CAPÍTULO SEIS

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ANNE

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ANNE

Eu não conseguia dormir em hipótese alguma, apesar de forçar meus olhos a se fecharem e tentar fazer o corpo relaxar, algo insistia em incomodar meus pensamentos.

Eu estava coberta e ainda assim sentia frio, meus dentes batiam com força uns nos outros e comecei a sentir dores no maxilar.

A todo instante algo ou alguém sussurrava em meus pensamentos, uma voz melodiosa e sedutora pronunciava meu nome e me chamava de forma tentadora. Eu o ouvia me chamar para a floresta, e de repente meu corpo todo estava quente. Eu realmente queria ir até lá.

Passei a torcer as mãos mesmo com os olhos fechados, um arrepio percorria a minha espinha e fazia os pelos do meu corpo se eriçarem, e não era de um jeito ruim.

Apertei as mãos nos ouvidos e tentei mudar o rumo de meus pensamentos, eu cantarolava baixinho uma canção qualquer enquanto continuava a ouvir sussurros.

Engoli em seco quando senti minhas bochechas molhadas. Por que justo eu? Por que aquelas coisas estavam acontecendo comigo? Eu sempre havia sido uma boa menina.

Enrolei-me nos lençóis e chorei mais um pouco, eu me sentia sozinha e vulnerável, tudo aquilo estava mexendo com a minha cabeça. Em menos de um dia fui violentada pelo homem que jurou cuidar de mim como um pai, e agora estava sendo atormentada por pensamentos e sons que não podia compreender.

Eu não sabia o que pensar, vovó não me falava o que estava acontecendo, seu olhar se tornava vazio sempre que lhe pedia explicações. Vez ou outra ela aparecia à porta do quarto para certificar-se de que eu ainda estava lá, então eu me apressava em apertar os olhos e prender a respiração, até ouvir o som de passos do lado de fora.

Eu não poderia esperar mais, eu precisava entender o que estava acontecendo.

Em um pulo me levantei da cama, ainda não podia fazer barulho, mas eu precisava ir até a floresta, precisava ver o que estava escondido entre as árvores e que me interessava tanto, e principalmente eu precisava saber a origem da voz que continuava me chamando. Sim, eu precisava ir até lá, era mais forte do que tudo que me dizia para ficar.

Demoraria até que vovó voltasse ao quarto de novo, talvez nem sequer voltasse. Eu já estava dormindo, afinal.

Sem pensar duas vezes afastei as tábuas que cobriam uma pequena janela, tomando cuidado para não fazer nenhum barulho, levantei a saia do vestido folgado que pertencera à mamãe, fechei os olhos e então eu pulei.

A luz da lua me guiava em meio à escuridão, enquanto um vento gélido me causava arrepios ainda maiores, mas isso não foi o suficiente para me fazer parar.

Comecei a andar sem rumo ao certo, apenas segui a voz que me orientava de forma sutil e doce.

Entre as árvores todo barulho era ensurdecedor, e me peguei várias vezes pensando em como eu fui capaz de entrar ali sozinha de novo. Talvez eu fosse muito burra.

Cheguei em uma colina com algumas árvores em volta, a voz que enchia meus pensamentos de repente se calou e fiquei perdida. Por que eu estava ali? Qual era o propósito de tudo aquilo? Eu queria respostas para cada uma de minhas perguntas.

Acordando de um certo transe, apertei os braços em torno do meu corpo. O que eu estava fazendo ali sozinha no meio do nada? Eu precisava correr, correr muito, afinal eu ainda podia fazer isso. Girei sobre os calcanhares prestes a disparar de volta à casa da vovó, quando uma sombra enorme e um rosnado grave surgiram atrás de mim.

Engoli em seco, minhas mãos começaram a suar e meu corpo tremeu. Meu coração bateu em uma velocidade absurda ao imaginar que eu estava à sua mercê de novo.

Não tive coragem de encarar minha morte certa, apenas rezei baixinho para que Deus tivesse piedade de minha alma, e que mamãe e vovó conseguissem seguir suas vidas sem mim.

Eu apertava os olhos tão forte que podia jurar que sairiam de órbita. Um uivo alto e ameaçador me fez abri-los em um pulo. Enquanto suas patas agarraram minha cintura, a criatura me fez encará-la.

Seus caninos enormes estavam expostos, mas ele não parecia com raiva. Seus olhos faiscavam entre o laranja do pôr do sol, e um castanho profundo. Por Deus! Eles me pareciam um tanto familiares.

Ele abriu a boca e o hálito quente em contato com minha pele me traziam sensações desconhecidas. Por incrível que pareça, eu já não sentia mais medo. Seu focinho e sua língua passearam por meu corpo, reconhecendo meu cheiro, marcando território. Ele sabia quem eu era, e não me faria mal algum.

De repente, a necessidade de tocá-lo queimava a minha pele, eu precisava passar meus dedos ali, desfazer os nós em seus pelos. Era ele.

Passei a ouvir um zumbido baixinho e não pude decifrar de onde ele vinha, se do seu peito ou do meu. O alaranjado em seus olhos começou a se esvair, dando lugar a  pequenas íris castanhas brilhantes.

Ele me levara até ali, ele me fez fugir de casa e entrar floresta adentro. Era o responsável pelos meus sonhos, era a voz na minha cabeça. O lobo era a minha maldição.

Meu corpo foi jogado contra a árvore, mas eu continuei me aproximando, eu precisava tocá-lo. Ele se contorceu, mas eu não recuei, ali era o meu lugar. Suas patas foram diminuindo, e seu corpo perdendo massa. O lobo uivava e grunhia, ele foi perdendo o focinho, as orelhas grandes, e os dentes afiados. Logo ele estava de quatro, com a metade do tamanho. Não tinha mais tantos pelos, e nada além disso cobria seu corpo desnudo.

Tropeçando nos próprios pés, ele se levantou. Senti meu rosto queimar, e partes inconvenientes do meu corpo também. Ele estava bem ali na minha frente, a boca entreaberta e os punhos cerrados, seus cabelos negros caíam sobre os olhos e senti o forte impulso de secar sua testa com o dorso da minha mão. O lobo agora era humano e absolutamente nada me provaria o contrário. Humano em todo o sentido da palavra, sem tirar ou pôr coisa alguma, e era o humano mais bonito que eu já tinha visto em toda a minha vida.

Ele me estendeu a mão e sem piscar eu a recebi. A partir daquele momento ele era meu, e eu era dele. Completamente sua.

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Chapeuzinho Vermelho - [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora