Capítulo 2

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Intensos. Penetrantes. Cor de céu. Assim são os olhos do meu melhor amigo. Confesso que eu sempre quis ter olhos assim, tão claros, que mudavam o tom de acordo com seu humor. Eram únicos. Mas confessava isso apenas para mim mesmo. A única vez em que disse que os olhos de Dylan eram lindos, Edgard me chamou de gay. Mas não havia mal algum em dizer isso, havia?

Eu engoli seco. De repente não soube explicar o que estava acontecendo. Um sentimento estranho. Eu sempre protegi e defendi Dylan, mas nunca senti vontade de abraça-lo como eu faria com Elena, por exemplo. E nesse momento eu senti essa vontade.

— Meu pai a chama de Isa. Nem quis perguntar seu nome. Pode ser Isabel, Isabella, Isadora... não sei.

— Sua irmã não tem culpa, Dylan. Se alguém errou podemos dizer que foi o seu pai. Mas nem isso devemos dizer. Não podemos julgar sem saber os motivos.

— Eu sei. Eu não tenho raiva dela. Nem a conheço. Eu só estou me sentindo perdido. A imagem de família perfeita está se dissolvendo bem à minha frente.

— Eu nem sei o que dizer, sinceramente. Mas de fato você precisa ouvir seu pai.

Ele bufou e ficou olhando para frente... para o nada. Não queria estar na mesma situação que ele. Não conseguia imaginar meus pais separados ainda mais por causa de um deslize, de uma traição. Sei que Dylan estava demonstrando menos do que estava sentindo. Fred Clark era seu ídolo.

— Por que não saímos um pouco? Assim você distrai um pouco e fica mais leve para conversar com seu pai. O pessoal vai ao Brad's hoje.

Ele me olhou de soslaio com um sorriso zombeteiro.

— Qual foi a periguete que convidou você dessa vez?

— Taylor Van Dickens obviamente.

— Você deveria sair com ela. Quem sabe assim ela não desencana?

— Sabe que não sou assim, Dylan. Ate me ofende dando esse tipo de ideia.

— Desculpe.

— Você também deveria sair com a Kate. Ela quase morre por você.

Dylan fez uma careta de nojo. Assim como eu, ele não ficava com ninguém. Eu nunca soube de alguma garota que tenha conseguido um único beijo dele. Nesse aspecto somos diferentes, pois pelo menos beijei algumas garotas. Esse pensamento me fez olhar para Dylan de maneira ainda mais avaliativa. Ele é bonito e não tenho vergonha de dizer isso. Mas ele é diferente dos meus colegas. Suas feições são mais clássicas. Até mais suaves eu diria. Seu corpo é mignon e nada parecido com o meu que já adquiria músculos. E o mais engraçado é que algumas garotas gostavam de sua aparência. Além disso ele é sensível e tem um modo delicado de tratar as pessoas.

Por isso Edgard costuma ficar com aquela brincadeira estúpida o chamando de florzinha. Isso me irrita. Odeio tudo e todos que façam qualquer coisa para magoa-lo.

— Deus me livre. Não quero isso na minha vida.

As palavras de Dylan me fizeram franzir a testa. Ele não queria Kate em sua vida ou qualquer garota? Confesso que a possibilidade de ele começar a namorar alguém não me agradava. Perderíamos nossos momentos juntos que costumavam ser muito divertidos.

— Você nunca se interessou por nenhuma garota? Há algumas bem lindas na escola.

Ele se levantou parecendo furioso e me encarou.

— Então fique com elas para você. Eu não quero e não preciso disso.

— Calma. Não falei por mal. E nem precisa responder assim. Sabe que eu também não...

— Não o que? Já se esqueceu de quando quase fez sexo com a Diana naquela boate?

— Eu não...

Ele me interrompeu mais uma vez.

— Olha quer saber? Eu não me importo.

Eu fiquei calado. Quando foi que chegamos a esse assunto? E por que as acusações dele me machucavam tanto? Eu fiz apenas uma pergunta inocente... e até então eu mesmo não tinha percebido o quanto ela me incomodava.

Ele continuava me encarando e então eu prendi meu olhar no dele. Eu estremeci, não sei bem por que e baixei novamente a cabeça. Meu coração estava disparado. Por quê?

— Dylan? Podemos conversar?

Eu me coloquei imediatamente de pé ao ouvir a voz do senhor Clark. É um homem alto, cabelos escuros e espessa barba. Sempre foi simpático comigo, até mais que Mia.

— Oi Edward.

— Como vai senhor Fred? Bem... eu vou indo então.

— Não precisa, rapaz. Você é o melhor amigo do Dylan e sei que no final das contas ele contará tudo a você.

Eu ri meio encabulado e olhei rapidamente para Dylan que evitava olhar em nossa direção.

— Sim, provavelmente. Mas acho que no primeiro momento tem que ser apenas vocês dois. Mesmo assim obrigado pela confiança.

Ele sorriu e apertou levemente meu ombro.

— Filho?

Dylan finalmente olhou em nossa direção, mas seu olhar não encontrou o meu. Ele estava me evitando e eu não soube dizer o motivo. Talvez ainda estivesse chateado com nossa conversa.

— Eu... se precisar de mim sabe onde me encontrar, Dylan.

Ele não respondeu, mas antes que eu saísse do quarto, Mia entrou furiosa, apontando o dedo para o marido.

— Eu já avisei você Fred. Eu não vou aceitar essa bastarda sob o mesmo teto que eu e meu filho. A droga do carro já chegou e a qualquer momento ela passará por aquela porta. Você só tem uma escolha: eu ou ela.

— Mia... eu já disse que ela está sozinha no mundo. Sei que é difícil aceitar minha filha que tive num deslize, mas tente ver como um ser humano. Ela não tem mais ninguém e...

— Ok... você fez sua escolha. Vem comigo Dylan?

Vi meu amigo arregalar os olhos e abrir a boca, sem contudo emitir qualquer som. Mia praticamente o fuzilou com os olhos.

— Eu já deveria imaginar. Nunca é capaz de tomar uma atitude não é Dylan? Sempre se escondendo, fugindo.

— Mia...

Mas ela já saía do quarto quase correndo. Fred foi atrás e em seguida Dylan ao ouvir os gritos. E o que eu poderia fazer? Ficar ali? Ir embora? Tentar ajudar? Mais sensato ir embora. Provavelmente nem perceberiam minha ausência nas próximas horas. Passei pelo corredor e desci as escadas, chegando à sala, de onde vinham os gritos.

Eu parei e vi Mia gritando impropérios enquanto Fred tentava contê-la. Dylan parecia petrificado assim como a garota de pele clara e cabelos escuros que olhava a cena com lágrimas escorrendo pelos seus olhos.

Eu me senti perdido... além de intruso. Caminhei rapidamente até a porta, mas antes que eu a alcançasse uma mão suave tocou meu braço.

— Por favor, me tire daqui.

Sem pensar eu segurei na mão da garota e estava prestes a tirá-la dali quando Dylan se colocou à minha frente, olhando-me com raiva.

— Deixe-a. Ela é minha irmã, eu cuido dela.

— Eu só...

Mas ele não esperou que eu respondesse. Abraçou a cintura da garota e se afastou com ela, subindo as escadas. Novamente senti um aperto inexplicável no peito. Uma raiva do Dylan por ter se afastado sem ao menos me olhar novamente. Chateado, eu deixei aquela casa sem olhar para trás.

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