Não achamos mais o tal do gato, mas um milagre havia acontecido.
Uma família de pássaros havia construído seu ninho nas proximidades de nosso apartamento. Algum tipo de andorinha, acho. Sua plumagem era composta por belos tons de negro, azul e branco; cores impressionantes, pareciam reluzir com vida. Pareciam animais tão pequenos e delicados, como minúsculas pedras preciosas. Não conseguíamos ver os filhotes de onde estávamos, mas podíamos ouvi-los. E, de alguma forma, os pássaros voavam e voltavam com todo tipo de comida, até mesmo pequenas minhocas.
A vida encontra o seu caminho.
Dentre as muitas coisas que fugiam de nossa compreensão, algumas delas pareciam uma benção.
As horas se passavam sem que percebêssemos, enquanto permanecíamos sentados observando seu ir e vir fugidio. Voavam com agilidade e leveza que nos deixava pasmos. Quem diria que havia tanta beleza em observar pássaros? Certamente alguém, em algum ponto da história humana já disse isso, mas você precisa levar em consideração duas coisas: antes, a correria de nossas vidas fazia com que nós não encontrássemos tempo para dar atenção a esse tipo de diminuto acontecimento e também precisa levar em consideração a quantidade infinita de estímulos e distrações disponíveis.
Agora não.
Agora estávamos hipnotizados.
Como era belo o cantar que eles emitiam. Acalmava o coração e a mente.
"O que você acha que aconteceu, homem?" Ela me perguntou em determinado momento, enquanto espiávamos as andorinhas.
"O que aconteceu que fez esses pássaros aparecerem?"
"Isso."
"Eu não faço a mínima ideia", respondi. "Há a possibilidade de que eles nem mesmo tivessem desaparecido. Esse fato só me dá a dimensão de como somos ignorantes no final das contas."
"Nós devemos procurar mais", afirmou. "Deve ter mais coisa por aí. Talvez até mesmo mais gente isolada."
"Nós podemos procurar sim, mas é melhor que não criemos expectativas sobre qualquer uma dessas possibilidades. Poderia nos gerar mais angustia e nesse momento me sinto tranquilo. Além do mais, surpresas como essa são momentos preciosos."
"Não sei se tenho emocional para essas surpresas", ela falou rindo.
Ri também. Tudo parecia possível.
"Então, você acha agora que vale a pena viver?" Perguntou-me.
"Talvez eu nunca tenha deixado de achar", falei. "Só estive confuso. Muito confuso."
"Quando nós não vamos estar confusos, não é mesmo?" Ela sorriu para mim calorosamente.
Seus olhos castanhos pareciam brilhar mais com o sol do final da tarde. Ela era a mulher mais linda do mundo. E com certeza não dizia isso apenas poque restava apenas uma.
Ela era.
"Provavelmente nunca", afirmei. "Mas pelo menos podemos ser mais otimistas."
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Ainda Estamos Aqui
Short StoryEssa é a história do último casal do planeta contada a partir de seus diários pessoais.