Capítulo três

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Saltei da cama às cinco e trinta da manhã. Quem ele pensa que é para me querer às oito e vinte quando o meu horário de entrada é às nove horas? A fúria não me havia passado e não entendia como é que ainda me sentia assim. Vesti umas calças de ganga e uma camisa branca, com um casaco de cabedal e umas botas de salto cunha. Lá se ia a sensualidade toda, como o patrão pediu - Ou não.

Entrei no gabinete dele às oito horas e dez minutos. Suspirei de alívio, ainda não tinha chegado. Sentei-me e ajeitei-me na cadeira. Respirei fundo. Despi o casaco, cruzei as pernas. Olhei para o relógio: oito e quinze. E ele nada. Tirei um manuscrito da pasta e comecei a ler.

Ouvi um barulho de passos e endireitei-me. Eram nove e vinte cinco. Estava furiosa e pronta para lhe dizer Não tem relógio?

- Miss Johnson, peço imensa desculpa pelo atraso. – Tinha uma expressão cansada e vazia.

- Sem problema. – Limitei-me a dizer.

- A minha filha. – Merda, tem uma filha? – Passou a noite doente, teve uma paragem de digestão, então esta manhã adormecemos os dois. – Explicou, enquanto tirava o casaco, ficando só de colete sobre a camisa. Sentou-se.

- Lamento... – Tentei dizer. – Pela sua filha.

- Vamos então trabalhar que é para isso que aqui estamos. – Voltava a sua expressão arrogante e prepotente que me fazia revirar os olhos.

- Trouxe aqui um conjunto de propostas detalhadas, para além das já referidas na nossa última reunião. – Baixei os olhos para o meu bloco de notas. – De sábado. – Soltei em tom de reprovação por ter tido uma reunião ao sábado.

- Faça favor, Miss Johnson. – Disse visivelmente instalado na cadeira.

- O John havia aprovado algumas ideias para este mês. – Fitei-o e baixei os olhos novamente. – Mas tendo em conta as alterações. – Abanei a cabeça. – Creio que devo propor novamente. Gostava de elaborar o "mural dos autores". – Olhei-o. – A parede que vai desde o departamento de revisão textual até ao fundo do corredor ao pé da porta de serviço é demasiado vazia e sombria. Pensei que poderíamos utilizá-la com a fotografia dos nossos autores, os antigos e os recentes, numa linha cronológica. Por baixo da fotografia poder-se-á colocar o nome e uma citação ou a obra ou as obras publicadas. – Ele anuiu e eu continuei. – Em janeiro gostaríamos de criar o dia do autor na House e convidar os nossos autores a participar numa Conversa Literária sobre temas como a escrita ficcional, os livros mais importantes da história e outros temas propostos. Abrimos as portas do anfiteatro do segundo piso aos escritores e a leitores. – Prossegui. – Além disso, é necessário inovar na feira do livro aqui em Londres. Elaborei detalhadamente uma lista de atividades, workshops e iniciativas que podem ser pensadas. – Estiquei-lhe a folha. – Quanto aos livros a serem publicados, no verso dessa folha, distribuídos por área, surgem as propostas elaboradas pela minha equipa não só de entre os manuscritos recebidos, mas também clássicos e traduções. – Terminei.

- O que é que faz fora da House? – Perguntou-me enquanto olhava para a folha que lhe dei.

- E o que é que isso interessa? – Franzi o olho e ele riu-se.

- Era só para ter a certeza de que não faz mais nada da vida. – Disse, fitando-me e eu corei. – As suas propostas são tentadoras, mas acho que preciso de pensar nelas.

- Compreendo. – Disse-lhe num tom de indiferença.

- A senhora coordenadora aceitava jantar comigo esta noite? – Perguntou.

A última dançaOnde histórias criam vida. Descubra agora