The real Justin

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Justin

Hoje fazem exatamente 10 anos que as coisas começaram a mudar e sair para fora dos trilhos pra nunca mais voltar.
10 anos que Jeremy saiu de casa, 10 anos que minha mãe deixou de ser a mulher feliz e otimista de sempre (agora ela só finge ser), 6 anos desde que eu não consigo me virar sozinho sem uma bengala ou alguém para me auxiliar. Mas se você quer mesmo saber, eu já não exergo o mundo normalmente a muito mais tempo que isso.

Antes de qualquer coisa, não é vitmismo. Não gosto quando pessoas sentem pena de mim. Na verdade, eu não gosto de pessoas. Eu também não gosto de falsas esperanças, mas desde que conheci o Dr. Winston eu sinto que é só o que ele me dá, além de várias lições de moral, cujas eu não preciso.
Mas vamos lá, quando você é cego, você aprende uma coisa ou outra sobre confiança. Aprende em quem confiar; Aprende no que confiar; E o mais importante de todas essas coisas, aprende a confiar em si mesmo. Na minha cabeça, era só nisso que eu podia confiar porque desde que todos os tratamentos que eu e aquele velho careca tentamos, sem resposta positiva a nenhum deles, frustações se tornaram bem frequentes na minha vida e digamos que eu não lido muito bem com elas.

Desde que acordei quase no completo escuro, naquela cama de hospital depois do acidente, que aconteceu graças a um bêbado idiota; desde aquele dia minha mãe se culpava e ficava cada vez mais difícil manter as esperanças de que um dia eu ia voltar a enxergar. Eu lutava no início, tinha a ver com não me conformar com o fato de não ver o mundo mais da mesma forma, só que depois de tantos anos você acaba deixando que essa força se esvaia. Eu não aguentava mais, então acabei me tornando só um garoto hipócrita que era cheio de conselhos inteligentes que ouvia em canções ou lia em livros, mas não seguia nenhum deles.

Graças a esse acontecimento eu também acabei adquirindo uma ansiedade fodida e logo depois da ansiedade, graças aos medicamentos, me veio a depressão. Eu já não conseguia lutar por minha mãe, a velha Pattie, eu estava ocupado demais tentando me tirar de um buraco intinito, sem recurso algum, parecia que o Justin pendurado ali, naquele buraco escuro, se segurava com uma mão só; não dava pra ir a lugar nenhum. Se eu soltasse eu ia cair e ninguém ia me pegar. Meu olhar se tornou vazio, e não era a falta de visão, era a falta de perspectiva. Eu acabei sem perspectiva de vida, sem um propósito. O ódio, a frustração me movia todos os dias, e eu já não via prazer em absolutamente nada, nem mesmo em ouvir meu álbum predileto, tocar minha canção favorita no violão, ou no piano, jantar junto a minha mãe na casa alugada que moravamos; nada me devolvia o espírito de luta que eu costumava ter.
Foi então que um milagre me fez repensar o que estava fazendo de errado.

Era um domingo, e eu estava no que pra mim naquele momento era o último lugar no mundo em que gostaria de estar: uma igreja. Minha mãe gostava de procurar conforto ali durante os tempos ruins que vivíamos. Vinha de uma família religiosa, mesmo que eu passasse boa parte do meu tempo questionando o porquê do mundo estar uma bosta, já que Deus era tão bom como diziam; mas isso não vêm ao caso. Naquele domingo tinha algo diferente. Algo soava diferente.
No altar da igreja um grupo de jovens, que não fazia parte daquela comunidade, cantava uma música popular, era Man in the Mirror, do Michael Jackson. Aquilo era novo e eu me sentia instigado a saber exatamente o que acontecia ali. Quando o culto finalmente acabou eu descobri que os jovens eram alunos de uma academia de artes e estavam ali voluntariamente. Sabendo que se tratava da Cypher eu tentei me obrigar a tirar aquele desejo de fazer parte de algo, daquilo, da cabeça. Era um desejo caro e onde já se viu? O garoto que veio do subúrbio, o deficiente visual que vive com a mãe e tem dificuldade para pagar o aluguel de onde mora, querendo estudar numa instituição particular de artes. Eu tinha acabado de fazer 16 anos quando aquilo aconteceu, mas o destino adora nos pregar peças; gostava de pensar que eu era uma das maiores provas daquilo.

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