O quarto era sombrio, imundo. A vida de quem o habitava
também. Não parecia um espaço humano. Não insinuava vida, estímulo para
felicidade. Recordava-me os lugares reservados para colocar esquecimentos, coisas
que não necessitam estar a vista, depósito de objetos sem utilidade.
Este é o quarto do meu filho! - revelou-me com voz embargada,
cheia de tristeza, aquela mulhernem jovem, nem velha. Na confissão quase
envergonhada de que aquele lugar estranho era o lugar da casa reservado ao seu
filho, a mulher parecia pedir socorro, como se estivesse contando ter
descoberto o lugar do cativeiro do filho sequestrado. Não, não era um lugar
distante dos seus olhos. Não era como nas histórias clássicas de sequestro, em
que os seqúestradores escolhem um lugar distante para manter a vítima em
estado de rendição. Era dentro da sua própria casa que os seqúestradores
mantinham o seu filho amado em condições inumanas.
Olhou-me com indignação, como se quisesse justificar-se de
permitir aquele absurdo. Meu filho dorme aqui! - repetia com tristeza. Parecia
querer acreditar em motivos desconhecidos, estranhos à razão humana, que
pudessem justificar a escolha tão errada de seu menino.
As drogas o sequestraram. Vítima da dependência química, aquele
menino dotado de inteligência rara entregou-se aos absurdos maus tratos que os
entorpecentes causam na vida humana. O vício chegou de mansinho, assim como
tudo na vida. Um cigarro hoje, uma cerveja amanhã. Drogas mais leves no início,
depois as mais pesadas e, aos poucos, bem aos poucos, os seqúestradores foram
assumindo o controle de sua vida. Violência, roubos; tudo o que antes era
inimaginável na vida do menino tornou-se real. A droga o fez assumir uma
personalidade estranha, alheia, porque provocou nele o esquecimento de quem
ele era. Seqúestradores costumam fazer isso com seus sequestrados. Quanto mais
esquecido ele estiver de sua natureza, maior será sua entrega aos poderes de quem
o seqüestrou, de quem o levou de si mesmo.
Seqüestros do corpo; seqüestros da subjetividade. Nem sempre é
preciso levar o corpo, acorrentá-lo de maneira concreta, real. Há um jeito sutil de
levar embora, de conduzir para fora, de fazer esquecer, de perder a identidade.
Viciados não se pertencem mais. Estão sujeitos a uma necessidade que se opõe à
liberdade. Perderam a condução da própria vida, porque foram levados por uma
necessidade estranha, alheia, mas determinante.
A família já havia tentado ajudar de todas as maneiras possíveis.
Internações, terapia, mas nada deu certo. O menino morria gradualmente aos
olhos de todos. Por muitas vezes a mãe vasculhava o seu esconderijo, seu
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