Sangue Mesclado - Um Toque a Mais

Capítulo 3

- Ele ainda vai demorar muito?

- Não. - Akane Kaidou disse revirando os olhos, meio irritada. Gar tinha que aprender a esperar, as visões nem sempre sugeriam um tempo conciso. - Como eu já disse das outras cem vezes que você me perguntou, ele vai chegar em dez minutos.

Regardio Freeman estava de cócoras sobre a relva fria do "Vale da Ampulheta", uma região próxima ao território da "Corte Seelie", no reino das fadas. Depois que as novas leis de desarmamento foram estabelecidas, as fadas ficaram mais reservadas e não se distanciavam dos seus líderes, deixando lugares como aquele praticamente desabitados.

- Mas, você disse isso há dez minutos atrás - Gar recordou, levantando-se e esticando as pernas. Se eu for contar esses "dez e dez minutos", nós já estamos aqui há uma década, ele pensou. Mas não ousou expor o pensamento.

Três luas pairavam no céu acima de suas cabeças, uma vermelha, uma azul e uma prateada, três grandes corpos astrais espiaonando de esguelha os dois Nefilins forasteiros: Uma adolescente asiática com a pele branca como porcelana e o cabelo excepcionalmente liso, amarrado em um rabo de cavalo no alto da cabeça. E um jovem afrodescendente, com a cabeça raspada dos lados num penteado moicano. Ambos em seus trajes oficias dos caçadores de demônios e armados até os dentes.

Gar olhou ao redor, o reino das fadas era uma terra tão estranha e diferente do mundo dos humanos que o fez indagar o porquê de seres tão cruéis e narcisistas possuírem um mundo todo seu? Deus permitira isso? Tantas cores, curvas, e beleza? A magia corria a solta, desprendida de preconceitos e dogmas humanos, livre como o próprio vento que sopra oxigênio no mundo dos homens.

Mas algo por trás de todo aquele encanto despertava um sentimento de vazio, roubando toda a alegria de Gar. Como uma sombra escondida sob a luz do sol, obscurecendo a visão, uma miragem de espelho abrigando a verdadeira realidade.

Akane deu de ombros, paciência literalmente era uma virtude desconhecida por seu parabatai. Gar com sua pele marrom-chocolate, não tinha o mínimo de paciência. Talvez por esse motivo ela fosse tão paciente, afinal essa é uma das atribuições de um parabatai, certo? Completar o parceiro.

- Só mais alguns minutos. Ele ainda está no arsenal dos Lightwood... Ahn... - Akane massageou as têmporas doloridas, sua clarividência estalou igual um bip de alarme. Ali no reino das fadas, estava tudo tão conturbado. As sensações, o cenário, os sentimentos. Ela via: o garoto e o feiticeiro em uma sala grande, discutindo com outros Nefilins - os Lightwoods, possivelmente. O feiticeiro tentava acalmar o rapaz, mas era empurrado todas as vezes que chegava perto... Três lâminas serafins brilhavam na mão de alguém... Um chicote estalou, mas foi contido por... chamas azuis. Isso mesmo? Chamas azuis? Os ânimos estavam exaltados. Bem como ela previra em casa, que o garoto perderia o controle da situação. Mas estava tudo borrada, como a lembrança de um sonho distante. O que quer que proteja as fadas, estava interferindo em suas visões. Talvez fosse a magia reversa, ou o próprio sangue que corria em suas veias rejeitando a atmosfera. Uma coisa era certa: algo estava errado. E eles estavam ficando sem tempo. Então tudo ficou multicolorido, o rapaz entrou no portal. - Está quase na hora! - ela alertou, com a cabeça latejando pelo esforço.

- Já posso desenhar as runas? - Gar olhava preocupado para a amiga. - Talvez seja melhor você fazer uma pausa. Você está bem? - Ele também sentiu a dor pelo laço parabatai, Akane nunca reclamava - nunca -, sempre aguentava tudo calada. Mas nunca conseguira esconder nada de Gar, ela perdera essa opção quando firmou o pacto de parabatai.

- Sim. E seja rápido, ele já está nas marés do limbo.

Gar correu.

Os dois aguardavam aos pés do vale. Uma montanha despontava-se à frente, uma enorme estalactite de pedra árida, um rochedo caída do espaço e fincada na terra a força. Suas pontas superiores arranhavam as nuvens, maculavam um branco que não lhes pertencia. Sim... Um céu estranhamento iluminado durante a noite.