Capítulo 2

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Tem dias que a gente se sente

Como quem partiu ou morreu

A gente estancou de repente

Ou foi o mundo então que cresceu

A gente quer ter voz ativa

No nosso destino mandar

Mas eis que chega a roda-viva

E carrega o destino pra lá

Chico Buarque

Uma coisa Igor tinha que admitir, ele era um cafajeste. Não na maior parte do tempo, mas ele tinha sido uma vez e aquela única vez, lhe rendeu uma fama não muito agradável até hoje. Igor Fernandez era o menininho do papai, filho de um grande advogado e recém formado em direito, ele é o orgulho da família, trabalhava na empresa do seu pai, afinal de contas tinha um sobrenome a zelar. O que tem de bonito e charmoso tem de arrasador de corações.

Ao ser derrubado por uma mulher desastrada na escada hoje pela manhã não tinha se dado conta que ela era tão bonita. Agora sentado à frente dela na mesa da reunião não conseguia tirar os olhos. A reunião de início de mês tinha começado as 9h mas a mulher tinha chegado 10 minutos atrasada e eu conhecia meu pai muito bem para saber que ele não tolera atrasos. Fiquei atento a cada coisa que ela fez desde o momento que ela passou pela porta acompanhada de Júlia a secretária do Roberto, e do Caio o babão, quer dizer o advogado auxiliar dele. Percebi que ela ainda mancava e Caio a amparava nas costas, vi o quanto ficou vermelha por chamar atenção pelo atraso. Como as três únicas cadeiras vagas que estavam juntas eram na minha frente eles não tiveram muitas opções. Ela estava tão nervosa que demorou uns bons minutos para notar minha presença, mas não pude deixar de esboçar um sorriso quando ela arregalou os olhos e percebeu que eu estava bem na sua frente.

҉    ҉    ҉

Sentando na cadeira da sala de reuniões 10 minutos atrasada, Alice pensou que definitivamente seu dia não estava nada bem, só por ser 06 de Janeiro já era um caos para ela. Nos últimos dois anos nessa data, ela tinha se isolado do mundo, ido à praia, perto da sua casa, e chorado copiosamente até ficar quase desidratada. Infelizmente nessa cidade de pedra ela não conhecia nenhum local para ir, não conhecia quase ninguém e tudo estava dando errado desde do momento em que ela abriu os olhos. Graças a Deus que Júlia a secretária do tio Roberto era uma flor de pessoa e tinha a ajudado no momento em que ela pisou no 21º andar.

Eu bem que devia ter suspeitado que tio Roberto não iria aparecer hoje no trabalho, pensou Alice, afinal de contas era um dia muito difícil para ele também, mas Júlia estava encarregada de me passar algumas funções, apresentar o ambiente de trabalho, e me levar para uma reunião às 9h onde eu seria devidamente apresentada. O que ela não esperava era me encontrar na porta da escada com os olhos cheios de lágrimas.

̶  Oh meu Deus! Tudo bem com você? Posso ajudar em alguma coisa? Meu nome é Júlia, sou a secretária do Senhor Roberto, você só pode ser Alice, ele me falou muito de você e me mostrou a sua foto com o Ricardo, oh meu Deus desculpa. Julia ficou constrangida na mesma hora em que falou dele.

Eu engoli o choro e disse:  ̶  Sou eu mesma, acontece que esbarrei com um homem na escada e machuquei meu tornozelo. Ela me deixou sentada numa cadeira próxima e correu para pegar um copo de água. Quando voltou, veio seguida de um homem com um ar preocupado que segurava uma bolsa de gelo e um aerossol desses de colocar em jogador de futebol quando se machucam. Ele logo se apresentou:

̶ Oi, eu sou Caio, a Júlia me falou que você se machucou, onde foi exatamente?

Alice toda sem graça de dar vexame no primeiro dia do trabalho sentiu as bochechas ficarem quentes, mas respondeu em seguida. ̶ Obrigado por ajudar, foi bem aqui no tornozelo direito. Mas não foi nada tão grave. Eu não iria assumir que estava doendo muito. Ele continuou...

Enquanto houver razõesOnde histórias criam vida. Descubra agora