Capítulo 4

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- Para trás! - Alexander Lightwood ameaçou tateando uma flecha na aljava. Magnus segurou o arco do seu parceiro, mas o caçador ainda manteve a mão sobre a arma, em caso de necessidade.

O movimento não passou despercebido por Eithur, que apertou as lâminas nas mãos - duas na direita e uma na outra. Rudá o observava com ar preocupado, quando o amigo saia do controle era muito difícil para ele recuperar a calma. Tentou se aproximar, mas um olhar cortando foi o suficiente para mantê-lo distante.

- Abaixe as espadas. - Isabelle Lightwood disse categoricamente. - Não vou avisar uma segunda vez. - concluiu sacudindo o chicote pronto ao açoite.

- Eithur?... - Rudá tentou.

- Cala a boca!! - o amigo rosnou. Os malditos Lightwoods. Sempre os Lightwoods, Eithur pensou. Eles estavam metidos em tudo. Eles incitaram a guerra, a matança, e tudo por um único Nefilim, que agora o mirava de cima da escadaria despreocupadamente, como se o mundo não chegasse aos seus pés. Todas as mortes estavam nas mãos deles. Eles nunca foram julgados, nunca receberam uma sentença apropriada.. "Dura Lex, Sed Lex" uma ova. As leis só funcionavam para as famílias menos conhecidas, as que não possuíam um pedestal renomado por bravura e mérito. Hipócritas, todos eles eram uns hipócritas.

Eithur estava perdendo o controle novamente. Suas costas ardiam como o inferno, as omoplatas pareciam estar sendo retorcidas.

- Último aviso - Isabelle o encarou. Ela não cederia, ela nunca cedia, e Eithur estava longe do seu normal para arredar um único passo. "Fora do seu território, longe de casa." Tudo que ele queria era sair daquele lugar, da presença daquelas pessoas. Estava... enojado..

- Rudá vamos embora. - ele ordenou, com a voz fria. No fundo sabia que o feiticeiro não acataria sua ordem, mas concedeu-lhe uma escolha. Caso Rudá não atendesse, ainda lhe restava uma última carta na manga, apesar de ser muito perigosa, mas ainda assim uma carta.

- Eithur, tente se acalmar. Você sabe por que nós estamos aqui. Eles sabem como lhe ajudar. - Rudá tentou negociar, chegando uma passo. Rogando pela sensatez do amigo, que continuava com os olhos vidrados em seus anfitriões, apunhalando mentalmente um de cada vez, pelas costas, de preferência.

- Eu não quero a ajuda desses... - ele procurou a palavra mais suja e obscena em seu vocabulário, mas nada do que dissesse corresponderia à dimensão do ódio que sentia por aquela gente.

Clary Fairchild desceu as escadas trotando, deixando o namorado com um ar brincalhão na boca, algo entre um meio sorriso e um deboche.

O Herondale permaneceu quieto, assistindo o espetáculo no seu lugar privilegiado, ele apostaria sua melhor lâmina que Izzy derrubaria aquele garoto com apenas um movimento. Há dias ele esperava por um pouco de ação, as coisas estavam um tanto calmas para o seu gosto. A guerra terminara em menos de um ano, a ressaca arrastava-se debilmente com o passar dos dias. Uma Chatice total.

- Oi? - Clary pôs-se entre Eithur e Izzy. Um esboço de solidariedade abrolhou no semblante jovial. De início não captou o que estava acontecendo exatamente, mas não custava nada tentar ajudar. Um sentimento ruim camuflava-se no garoto, ela já havia passado por situações muito piores para saber quando alguém precisava de ajuda, mas não se permitia ser ajudado. É a lógica dos Caçadores das Sombras, são praticamente forçadas a ser ajudados. - Eu sou...

- Eu sei quem você é. Não fale comigo. Não tenho o mínimo interesse em lhe conhecer. Não quero nada que venha de vocês. - Eithur a cortou, como um vulcão entrando em erupção destruindo os planaltos abaixo. A última gota de sua paciência se esgotara. - Vocês causaram todo esse inferno no mundo. Você - ele apontou uma das lâminas para Clary - libertou o próprio diabo na terra.

Clary afastou-se para o lado de Izzy. Do que aquele garoto estava falando? O que exatamente ele sabia? Ela sentia o ódio que emanava dele, uma fúria insaciável.

Jace desceu um degrau, o tom usado por Eithur estava errado, beirava a cordialidade e a demência ao mesmo tempo.

- Olha, eu não sei o que lhe contaram, ou qual história... - Clary arriscou, mas a parede foi erguida na sua frente novamente.

- Eu já disse!!! Não fale comigo. Eu não quero ouvir outra mentira dos Lightwoods. - voltou-se para seu feiticeiro. - Rudá, porque você ainda não abriu o portal?

Outro degrau.

- Se você puder me ouvir, nós sabemos da sua situação...

- Qual é o seu problema? - disse Eithur ironicamente franzindo a testa. Como se Clary fosse um dos muitos insetos no Arsenal. - Me faça um favor, - ele sussurrou - volta para o seu amante. Afinal - olhou para os demais na sala, e depois para Jace -, vocês sacrificaram tanto por ele.

Mais dois degraus.

Fez-se uma pequena momento de silêncio, todos agora o encaravam com merecida hostilidade.

Eithur contoniou:

- Valeu a pena? Ele está lhe recompensando... adequadamente? - Seu veneno então rompeu a comporta. - Ouvi dizer que vocês dois fizeram um trio com seu irmão. Sebastian, certo? - A menção no irmão fez Clary apertar os punhos até as unhas perfurarem a carne. Mas ainda não era o suficiente, Eithur queria mais. Queria que ela sentisse o que ele sentia quando lembrava do Parabatai. - Você tem falado com ele? Como anda o inferno?

Um erro. Os degraus sumiram sob os pés de Jace.

Pulou do alto das escadas em num único movimento certeiro, e atingiu Eithur em cheio. O rapaz tentou bloquear o chute com os punhos, mas devido as mãos estarem ocupadas o movimento não saiu como o esperado. O brasileiro saiu cambaleando para trás até colidir na parede de onde havia desembocado, onde os símbolos do portal ainda faiscavam microscopicamente - fagulhas da magia de Rudá.

Eithur deslizou de costas na parede até cair sentado no chão, a respiração ofegante, as omoplatas latejando. Agora... agora, ele rezou entre uma aspiração e outra. Tinha que acontecer naquele momento. Mas precisava de tempo, só mais alguns instantes.

E aconteceu.

Seus olhos castanhos escuros brilharam num tom azulado, acompanhando a recém-chegada aura de luz que envolveu todo o seu corpo. Protegendo-o, e ao mesmo tempo reavivando todas as suas células.

A aura de um anjo. O seu toque a mais.

Todo o seu corpo vibrou em contraste com o excesso de energia angelical que lhe compenetrou. Apareçam, ele implorou ainda jogado no chão, apareçam por favor. Desta vez ele não as suprimiria, não as mandaria embora - desta vez elas podiam ser livres.

Sangue Mesclado - Um Toque a MaisOnde histórias criam vida. Descubra agora