Capítulo 1

31 0 0
                                    

Uma brisa amarga soprava a margem direita do rio Guamá. Electrum, misturado a concreto e um feitiço de proteção, firmemente moldados e estruturados, camuflavam a "nada" magnificente construção atrás de nós. Não tão bela, mas também não tão desajeitada ao ponto de deixar de lado as normas estruturais propostas em Alicante.

O instituto do Presépio.

Minha casa é relativamente nova se comparada a outros institutos – principalmente aos da Europa e da Ásia.

Na verdade, meu Instituto é um emaranhado de cômodos e Túneis subterrâneas que ligam a Fortaleza à Casa das Onze Janelas - um labirinto de argila, ferro e salas secretas -, e a outras descendências coloniais da cidade de Belém do Pará.

Temos de aguentar os turistas perambulando por nosso quintal até altas horas da noite, e ainda vigiar a movimentação - tanto na cidade quanto nas imediações do rio. Uma aquarela de bandeirinhas juninas preenchia grande parte do Forte do Presépio, algumas trazidas pelo vento, outras amarradas sorrateiramente por turistas arruaceiros. A cidade estava na temporada do festejo Católico, muita música, ruas abarrotadas de pessoas e principalmente: muita comida.

Às vezes imagino o quanto os mundanos são reclamões. Reclamam de suas vidas pacatas e afastadas dos problemas do submundo demoníaco. Nada de treinamentos pela manhã; de técnicas com arco e flecha; de lições de, como empunhar ou não uma espada. Que se falhar não terá uma segunda chance - além da morte.

E o mais importante: eles não são obrigados a participar das reuniões longas e cansativas com a comunidade mágica do Baixo Guarani - apenas suas vidas passageiras e sem nenhuma aventura, na segurança de suas casas. Uma grande merda, em minha opinião.

Rudá, o alto feiticeiro da cidade, mantinha um diálogo nada prazeroso com a diretora. Claramente aborrecido, ele "apenas" concordava meneando a cabeça - com falsa obediência e claro.

Como todo feiticeiro, ele também carrega suas marcas de nascença. Rudá "peculiarmente" nasceu com manchas de jaguares espalhadas por todo o corpo, principalmente no rosto. Que mais se assemelham a tatuagens mal acabadas.

Os pigmentos, meio amarelo-terra – que sempre me fizeram viajar pelas savanas Africanas e o extremo verde dentro do coração da Amazônia -, nem sempre são escondidas pelo bruxo, às vezes ele desfile com os tribais a mostra, quase sempre sendo convidado a posar de modelo pelos turistas – o homem felino.

Finalmente, ao que pareceu, todos as regras foram impostas por minha mãe, Maria do Nazaré Mattinus, atual diretora do instituto. Um saco. Ela balançava uma estela na frente de Rudá, praticamente esfregando o instrumento em seu nariz. Os dois vieram em minha direção ainda, pelo que pude ouvir, debatendo se era realmente necessário eu ir junto ou não.

Esta, seria a terceira vez em que eu e Rudá viajávamos em busca de respostas, as outras duas "expedições" não obtiveram um resultado satisfatório segundo a "Senhora Diretora" – uma longa história com dois caciques indígenas. E quem sabe este novo informante, talvez, trouxesse as respostas que nós buscávamos; quem sabe ele me ajudasse com meu "pequeno probleminha" - nada discreto.

Minha mãe não queria envolver a Conclave neste assunto. Nossa família, a "Jovem Mattinus", é talvez a última dentre as famílias dos caçadores das sombras. Nazaré Mattinus gosta que todo o seu parentesco se mantenha debaixo das suas asas, nas palavras dela: "uma família unidade se protege melhor".

- Vamos? – Rudá tocou meu ombro. Senti o suor quente mesmo por cima da jaqueta. A diretora Nazaré às vezes pode ser um tanto... persuasiva, se necessário.

Sangue Mesclado - Um Toque a MaisOnde histórias criam vida. Descubra agora