Interferência - A Casa das Máquinas do Destino

UM

Desde pequena eu tinha que fazer isso. Vô dizia que era porque eu era diferente das pessoas e não podia deixar que elas vissem que não tinha a marca. Ele disse que a marca não conseguiu se fixar na minha pele e por isso eu tinha que desenhá-la. Já havia feito isso por muito e muito tempo e ela já estava tão perfeita quanto uma verdadeira que você via por aí. Ela tinha que ficar em um local onde todas as pessoas pudessem ver. Por isso ela era colocada no rosto, na parte direita do rosto. A tinta preta pegava a minha testa e passava por entre meus olhos, minha boca e descia pelo meu pescoço. Até que ficaria irritada de fazer isso em mim se não a achasse bonita. Ela parecia uma tribal e eu não tinha que fazer isso sempre já que a hena demorava a sair. Meu avô a comprava no mercado negro. Pelo visto este produto era proibido para evitar que as pessoas desenhassem uma marca de destino em seu rosto, que é exatamente o que eu faço. E também, para que elas não tentem mudar a sua marca de Desa-fortunado para Afortunado.

É algo realmente muito simples. Quando a criança nasce ela deve ser levada para alguma máquina de leitura da vida, as Destinis. Elas então leem o futuro da pessoa e a coloca em um dos grupos. Os Afortunados – aqueles que terão graça e sorte pela vida toda, recebendo toda a ajuda que o governo puder dar. E os Desafortunados – aqueles que em algum momento de sua vida cairão em desgraça. Essa divisão era feita para que o governo não gastasse tanto dinheiro com pessoas que não iriam lhe dar nada em troca depois de alguns anos.

Os Desafortunados eram totalmente evitados pelos Afortunados, sendo cidades separa-das por classe. Alguns eventos raros podem acontecer, como quando um casal de Desafortunados dá a luz a um Afortunado. Quando isso acontece o governo leva a criança embora para que ela tenha os devidos cuidados e cresça como uma Afortunada, ela é uma pessoa que passou a ter importância para o governo. Os pais gritam, choram, mas não podem fazer nada para mudar isso.

Também ocorre de um filho nascer de um casal Afortunado sendo um Desafortunado. É a pior coisa que poderia acontecer para pessoas de tão alta classe. Como eu havia dito antes, esses casos são raros, e dependendo de que tipo de família Afortunada a criança provém – filho de políticos, chefes de empresas, pessoas influentes – ela irá ser mandada para um local restrito, escondida de todos, uma vergonha viva, contudo estará em situação melhor que a de todos os outros Desafortunados.

Essa máquina criada pelo governo de Diaurum foi feita há muito tempo. E vem dando ótimos resultados. Para nós, os Desafortunados, não é permitido saber sobre a história por trás de sua construção. Tenho uma teoria de que o governo acredite que informação é força e poder. Por que iriam se arriscar dando informações para nós? Sobre o criador da máquina eu não sei se ele se arrepende do que fez, pois por conta disso muitas pessoas perdem o seu destino. Você deve estar se perguntando: Como assim?

Irei explicar.

Quando as pessoas completam 16 anos elas são comunicadas do real motivo que a tornou uma Afortunada ou uma Desafortunada. Há uma grande cerimônia, praticamente uma festa mas que somente os Afortunados apreciam de verdade. Elas reúnem todos os que nas ceram naquele determinado dia e as máquinas, as Destinis, mostram o seu sucesso caso seja um Afortunado e seu fracasso se for um Desafortunado. As únicas pessoas que são afetadas com isso são as pessoas que nem eu. As Desafortunadas. Não é algo legal, pois todas as pessoas olham para sua desgraça. Os casos mais fortes que são apresentados ocorrem quando é visto os crimes cometidos pela pessoa como estupro, roubo, assassinato. Esses casos podem ocorrer tanto com os Desafortunados quanto os Afortunados. Só que há uma diferença de conduta entre eles. Enquanto os Desafortunados literalmente terminam desaparecendo, os Afortunados são mantidos em liberdade sendo vigiados 24hrs por dia. O número de detentos, nas chamadas prisões, caiu consideravelmente. O número de crimes, nem tanto.