{4} A GAROTA DA LUZ

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    — Uma garota, Barton. – Johá estava estupefato com o que via.  Encontrar feras demoníacas em uma caverna escura era de se esperar, mas uma esfera de luz que faz garotas aparecerem do nada era, no mínimo, incomum. – Ela está viva?

    A garota ainda estava deitada em posição fetal bem no meio do círculo de rocha derretida que começava a esfriar. Tinha o cabelo loiro repicado um pouco abaixo do queixo delicado. Não aparentava ter mais do que dezenove anos e trajava algum tipo de uniforme de tecido preto com listras vermelhas na cintura, sujo de lama seca e sangue. Tinha vários ferimentos pelo corpo, mas nenhum deles parecia muito grave, exceto por um profundo corte na testa por onde o sangue vertia vagarosamente.

    — Acho que sim – constatou Barton, aproximando-se para ver que a garota respirava devagar. – Parece estar apenas dormindo.

    Johá olhava para o fundo da caverna, ainda segurava as pedras sujas com algo viscoso que seria o sangue das criaturas.

    — Temos de tirá-la daqui antes que aquelas coisas voltem – disse.

    Barton reacendeu a tocha em um dos corpos em chamas e disse:

    — Me ajude a colocá-la nas minhas costas.

    Quando segurou o braço direito da garota, Barton viu que ela usava um bracelete de prata ornamentado por uma bela ave com as asas abertas gravado no metal.

    Com Barton com a garota nas costas e Johá iluminando o caminho, conseguiram sair da caverna sem encontrar mais nenhum monstro escondido na escuridão. Pela primeira vez na vida, eles sentiram alívio em ver o brilho sem graça do sol por trás das nuvens cinzentas.

    Caminharam até a trilha mais distante da entrada da caverna onde Barton, exausto, deitou a garota no chão. Precisavam decidir o que fazer.

    — Certo, Barton – disse Johá, entre um ofegada e outra –, essa foi a última vez que você me arrasta para suas maluquices.

    — Ela é Áurea. – Barton a olhava impassível.

    — O quê?

    — Ela é Áurea, Johá – repetiu ele, agora mais alto. – Quantos humanos você já viu surgirem do nada no meio de uma bola gigante de luz?

    — O que isso importa agora? Precisamos ajudá-la, ela está ferida.

    — E o que quer fazer, levá-la para a vila?

    Johá ainda não tinha parado para analisar a situação. A contagem aconteceria dali a dois dias e se os soldados de Shans encontrassem uma pessoa a mais na vila todos seriam severamente castigados, talvez até mortos se as suspeitas de Barton sobre aquela garota ser áurea se provassem corretas.

    Mas Johá não parecia convencido ainda

    — Barton, eu sei que você não morre de amores pelos Áureos, mas sei também que você não é insensível a ponto de deixar essa garota morrer aqui.

    Barton arrancou a manga de sua camisa e afastou os fios louros que cobriam a testa da estranha, apertou o pano sobre a ferida para conter o sangramento. Não, ele não gostava de áureos, mas não era um Espectro que se divertia na presença da morte.

𝑨́𝒖𝒓𝒆𝒐𝒔 - 𝑪𝒂𝒎𝒊𝒏𝒉𝒐 𝑷𝒂𝒓𝒂 𝑺𝒉𝒊𝒏𝒆̂ (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora