Inesperado

Prólogo - chuva, biscoitos e despedidas

Era um dia de inverno, chuvoso e frio, que deixava o rosto pálido de Ane avermelhado, que acabava contrastando com suas sardas.

Ricardo, pai de Ane, estava no trabalho cuidando de mais e mais papeladas no escritório minúsculo. Enquanto sua mãe, Carmem, fazia alguns biscoitos que enchiam a casa com seu cheiro apetitoso.

Carmem era uma mulher tão bonita, com seus longos cabelos escuros, a pele bronzeada que a filha invejava ter, o bom gosto para roupas tão bonitas que caiam tão bem em seu corpo. Além dos muitos dons culinários que tinha, como os famosos biscoitos com gotas de chocolate que fazia quando estava frio. Ela sabia que a filha não gostava da chuva, preferia o sol de verão e achava todo aquele clima frio mórbido.

Ricardo também era um bom homem. E seus quarenta e poucos anos não condiziam com sua aparência, já que ele fazia questão de fazer a barba e se vestir de forma tão elegante quanto sua mulher quando ia para o trabalho. Ric amava brincar com a sua garotinha, e as vezes se rendia aos doces encantos de Ane e deixava que a filha fizesse maquiagens nele e o servisse com seu chá magico cor de rosa junto com suas bonecas. Ele fazia de tudo para vê-la com um sorriso no rosto.

Carmem ficava se lembrando de coisas antigas, de como Ane era linda quando bebe, e como era feliz enquanto esteve ali, mas não se sentia tão feliz assim. Carmem queria mais do que tinha, queria a oportunidade que perdeu quando decidiu ficar no Brasil ao invés de continuar com sua queria mãe na Califórnia. Ela deixou tudo pra trás por amor a Ricardo. Queria viver um conto de fadas onde ela seria feliz para sempre com seu príncipe encantado e sua filha, mas para isso foi preciso que ela abandonasse sua herança e negasse aquela que talvez fosse a maior e melhor proposta de sua vida, que era se tornar jornalista da revista mais famosa, VOGUE. Aquele também sempre foi seu sonho de criança, porem na época em que foi lançada a grande questão que fez escolher entre a carreira da sua vida e o homem dos seus sonhos, o que pesava mais e parecia ser melhor era a segunda opção. E agora parecia estar arrependida.

Por mais que ela amasse sua filha e seu marido, seu egoísmo e orgulho falaram mais alto quando recebeu um telefonema de sua mãe a alguns dias atrás, oferecendo a escolha novamente. Dessa forma, ela escolheu fazer as malas e deixar apenas um bilhete. Aqueles foram os últimos biscoitos que ela faria para sua filha. Seria a ultima vez que ela a veria. Observando-a dormir calmamente em sua cama, derramou algumas lagrimas e saiu pela porta. Seria o melhor pra ela. Ela tentava acreditar.

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No dia seguinte, Ane encontrou seu pai jogado no sofá com uma garrafa de uísque na mão, outra na mesa e mais uma no chão. Acompanhando uma das garrafas, havia um bilhete aberto e meio amassado. A garotinha caminhou para o quarto de seus pais a procura de sua querida mãe e viu apenas as portas do guarda roupa escancaradas, e ali dentro, tudo vazio. Não havia mais nada.

A pequena voltou ate seu pai e tentou acorda-lo, chacoalhando até que abrisse seus olhos.

- papai –chamava – cadê a mamãe? – perguntou quando Ricardo levantou aos poucos apoiando suas mãos na cabeça

- ela se foi – ele a aninhou em seu colo e a abraçou fortemente enquanto se rendia a uma nova onda de lagrimas – ela se foi, meu bem.