ele sempre nos proibiu de entrar. - Mabel sussurrava, evitando encarar Samanta, que parecia impaciente com o diálogo.
- Sempre pensei que fosse para preservar a memória da mamãe, e por respeito a ela... Não sei. - Samanta encostou-se na parede, frustrada ao pensar na possibilidade de não haver de fato mais nada de surpreendente ali dentro. Mas por que a mãe deixou aquele estranho bilhete?
- Olhe só, tem um álbum aqui, muito velho por sinal. - Mabel dava batidinhas no álbum de fotografias que encontrava-se em cima da escrivaninha, e usou o espanador. Uma nuvem de poeira pairou sobre o lugar, de modo instantâneo.
- Não deve ter nada interessante aí dentro, só fotos muito velhas.
- Devem render boas risadas. Me dê a lanterna.
Samanta entregou a lanterna para Mabel, que parecia empolgada com a possibilidade de ver fotos antigas, onde todos deveriam trajar roupas engraçadas, como vestidos longos e antiquados, por exemplo. Algo que ela aprendera a detestar, já que a moda do momento eram calças jeans de cintura alta.
- Samanta... Olhe só. - Mabel apertou o braço de sua irmã de modo abrupto. - A mamãe e uma porção de outras mulheres, idênticas à nós.
Samanta aproximou-se da fotografia, que revelava sua mãe, em um longo vestido com botões, ao seu lado esquerdo e direito, havia mulheres, quatro delas, especificamente, com rostos sardentos e vestidos semelhantes. Samanta percebeu, logo em seguida, que no pescoço de cada uma delas, estava pendurado um cordão, que carregava uma chave como pingente.
- São chaves, olha... - Samanta apontou para o pescoço de cada uma. - O bilhete.
- A chave está na saída. - Mabel esbugalhou os olhos instantaneamente.
Samanta posicionou a lanterna acima da fotografia, para prestar atenção em cada detalhe. A fotografia era muito antiga, quando, provavelmente, sua mãe deveria ter a sua idade. Havia cinco mulheres ao todo, e todas elas, muito iguais, com seus cordões que ostentavam uma chave de tamanho médio. Elas pareciam estar em uma fazenda, pela quantidade de árvores que as rodeavam, e também algumas cercas. No verso da fotografia, estava escrito em letras cursivas.
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A última linhagem
Mystery / ThrillerA família Dante Maia esconde um grande segredo. Não é novidade alguma para qualquer morador da minúscula e pacata cidade de Clareira de Misé, onde os ventos têm ouvidos e, onde há não muito tempo atrás, uma famosa curandeira - ou bruxa, como todos p...