Capítulo 3 | Poseidon

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- Pelos mares! Já estamos quarenta minutos atrasados! - Gritava eufórico em meio aos inúmeros balcões prateados onde todo o banquete estava disposto. - Vamos pessoal! não queremos decepcionar Zeus, não é mesmo?

- Não chefe! - Responderam todos em coro.

- Então tratem de agilizar isso!

- Sim chefe! - Novamente elevaram a voz em resposta.

Zeus não era minha maior preocupação naquele momento. Seu autoritarismo e porte executivo tinham sim um efeito sobre as pessoas, mas nada podia superar a ira de Hera.

- Chefe, Zeus está na linha e quer falar com o senhor. - Voltei meu olhar alguns graus para baixo e então vi o pequeno ajudante de cozinha que estava a minha frente. Ele tinha manchas por todo o avental branco e seu cabelo ruivo estava preso por uma fina touca branca de algodão. Em sua mão esquerda trazia consigo uma pequena agenda da qual utilizava para anotar tudo que precisasse em seu primeiro dia de trabalho. - Ele parece estar furioso.

Foi com um ranger de dentes meu que o menor saiu do local, me deixando e voltando para os preparativos que faltavam para finalizar o bufê.

Que os deuses me protejam.

...

- Estou ciente disso.

"Está mesmo? Me parece que não tem ideia da importância desse evento!"

- Nós estamos finalizando tudo e preparando o transporte. Tudo vai ocorrer como o combinado.

"Vocês deveriam estar aqui à exatos 46 minutos! É isso que chama de profissionalismo? Pois para mim isso é pura incompetência!"

- O senhor tem toda a razão. Nós...

Ligação encerrada.

E esse foi mais um papo-cabeça com meu irmãozinho do coração.

Soltei o celular sobre a mesa de vidro ao meu lado e direcionei minha atenção para alguns quadros pendurados em meu escritório. Eram quase todos eles pintados em cores frias como o verde e o violeta, mas principalmente deixando sobressair o azul.

As pinceladas eram rápidas e cheias de emoção, os tons se mesclavam e as imagens se formavam. Pessoalmente, sinto um apreço muito grande pelo estilo impressionista, as pinceladas me fazem lembrar do mar, das marés e das ondas.

Meu momento crítico de arte durou pouco, logo vi o jovem rapaz acenando do lado de fora da sala.

- Estamos prontos, Chefe!

...

Era espantosa a forma com que o lado de fora do lugar parecia não ter mudado. O mesmo muro de pedra. As mesmas trepadeiras. A mesma sobreposição de cores, mesclando o dourado com branco. O mesmo portão de ferro trabalhado de forma delicada.

À dez anos, quando Kronos ainda era o dono deste lugar e Zeus apenas um pequeno empresário, esses muros altos escondiam um verdadeiro inferno. Mas isso é história pra uma outra hora.

O ranger das dobradiças do portão, seria de fato assustador, se não fosse extremamente irritante.

- Por Hera! Tem uma guerra acontecendo lá dentro e você aqui admirando o jardim? - Dizia enquanto caminhava em passos rápidos até mim. - É melhor que tudo esteja perfeito, não quero ter que ouvir mais reclamações vindas de Hera.

O estilo simples e confortável era algo que transmitia um sentimento de aconchego a todos que se aproximavam dela.

Gentilmente, como era se esperar, ela me abraçou calorosamente.

- Estava com saudade de você, Poseidon. - Disse durante o abraço. - Todos nós estávamos.

- Também sinto sua falta, Deméter. - Retribui o braço. - Agora, com relação aos outros, não posso dizer o mesmo.

- DEMÉTER! DEMÉTER! Onde ela foi se enfiar agora?! - Os gritos nítidos chegavam ao jardim ainda em potência máxima.

- Acho melhor entrarmos antes que Hera resolva vir aqui fora e nos encontre perdendo tempo. - Aconselhei Deméter, que agora sorria.

Voltamos a caminhar para dentro em passos lentos e observando as inúmeras flores dispostas por todo o quintal, enquanto isso minha equipe entrava as pressas em direção a cozinha.

...

- Pequena Sereia!! - O loiro disse andando até mim com os braços abertos.

- Apollo... - Revirei os olhos e estendi a mão para cumprimenta-lo.

- Quanta formalidade, peixinho. - Disse desviando do meu aperto de mão e me envolvendo em um abraço apertado. - Nem parece o Poseidon que eu conheço.

Os apelidos nada engraçados e criativos de Apollo eram o resultado de uma época antiga da minha vida, antes de abrir o Atlants, quando meu sonho era virar um atleta, mais especificamente um nadador.

Eu era jovem, com um espírito aventureiro e cheio de força de vontade, e Apollo era o único com energia para me acompanhar e também um dos poucos que me apoiava nisso, mesmo sendo alguns anos mais jovem. Mas aquele sonho morreu. Eu cresci. Assumi responsabilidades. Deixei aquele Poseidon no passado, todos deixaram, menos Apollo que ainda insistia em me atormentar com isso.

- Você não me conhece. - Respondi ríspido e me soltei do abraço. - Agora, se me der licença, tenho uma cozinha para organizar. - Virei-me caminhando em direção à saída do cômodo, mas meus passos foram bloqueados por alguém.

- Poseidon? - Seu olhar era confuso e curioso. Não nos víamos desde o ensino médio, e sinceramente, minha vida foi melhor com ele longe.

- Irmão.

Os olhares profundos se cruzaram. Meus mares e sua névoa. Meu azul e seu cinza. Poseidon e Hades.

- Tenso... - Apollo murmurou entre dentes. - Bom, eu não sei vocês, mas eu estou sentindo um clima um pouco estranho aqui.

- Apollo! - Gritamos uníssono o nome do loiro.

- Okay Okay... Eu sei quando não sou bem vindo. - Disse fingindo mágoa enquanto saía em direção ao seu quarto. - Apenas me avisem quando as duas damas terminarem. Eu e o branquelo alí temos uma conversa para finalizar. - Piscou debochado e subiu as escadas.

Um sorriso quis escapar por entre meus lábios, mas ao voltar meu olhar novamente para Hades o tal clima que Apollo tanto comentava reinou novamente no ambiente mal iluminado.

- Não vou te atrapalhar. Deve estar ocupado demais até para uma conversa com seu irmão.

- Você ainda não esqueceu aquilo? É passado Hades! Você deveria seguir em frente, superar.

- Você esqueceu? - Questionou o mais alto. - Esqueceu do passado? Esqueceu do tempo em que você não precisava da opinião de ninguém pra ser feliz? Esqueceu do quanto era feliz?

- Sim, eu esqueci do passado! E sim, eu sou mais feliz agora! - Aumentei o tom da minha voz.

- Se é assim que pretende viver, mentindo para si mesmo e fingindo ser o maldito empresário que não nasceu pra ser, então não tem nada que eu possa fazer ou dizer. - Hades respondeu em tom rouco e baixo, como de costume. - Nos vemos mais tarde, Poseidon.

- Você não sabe quem eu sou! Não aja como se soubesse! - Respondi alterado.

Hades, que agora estava subindo as escadas lentamente, revirou os olhos e respondeu em tom de deboche.

- Sim chefe!

Permaneci estático no centro do cômodo que pareceu ganhar uma claridade extra com a saída de Hades do local. Alguns segundos depois foi possível ouvir o estrondo da porta do quarto de Hades ao fechar-se, o barulho ecoou por todo o prédio.

Não, irmão. Eu não esqueci.

...

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