O DIA EM QUE MORRI, MAS VOLTEI PRA TE AVISAR
Só sei que foi assim! Aquela dorzinha no peito, o ar rarefeito e a dormência pelo corpo se espalhando. Quando percebi, meio que sem poder me esquivar...
EU TAVA MORTA!Mas tudo bem! Consegui te contar! Agora você sabe sobre mim, e não precisou atender nenhum telefonema triste e difícil de lidar! Também não precisou fingir ser mais uma amiga, ou coisa do tipo. Ninguém te fará perguntas, porque ninguém precisou te avisar.
Você me permite descrever novamente o que houve nesta manhã? Bom, me desculpa, mas de qualquer jeito, preciso contar...
Então, estava Eu dormindo como de costume. Sonhando com coisas aleatórias e pessoas que desconheço, ou até conheço, mas não me lembro bem.
Por alguma razão, ouvia os pássaros que cantavam lá fora, perto do jardim. De certo, minha cabeça já não estava tão conectada assim aos meus sonhos. E meu corpo estava naquele processo sombrio, onde não se sabe ao certo, se estamos acordando, dormindo, ou sonhando acordados.De repente, sinto o meu corpo como o soar de um alarme, me fazer despertar! Era um soco no peito, as veias estavam saltando, e minhas pupilas deveriam estar tão enormes como nunca.
Eu estava prestes a entrar num vulcão, ou estava prestes a sair dele! A sensação foi única e até bonita, por assim dizer. Apesar de fisicamente sozinha, senti sua mão como um afago em meu peito, vir me abrigar. Era um toque majestoso e sereno, foi o que me fez querer voltar..."Amor? Você pode me ouvir?" Foi como um suspiro profundo e esperançoso! Enquanto torcia pra que pudesse me escutar, corria contra o tempo, como se minha vida agora, não passasse de um beco sem saída, escuro e úmido.
Pude ouvir sua voz, como um lamento sertanejo, que implora por água na caatinga do sertão. Mas na verdade, deveria ser Eu. Era meu lamento, minha luta pra tentar chamar sua atenção. Entre uma nebulosa e uma aurora, senti sua presença, como um anjo tocando minha alma, à espera da ressurreição.
"Amor, você consegue me ouvir?" E então, sua imagem surge como uma esfera amarela. Um raio de sol, que dá vida ao Outono ou ainda, a Primavera. Sua vestimenta é um convite, a uma rica e contínua celebração. É neste exato momento, que sinto o quanto minha vida está alinhada a sua. E como mesmo através da morte, existe uma sincera conexão.
"EU MORRI! MAS TÁ TUDO BEM!"
E foi assim, que me pus a te explicar...
Não foi sentando ao seu lado, nem segurando suas mãos, como nas novelas e filmes. Só tava lá, te olhando meio sem jeito, eu acho! Não havia muito a se fazer, não é?
Como é que a gente conta que morreu?Falei que a partir de agora, você vai caminhar sem mim pelo parque, e vai ter que aprender a andar sozinha de bicicleta. Não que já não saiba, porém não sabe muito bem! Hehe! Também te disse, que meus votos de casamento serão escritos de longe, talvez de outra dimensão, e que com certeza, enviarei um buquê de girassóis, mesmo que sejam flores artificiais!
Falei que agora, você pode comer sozinha e sem culpa, todos os chocolates das próximas páscoas que vierem pra você! Ou pode estar rodeada de pessoas, comendo os seus chocolates, enquanto lambe os dedos delas!
Ah, não poderia me esquecer de dizer que quando for novamente às exposições, terá de levar outra pessoa no meu lugar, pra ficar te fotografando entre as obras. Deixando o cenário mais belo e aconchegante! E que ao se deitar, não terá mais que brigar pelo canto da parede. Pelo menos, não comigo!
Mas todas essas coisas foram ditas sobre a minha falta. E agora gostaria de dizer, sobre a falta que você irá me fazer!
Mesmo que Eu não saiba bem, aonde estou e pra onde irei. Me diga quem há de comer as sobras do meu lanche, aquele que não consigo comer sozinha? E quem é que vai cozinhar aquele macarrão com sardinha, que é mais incrível, do que qualquer prato chique, de um chefe francês?
Quem vai cantar pra mim com uma voz doce, meio desafinada, mas que me enche de amor? E me fala, como vou conseguir me manter na eternidade, sem todo o seu afeto, que vem fantasiado de 'bom dia' ao amanhecer?
Quem vai encostar os pés gelados nas minhas pernas, e me arranhar com as unhas dos pés? Quem vai ficar dentro das cabaninhas que faço com o cobertor? E como vou me manter sóbria, só pra garantir que você vai poder se divertir?
Diz pra mim, qual a pele que vai me proporcionar uma contagem infinita de constelações, em forma de pintinhas de vários tamanhos e cores?
Eu poderia desenrolar mil e uma situações das quais sentirei saudade, mas não acho necessário! Por alguma razão, te sinto mais dentro que fora, e isso ultrapassa qualquer entendimento!
E ainda que meu lado carnal, que está prestes a se desintegrar, me enfraqueça e me faça pensar na ausência. Minha alma grita de alegria, confrontando o medo e alimentando nossa história, como se nada disso fosse parte do fim. Na verdade, sinto que o fim pra nós, não existe! E que cada passo dado, seja a ponta do iceberg, chamado recomeço!
Talvez agora, Eu receba a resposta que tanto nos afligia. E que alguém em algum ponto do Universo, explique tudo sobre você e Eu. Quem sabe agora, a gente entenda nossa vibração, e receba com gratidão outra vida, fantasiada de uma nova situação.
Por ora, não vou me estender! Deixemos como está, e vamos aguardar minha recepção. Precisamos entender como será isso pra você também!
Te agradeço por estar em meus sonhos, e por ser parte das minhas vidas!
Cada pedaço teu, esteve aqui!
Com afeto...
... seu amor, rodeada de girassóis! Um beijo!
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Elas por Ela
PoetryColetânea de pequenos contos e poesias. Diante de uma narrativa minimalista, que explora o cotidiano da mulher. A obra carrega em si inúmeras histórias reais. Um ponto de vista feminino sobre a realidade do Universo. Por, Kim Walachai